As
férias de Verão continuam a ser sinónimo de abandono de animais domésticos.
Nesta altura do ano, as associações de proteção de animais ficam em estado de
alerta para esta realidade que, apesar das diversas campanhas de sensibilização
e de alterações legislativas, teima em continuar. O que fará com que tantas
pessoas, ano após ano, optem por ter um animal de estimação e, de um dia para o
outro, essa situação reverta, deixe de ser importante a sua amizade e companhia
e o abandono seja a solução encontrada? Infelizmente, é uma situação muito
triste que a nós, Canto da Psicologia, nos toca e nos sensibiliza, dado o
carinho que também demonstramos pelos nossos amigos de 4 patas.
Mas
podemos até ir mais além, lembrando-nos que não são só estes amigos os
infligidos por situações de abandono sazonais. Os nossos idosos são também
vistos, provavelmente por meros segundos que depois pesam na caixinha do
arrependimento, como um estorvo face à partida para momentos de descanso,
diversão e mudança de vida, nesta altura tão expetável que é a das férias. Importa perceber que não estamos cá para condenar quem
opta por tomar determinadas decisões, mas tentar ajudar, tentar prevenir e,
quem sabe, fazer a nossa parte para reverter estes ciclos, ano após ano.
O
que é, afinal, o abandono? Será ele meramente sazonal e infligindo aqueles que
vemos como mais frágeis e indefesos? Ou será ele uma instância tão mais
interna, tão mais profunda, uma reação presa no medo, uma ação assente noutros
abandonos, mais um menos penosos, mais ou menos conscientes, que todos nós já
vivenciámos? Quantas vezes, ainda na presença de alguém, temos a
nítida sensação que podemos vir a ser abandonados a qualquer momento? Quantos
momentos deixámos de aproveitar na sua plenitude, pela angústia antecipatória
de saber que os mesmos iriam acabar? Quantas vezes vivemos apavorados com o
receio da perda dos que amamos, ou de qualquer outra situação que nos traz
felicidade e estabilidade?
Somos, sem dúvida, o reflexo de como fomos construindo
o nosso mundo interno, de como fomos sendo valorizados, de como fomos sendo
ensinados a cativar e ser cativados, de como fomos construindo um objeto
interno suficientemente seguro, coeso e capaz de nos acompanhar ao longo do
tempo, capaz de nos fazer não ter medo de perder e não repetir, ciclo após
ciclo, essa mesma perda que não esquecemos desde a infância.
Mas nunca é tarde, para se aprender e perceber que o
mundo não é, afinal, um lugar tão inseguro e ameaçador, em que não se pode confiar
em ninguém e, acima de tudo, construir a confiança em nós próprios, inspirando
todo um desenrolar de relações naturalmente mais sólidas, mais tranquilas e
mais duradoras. A sensação de ter valor é essencial à saúde mental, é essencial
à construção de relações duradouras, que não quebram no primeiro “Agosto”, que
são capazes de pensar em soluções alternativas para contornar os obstáculos e
que permanecem coesas.
Quando nos tornamos mais conscientes do que fomos
guardando naquela gaveta tão funda do inconsciente, podemos começar a agir
sobre tudo aquilo que vivenciámos, aprendendo a respeitar os nossos sentimentos
mais profundos, assumindo a responsabilidade sobre as nossas mudanças e
contruindo uma história tão diferente.
E porque o abandono é, certamente, a
maior força motriz geradora de um novo abandono, nós estaremos cá para si, para
o ensinar, acima de tudo, a não se abandonar a si próprio, a investir num novo eu,
sem desistir de si, porque é sempre possível construir um novo começo, em vez
de continuar, tão só, a temer um novo fim.
E antes de ir de vérias, assista a este vídeo....
Drª Cláudia Ribeiro
O Canto da Psicologia
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