Numa gravidez, espera-se que o período de gestação ocorra
tranquilamente ao longo de nove meses. Este é, de facto, um marcador carregado
de simbolismo: é um limite organizador que baliza este aguardar pela chegada de
um bebé idealizado, imaginado e criado por estes pais, que, embalados pelo
relógio gestacional, contam “os ponteiros” até ao nove para desvendarem um dos
momentos seguramente mais marcantes das suas vidas.
Contudo, este relógio é, para alguns, interrompido subitamente,
por uma vontade precoce de vir ao mundo. Aqui, o inesperado desarma
expectativas, carrega o medo do desconhecido e traz um novo limite, muitas
vezes assinalado pela questão da sobrevivência.
Numa semana em que assinala o Dia Mundial da Prematuridade,
importa consciencializar sobre o crescente número de partos prematuros,
alertando para o impacto que as suas consequências têm para o bebé e para a
família. Apesar do estudo e da enorme pesquisa sobre o tema, reconhece-se que
apenas 30% dos casos de nascimentos prematuros têm uma explicação médica.
Sabe-se, por exemplo, que estão em maior risco para trabalho de parto
prematuro as mulheres que já passaram por um parto desta natureza, que estão
grávidas de gémeos ou com história de problemas uterinos
Do ponto de vista emocional, sabe-se que esta vivência tem uma função
desorganizadora para pais e família, que se vêm confrontados com um falir de
expecativas, bem como com um risco que representa a antítese do nascimento – o
da perda do bebé que idealizaram e da fragilidade de um bebé que foi imaginado
saudável, capaz de gritar para dar as boas-vindas à vida, mas que, ao invés,
nasce pequenino, frágil, indefeso.
Com efeito, todo o processo após o parto prematuro é desencadeador de um
enorme sofrimento psiquíco para o casal parental, que se vêm confrontados com
uma realidade hospitalar que assusta, que não era a suposta. A esta,
associam-se todos os fantasmas vivenciados neste processo de incerteza e de
angústia, onde o relógio continuam a existir, mas num compasso mais lento e
pesaroso.
O cruzamento de disciplinas como a psicologia nos cuidados de saúde tem
permitido introduzir métodos e técnicas capazes de minimizar o impacto
emocional da prematuridade, promovendo, assim, a saúde do bebé e a relação
precoce na díade mãe-filho. É paradigmtico disso mesmo métodos como o “Cuidado
Mãe Canguru” ou “Contato Pele a Pele”, que tem sido proposto como uma
alternativa ao cuidado neonatal convencional para bebés de baixo peso ao
nascer. Foi implementado em 1979 e ganhou esta designação devido à maneira
pela qual as mães carregavam os filhos após o nascimento, de forma
semelhante aos marsupiais.
Neste método de assistência neonatal, preconiza-se o contacto pele-a-pele
precoce entre a mãe e o recém-nascido de baixo peso, de forma crescente e
pelo tempo que ambos entenderem ser prazeroso e suficiente, permitindo, assim,
uma maior participação dos pais no cuidado ao bebé. Sabe-se que é este amor
precoce que funciona enquanto motor de vida, pelo que, também aqui, é dele que
se parece inspirar intervenções como esta.
Espera-se, pois, que intervenções como o Método Canguru continuem a
inspirar e humanizar os serviços de saúde, relembrando e parafraseando António
Coimbra de Matos: “mais amor, (para) menos doença”.
O Canto da Psicologia,
Dr.ª Joana Alves Ferreira