Como
psicóloga só posso comentar e avaliar do ponto
de vista
psicológico e comportamental, de como o ser humano, tendencialmente, reage
perante quadros de emergência ou crise geral. Assistimos a tempos desafiantes,
um estado de emergência quase mundial, devido a um vírus Covid-19, pouco
estudado, embora existam cientistas a debruçarem-se sobre esta área de investigação,
sim o vírus, irá ser devidamente avaliado, controlado por vacina, é só uma
questão de tempo e tudo vai ficar resolvido.
Contudo ainda não estamos nesse ponto, não há vacina,
nem conhecimento cientifico esmiuçado sobre o comportamento do vírus, como tal,
o que sabemos cientificamente é que a velocidade de propagação da infeção do
vírus é exponencial, quantos mais contactos sociais, maior a inevitabilidade do
aumento de infetados, assim como que o contágio é muito facilitador. Por favor
não entrem em pânico, que não serve de nada e apenas aumenta o problema mas,
também, não desvalorizem e facilitem, nem 8 nem 80!
As duas reações mais comuns num quadro de crise são
em primeiro lugar, a negação, ou seja o sujeito não consegue conceber que está
em crise e tem um problema e então ignora-o, como mecanismo de defesa, o que pode
durar mais ou menos tempo. Exemplo da desvalorização: “a mim não me acontece”,
“tenho uma saúde de ferro, um sistema imunitário forte é só aos outros”, “que
exagero esta situação, não percebo”, “não vou mudar as minhas rotinas diárias”,
“não se passa nada de especial é só preciso algum cuidado”. A outra reação à
crise é, entrar em colapso, pânico e já não se sabe o que se está a fazer, uma
vez que o pensamento lógico fica toldado e incongruente, perante ansiedade em
excesso, nomeadamente; “isto vai contaminar todos e vamos morrer, “não podemos
sair nunca nem respirar nada”, “vamos fechar os centros comerciais e a
restauração às 21.00 (como se houvessem horários para o vírus) ”, “fazemos
quarentena a meio gás”.
Agora
imaginemos que uma das respostas ao stress é a junção destas duas,
desvalorização do problema (negação), mais desorganização (pânico), ficar com
excesso de ansiedade, ora é o acontece, quando entramos num choque de perigo do
desconhecido, podemos considerar que é o que se está a observar em algumas
pessoas.
Assim estamos a ser bombardeadas com notícias que nos
contam sobre o “impossível”, sobre o que consideramos que nunca podia acontecer
e agora temos o perigo “invisível” do vírus covid-19, pode ser um evento
traumatizante que deixa consequências quer na vítima direta, quer nos familiares
próximos com repercussões psíquicas.
O nome científico para denominar a perturbação que se
pode desenvolver após a crise é o Stress Pós Traumático, como o próprio
nome indica consiste, num trauma psíquico provocado por um evento externo que
não é previsível, nem controlado, dado fator de susto que provoca a experiência
intensa e que impede a capacidade de equilíbrio emocional, face ao medo,
desamparo da situação.
A Associação Americana de Psiquiatria define o conceito,
trauma como uma experiência individual direta de um evento que envolva morte,
ameaça de morte ou ferimento grave, ou outra ameaça à integridade física; ou
observar um acontecimento de morte, ferimento grave ou ameaça à integridade de
outra pessoa; ou ter conhecimento de uma morte violenta ou inesperada,
ferimento grave ou ameaça de morte experienciada por um familiar ou amigo
próximo. No caso atual, do Corona Vírus, o que temos é a experiencia psíquica da
possível ameaça de morte iminente, mais direcionada, ao próprio ou ao outro,
provavelmente familiares mais idosos. Pelo que também é uma experiência que
causa sofrimento psicológico.
O ser humano naturalmente procura uma homeostase, um
equilíbrio bio-emocional para poder funcionar no seu dia-a-dia. O impossível
acontece quando um evento imprevisível sucede e retira alguma confiança e
tranquilidade na vida e no seu natural curso. A capacidade do ser humano
resistir e conseguir regular as suas emoções, de modo a criar significado para
a experiência, vai depender da resiliência de cada sujeito, assim como, de
fatores relacionados com organização psíquica, personalidade e experiências de
vida. Como tal, esta regulação emocional e superação, tem um caracter
subjetivo, embora o apoio psicoterapêutico, seja fundamental para apoiar a
vítima em todo este processo, bem como, todo o apoio comunitário que favoreça o
sentido de pertença nas pessoas.
Perante a ocorrência
de um acontecimento traumático o sujeito reorganiza uma nova forma de estar e
de ver o mundo que o rodeia, o que pode gerar uma mudança significativa nos
seus padrões de funcionamento psíquico. Sendo que a forma mais saudável de reagir,
perante a crise será após o período de ansiedade que é normal; 1) aceitar que é
uma crise, mas que vai passar, com o tempo e ter uma postura otimista, que tudo
vai melhorar. 2) Ser proactivo e criar novas formas de lidar de forma flexível
com a situação, capacidade de adaptação à realidade presente e aceitar as
mudanças na rotina de vida.
Normalmente, sentimos
o mundo como um local seguro e relativamente controlável, considerando as mais
diversas ações e tarefas que desempenhamos durante o quotidiano, como
asseguradas por nós e, por isso, dentro do nosso controlo, pelo que decidimos o
que queremos e não queremos fazer, aquilo que pensamos e recordamos. No
entanto, na sequência de um acontecimento traumático, existe um reajuste na
nossa maneira de ver o mundo, que leva o seu tempo a resolver.
Assim sendo uma construção de personalidade rígida ou
inflexível, poderá dificultar este processo de reajustamento do sujeito, dado a
necessidade implícita de controlo, por outro lado uma personalidade mais
plástica e adaptativa terá, á partida, outros recursos, para que com o passar
do tempo, possa superar o evento traumatizante com maior tranquilidade.
Deste modo devemos estar calmos, mas atentos, confiantes,
mas assertivos, na proteção de todos, se seguirmos as recomendações, iremos
sair disto ainda mais fortes e unidos. O sacrifício maior será o isolamento,
dado que o ser humano é um ser sociável por natureza, por isso é altura de
abusarmos dos meios de comunicação virtual e procurarmos este tempo de calma,
para organizar a nossa casa interna psíquica e construirmos projetos e sonhos
futuros. Assim sendo todos temos uma parte ativa no combate a esta epidemia,
não tenhamos medo do nome, mas, também não vamos ignorar o que se passa, o
equilíbrio é a chave.