sexta-feira, 15 de outubro de 2021

Crianças violentas...

 


 

A morte de um jovem de 23 anos à porta de uma discoteca no Porto provocada por outro jovem de 21 anos fez-me pensar neste titulo, escolhido há 2 anos atrás para a 5ª Jornada de estudos do Instituto Psicanalítico da Criança em Paris.

 A agressividade na criança e no jovem pode ser uma chamada de atenção ou uma tentativa de afirmar a sua singularidade, a sua vontade, face às regras e limites impostos pelos adultos (pais, professores, etc). Neste caso estaríamos no registo do simbólico e falaríamos de acting-out, um ato inconsciente que se realiza para um Outro, para poder passar uma mensagem que não se consegue exprimir de outra forma, através da palavra.

 As passagens ao ato, pelo contrário, como parece ser aquela que vitimou Paulo Correia no Porto, escapam ao simbólico, à palavra. Esta noção designa atos violentos, auto ou hetero agressivos e frequentemente impulsivos. A tentativa de encontrar uma causalidade para estes fenómenos de violência é muitas vezes infrutífera pois trata-se de uma irrupção isolada de qualquer tipo de discurso ou diálogo possível. Falamos da violência gratuita que tem como satisfação o simples ato de destruir, de sair de cena, sem causa nem mensagem dirigida a alguém.

 A questão que eu gostaria de abordar, orientada por um texto de Jacques-Alain Miller escrito para a referida jornada de estudos, é como podemos integrar esta violência num discurso simbólico.

 Miller fala de uma posição terapêutica afetuosa e de contra-violência simbólica, em que se tentaria ajudar a criança/jovem a encontrar palavras para expressar a sua agressividade, a (re)construir uma defesa contra eventuais episódios de irrupção da violência, e a reparar um eventual defeito na sua capacidade simbólica.

 Não se trata de impôr um determinado significado ou de corrigir comportamentos através de uma técnica igual para todos, mas de ouvir o que a criança/jovem tem a dizer sobre a sua violência e agressividade, sobre o que a desencadeia, sobre o sofrimento que lhe provoca. Quando esta violência encontra um lugar para ser abordada, pode revelar-se uma força frutífera para a criança.

 J-A Miller alerta-nos para o perigo de ficarmos colados a uma visão determinista da criança/jovem que muitas vezes é veiculada no ambiente familiar, escolar e social desde muito cedo - “agressivo”, “violento”, “destruidor”. Defende igualmente que nem toda a violência é errática e que é necessário respeitar e dar lugar a uma revolta que pode ser saudável, em alguns casos.

 

 

Drª Rafaela Lima

O Canto da Psicologia - Braga


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