Extinto que está o incêndio de Pedrogão
Grande, e num momento em que a crise emergente deu lugar a uma espécie de
rescaldo, importa pensar: E agora? Não obstante todos os recursos que estão a
ser mobilizados para pôr em marcha programas de apoio aos inúmeros lesados por
esta catástrofe, estamos particularmente atentos à necessidade de dar suporte
emocional a todos os que, de algum modo, estiveram envolvidos ou foram tocados
pela mesma, considerando a dimensão traumática de um evento desta natureza.
Com efeito, no âmbito da saúde mental, sabemos que é imperativo atentar
às repercussões psíquicas que os acontecimentos geram. As vítimas de
calamidades não são apenas aquelas que estão presentes no momento ocorrido,
como também todas as que, de alguma forma, são afetadas ou que se sentem parte
da situação, pelo que pensamos que os números até à data apresentados encapotam
uma escala de maiores dimensões, se pensarmos nas famílias das vítimas mortais,
nas equipas envolvidas no terreno, nos profissionais de saúde que prestaram
cuidados, nas populações circundantes, entre tantos outros.
Assim, pensar situações como a ocorrida em Pedrogão remete-nos
para um olhar atento sobre o efeito do trauma psicológico nos indivíduos,
considerando que este é a consequência face a um choque emocional violento, que
pela sua dimensão e/ou intensidade, não pôde ser metabolizado pelo aparelho
psíquico. O sentimento de impotência associado a um acontecimento traumático,
onde o sujeito se vê implicado sem qualquer previsibilidade ou possibilidade de
proteção, desencadeia respostas emocionais diversas que, na maioria das
situações, se manifestarão posteriormente. A ideia comummente associada a estas
vivências de que “é preferível esquecer” (enquanto mecanismo possível para
aliviar a dor e o sofrimento), constitui, na verdade, o maior obstáculo ao
tratamento e à intervenção com as vítimas desta situação. Pelo contrário,
importa enfatizar que é
importante para aquele que experimentou uma situação traumática poder relatar
ao outro a sua história, endereçando o seu testemunho à escuta de alguém que
possa vir a promover a abertura de uma possibilidade de representação da
situação traumática.
Se nos
apercebemos, enquanto espectadores, que os meios de comunicação social têm
enfatizado a necessidade de encontrar bodes expiatórios, numa tentativa
desenfreada de atribuir responsabilidades para o sucedido, enquanto técnicos de
saúde mental, desviamos o olhar para uma outra leitura do problema: para além
das políticas públicas e da responsabilização do poder público, parece-nos da
maior pertinência reforçar a necessidade de novas ações interdisciplinares, que
incluam a intervenção de equipas de saúde mental, junto deste número de tamanha
dimensão.
O Canto da
Psicologia