“É
em silêncio que melhor se ouve o que vem de fora e o que nos vai por dentro; é
de silêncio a reflexão sobre o que já se aprendeu; é o silêncio que se interpõe
entre as palavras que lhe empresta o valor mais significativo do discurso.”
(João
dos Santos)
A
escuta terapêutica, pode dizer-se, vai para além da escuta das palavras.
Quando alguém faz “um pedido de ajuda” transmite normalmente com as suas
palavras a urgência de uma compreensão. Não raras as vezes após uma
primeira consulta, o paciente se questiona sobre a necessidade dessa mesma
compreensão, quase como se um possível alívio sentido num primeiro encontro
(terapêutico) o fizesse questionar sobre a veracidade dessa mesma compreensão –
será que vou ser verdadeiramente compreendido? como poderá esta pessoa
ajudar-me se já lhe disse tudo o que me preocupa?
Voltando
ao pedido de ajuda e ao seu significado, será interessante pensar-se sobre o
que é dito com as palavras, mas também com o tom, com a sua musicalidade. Um
pouco como acontece na díade mãe-bebé, onde a voz da mãe coloca legendas no
sentir do bebé, também na relação terapêutica se vai dançando ao som da música.
Nesse sentido o lugar do psicoterapeuta é (também) o lugar da escuta e
da espera. O silêncio, por vezes ensurdecedor, pode dar lugar e voz à escuta do
espaço interno do paciente, permitindo a livre expressão do eu. A
relação terapêutica, à medida que se torna um espaço seguro e de confiança,
funciona como um terreno fértil, dando condições ao desenvolvimento e
crescimento mental.
Quando alguém nos narra uma história
ou fala sobre um acontecimento, geralmente vai articulando o seu discurso com o
som, as pausas, a linguagem que melhor descrevem (fazem compreender) o que se
quer transmitir. É esta interpretação que ajuda a dar significado ao vivido.
Curiosamente, é um pouco aí que reside o entendimento face à questão “será
que vou ser verdadeiramente compreendido?”. Digamos que enquanto a voz do
paciente não é suficientemente audível para expressar aquilo que apenas é potencialmente
expressável, que o psicoterapeuta lhe empresta, com o seu silêncio, a sua voz
(João Pedro Dias). São as qualidades do psicoterapeuta - calma, serenidade,
vitalidade, constância, genuinidade, segurança, indestrutibilidade - (João
Pedro Dias) que refletidas no silêncio permitem ouvir a voz do paciente e dar
espaço à verdadeira compreensão, por parte do outro e interna. A escuta no
silêncio funciona metaforicamente como um “empréstimo” de voz, como se ao ficar
em silêncio, o psicoterapeuta pudesse (com as suas qualidades) complementar a
voz do paciente, dando-lhe significado. Sabemos que a palavra e a interpretação
são elementos essenciais na psicoterapia, mas também a qualidade do silêncio,
na medida em que possibilite o encontro da díade paciente – terapeuta. E é
neste sentido que a relação terapêutica é diferente das outras relação,
eliminando ruídos e facilitando o acesso ao simbólico da palavra, mas também do
silêncio.
Drª Ana Cordeiro - Braga
O Canto da Psicologia
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