quinta-feira, 19 de julho de 2018

GERAÇÃO BEAT: O ligado é o novo desligado?







Entre a criança que já não existe e o adulto que ainda está por vir, o adolescente atravessa um período de profunda transformação, que é marcado por um estado de insegurança e de vulnerabilidade psíquica.
Sabemos que as características psíquicas deste processo não são dissociáveis do contexto sociocultural no qual o indivíduo se desenvolve, pelo que pensar a adolescência implicará sempre um olhar sobre a contemporaneidade, onde impera uma cultura do imediato (uma espécie de “reinado da urgência”), num crescente esvaziamento de ideais compartilhados, que pauta uma sociedade onde vive tempos de hiperespetáculo, no qual o fazer não é importante, mas antes o ser visto a fazer. De facto, há uma demanda para ser-se aceite, que se espelha a vários níveis: no uso frenético das redes sociais, nos hábitos de consumo e - remetendo para um tema de profunda atualidade -, também neste crescendo de procura de “espetáculos”, onde talvez se possam inscrever os inúmeros festivais de verão, de que ouvimos falar um pouco por toda a parte.

            Não poderá ser a metáfora do ritmo acelerado da música, o(s) (i)número(s) de palcos (dos quais se corre de um lado para o outro, porque nunca será possível assistir a tudo o que o festival oferece) ... Um retrato deste sistema de urgência? A este respeito, levantava uma jornalista, numa publicação recente, a seguinte dúvida: “Usamos os smartphones para encontrar os amigos, tirar fotografias, filmar concertos e ‘taggar’ os locais que visitamos. Ainda será possível estar num grande festival de música como nos tempos em que não trazíamos o mundo no bolso?”.

Esta dúvida que, de resto, nos parece colocar a questão no lugar certo – não são os festivais em si, mas o que se tem feito deles –, que também nos leva a pensar no que é a vincularidade hoje, na medida em que o excesso de ligação representa, no fundo, um profundo vazio e desamparo, que talvez se concretize, num número decrescente de adolescentes, em passagens ao ato com consumos excessivos,comportamentos de risco, auto-lesivos.
 Afinal, ligado hoje, não será antes, desligado?


Drª Joana Alves Ferreira





Sem comentários:

Enviar um comentário