A propósito das reações que temos quando algo no
outro, nos aflige ou nos perturba, é difícil compreender, mas por vezes, quando
de forma sistemática e intensa emocionalmente, algo nos irrita, na outra pessoa,
isso pode sinalizar que temos algo, em nós, que necessita de ser resolvido.
Normalmente a zanga, a irritação, a frustração fazem parte das nossas experiências e vivências emocionais quotidianas, é impossível e
até seria doentio estar sempre bem, com boas emoções, não é disso que se trata,
neste caso, a questão é quando alguém suscita em nós grande zanga e irritação
de uma forma sistemática e frequente. Isto é uma repetição de queixas que podem
estar a mascarar o que sentimos sobre nós próprios, que pode ser verdade. Todas
as nossas emoções são fundamentais para o nosso equilíbrio homeostático,
precisamos de nos zangar, de chorar, de rir, para que possamos sentir paz.
Contudo a forma como vemos o mundo e a realidade está
intrinsecamente relacionada, com a maneira como nos vemos, a nós próprios e nos
relacionamos connosco, uma vez que se não me sentir bem comigo, se passar a
vida com uma auto-conversa depreciativa e crítica sobre a minha pessoa, então
apenas poderei dar isso aos outros, mais crítica, julgamento e insatisfação.
Na parentalidade isto manifesta-se ainda mais, se
escolho exercer uma parentalidade baseada na crítica, no julgamento e na exigência, então o mais certo é ter crianças com baixa auto estima e elas,
também, vão ser adultos críticos e severos consigo e com os outros. A maior
parte dos problemas de educação das crianças prendem-se com falta de estímulo,
atenção e elogio direcionado à criança que ainda esta a construir a sua auto
estima e a sua segurança interna. Pais insatisfeitos e pouco conscientes acabam por, automaticamente, projetar as suas próprias inseguranças nos seus filhos. Por
vezes temos receio de assumir características que rejeitamos ou consideramos
erradas e inaceitáveis nos outros, tal é o receio de podermos identificar, em
nos próprios, esses mesmos traços. Quanto maior a rigidez identitária maior
será a falta de tolerância para aceitar o que é diferente, não certo, nem
errado, apenas diferente.
A forma como os pais pensam sobre os filhos e como os
tratam, vai influenciar todos os relacionamentos futuros, assim como, a saúde
psicológica de cada um.
Ao longo do desenvolvimento da criança organiza-se
um processo mental sobre o que esperar dos comportamentos dos mais familiares,
normalmente mãe, pai, denomina-se de vinculação, sentido de pertença e de
segurança. As figuras centrais que estão maioritariamente com a criança,
principalmente nos primeiros três anos de vida, vão criar dinâmicas relacionais
que irão moldar o sentido de identidade, segurança e de amor-próprio na
criança, bem como no futuro adulto. Sentimentos como sou especial, amável,
tenho importância na vida dos meus familiares, a minha voz conta, sou
compreendido, quando estou aflito tenho onde possa obter conforto emocional. Se
algo corre mal sei que tenho palavras e ações que revelam apoio esperança e não
critica, julgamento e severidade. Estas são as melhores heranças que os pais
nos podem dar, a segurança do conforto emocional, do amor incondicional, que
não quer nada em troca a não ser a felicidade dos seus filhos. Contudo por
vezes há incapacidade de desenvolver este amor incondicional devido a falhas
que foram criadas no desenvolvimento e que impossibilitam esta disponibilidade.
Assim sendo as expetativas que os pais criam, mesmo
antes do nascimento do bebe, vão criar um ninho psicológico onde o mesmo se irá
adaptar. A criança procura sempre se adequar às expetativas dos pais, quer
sejam, positivas, negativas, conscientes, inconscientes. Por exemplo, se os
pais assumirem a crença de que as crianças são difíceis e que o filho\a é
difícil e tem mau feitio, o mais certo é essa criança desenvolver essas mesmas
características. Quanto mais vincado, consistente e frequente for o
sentimento\crença mais a criança irá assumir comportamentos semelhantes que se
coadunam com o que esperam dela, isto porque, os pais são como um espelho onde
o bebe\criança se pode ver refletido e, assim, construir a sua própria
identidade. O que as figuras de vinculação sentem que são (essencialmente boas
pessoas, imperfeitos, mas conscientes, resilientes e positivos) é o que vão
transmitir tendo consciência ou não aos seus filhos, sem pensar muito no
assunto. Assim sendo quando as figuras de vinculação estão bem nutridas, com
uma boa auto-estima, tem auto conhecimento, consciência das suas
vulnerabilidades e trabalham no sentido de promoverem a melhor parentalidade que
é possível, normalmente irão desenvolver crianças mais inteligentes emocionais
e mais flexíveis, no que concerne a adaptabilidade emocional e a regulação da
frustração. Não se trata de perfeição, pais perfeitos, trata-se de capacidade
de análise e procura de dar o nosso melhor nas relações, mesmo sabendo que vão
existir falhas e momentos menos bons. Neste sentido quanto mais forem capazes
de lidar com as suas próprias frustrações, conseguirem ser resilientes e
otimistas, mais os filhos vão se desenvolver tendo por base estas formas de
funcionamento psicológico.
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