Em
fases como esta que vivo agora, em que as fragilidades estão todas à flor da
pele, tenho uma forte tendência para pensar em situações que ainda não
aconteceram, e trazê-las para esta espiral de inquietação.
Sou
um íman de dor. Uma masoquista de futurologia dolorosa.
Numa
fase digamos normal, não penso nelas, ou se penso rapidamente afasto esses
pensamentos de mim. Agora, faço exatamente o contrario.
Nestes
últimos dias penso imenso na perda.
Em
concreto na perda que é inevitável, naquela que sabemos que está no caminho.
Penso
na perda dos meus pais. Como vai ser? Como me vou sentir?
Agora,
só de pensar nisso, sinto uma náusea imensa. Um aperto no coração que não se
explica.
A
falta que me vão fazer.
Depois
penso que não quero que sofram. Que quando forem que sejam com dignidade, a
mesma com que viveram sempre, merecem isso.
Penso
também qual irá à frente. Como eles próprios vão lidar com a perda do outro.
É
horrível pensar nisto.
Falo
todos os dias com a minha mãe. Todos.
Damos
o bom dia. Falamos de como vai ser o dia, de tudo e de nada. Sei que ela está
ali e me ouve. E consigo até imaginar que quando lhe ligo, ela pára de fazer o
que está a fazer, senta-se confortavelmente no sofá, e está só ali, a falar
comigo.
Gosto
desse mimo em forma de atenção e de escuta ativa.
Gosto
quando nas primeiras frases da chamada, ela percebe o meu estado de espirito
como ninguém e pergunta o que tenho.
Gosto
de ouvir o “Tou filha” meigo e doce dela. E ouvir o pai, ao fundo a perguntar
“é a menina?”.
E
no dia que eu não puder fazer isto?
No
dia em que eu instintivamente vou pegar no telefone e marcar o numero dela e
ela não me puder atender? Ou não ouvir o meu pai em voz de apoio.
No
dia em que não tiver as mãos forte do meu pais a deter a minha cara entre elas
a dizer-me “vai correr tudo bem!”?
Tremo
no teclado do computador enquanto escrevo isto pela emoção fortemente
angustiante que isto me provoca.
Nestas
minhas negras fantasias, chego a pensar que indo um à frente, prefiro que vá um
ao invés do outro.
Parece
demasiado mórbido isto eu sei, mas penso neles, em qual conseguiria melhor
suportar a ausência do outro e chegando até a ter alguns rasgos de egoísmos,
penso em mim e em qual deles me faria mais falta e penso que esse deveria ficar
por cá mais tempo, para me preparar para o dia que também vá…
Amo
os dois. Amor assim em mim só existe pelo meu filho.
Redescobri
esta amor parental durante a psicoterapia, e depois de um processo que não foi
fácil, enamorei-me ainda mais por estes dois. Desculpei-os, desculpei-me e vivo
agora com eles em paz. Uma paz que não sabia que não tinha, mas que agora não
abdico e preservo.
Dou
por mim, quando tenho vontade de pegar no telefone a meio do dia para falar
com eles, de me contrariar, como se fizesse uma espécie de desmame, mas depois
não consigo.
Tento
afastar estes medos e pensamentos e espero que esse dia ainda esteja longe e eu
esteja mais forte do que estou agora para conseguir lidar com este vazio que
certamente irá ficar na minha vida.
Pelo
caminho, aproveito os momentos que temos, ligo sempre que quero e dou-lhes cada
vez mais longos abraços e uso me do sentido do olfato para guardar o cheiro “de
pais” nas minhas memorias.
Petra