Estamos a meio de 2020! E
este já é seguramente o ano em que mais fomos alertados para a importância da saúde
mental, seja através das notícias na televisão, artigos em jornais ou
informações nas redes sociais.
"Os Efeitos do Coronavírus na Saúde Mental são um desastre em Slow
Motion."
Provavelmente, o contexto subjacente à pandemia e o confinamento nos tenham
feito parar e reflectir. No entanto, a preocupação com a saúde mental tem
acrescido nos últimos anos em todos os profissionais que diariamente trabalham
neste contexto. As notícias não são animadoras e todos os dias nos confrontamos
com números e histórias surpreendentes.
Talvez por isso, seja tão difícil definir e identificar o que é saúde
mental.
Sabemos hoje que não pode ser considerada apenas na ausência de perturbações
psicológicas e que envolve outros critérios e capacidades. Sabemos também que
está intimamente ligada à saúde física e que as duas não se podem dissociar.
Por outro lado, a saúde das nossas relações também tem uma palavra importante a
dizer quando nos referimos a um bem-estar geral e completo.
"Entre Janeiro e Março, venderam-se mais de 400 mil embalagens de
ansiolíticos e antidepressivos."
Ainda que nunca se tenha falado tanto sobre saúde mental, como nos dias de
hoje, a verdade é que o sofrimento humano existe desde sempre. Ao longo da
história da humanidade, o homem foi-se confrontando com problemas que
condicionavam o seu bem-estar psicológico. A perda, o luto, as dificuldades nas
interacções familiares, os conflitos relacionais e os episódios traumáticos
fazem parte da origem da maioria das patologias mentais mais frequentes, como a
ansiedade e a depressão.
Com o passar dos anos e com maior acesso ao conhecimento, a forma encontrada
para lidar com as problemáticas psicológicas foi, ironicamente, dando um lugar
mais significativo à sua ocultação e encobrimento. Os sintomas vão-se
camuflando e mascarando, com recurso cada vez maior à medicação, ao álcool, ao
trabalho em excesso ou a outros equivalentes com a função de evitar o confronto
e assim anestesiar o mal-estar sentido frequentemente, indo em sentido
contrário do tratamento da raiz dos problemas. O sofrimento permanece e
torna-se ainda mais ensurdecedor!
"Portugal é o segundo país com a mais elevada prevalência de doenças
psiquiátricas da Europa."
Ultimamente, temos lido e falado muito mais sobre psicoterapia e a sua validade
tem sido solidificada no tratamento de todas as patologias do foro psicológico
e psiquiátrico.
Para os psicoterapeutas nem sempre é fácil descrever e explicar de forma
simples todos os factores envolvidos no sucesso e eficácia da psicoterapia. Até
porque, é um processo prolongado e progressivo.
Há uma analogia curiosa que às vezes me ocorre quando penso na intervenção
psicoterapêutica e que me conduz à era digital e tecnológica que vivemos hoje.
No mundo da informática, um dos conceitos base é ditado pelo Código-Fonte. Esta
concepção determina o conjunto de palavras ou símbolos escritos com lógica e
ordenação, que pretendem dar instruções em vários tipos de linguagem de
programação. Existem vários tipos de linguagem, com diferentes padronizações e
estas podem ser compiladas e originar um ou vários softwares específicos.
Que complexidade!
Quando utilizamos incessantemente tecnologias digitais, seja em casa, no
trabalho ou nas compras online, não imaginamos a multiplicidade de
factores envolvidos na criação daquele sistema.
Também assim é a compreensão do funcionamento psicológico de cada um e a
respetiva intervenção psicoterapêutica. Decifrar, compreender e conhecer o “código-fonte
interno” é um dos pilares do processo. Por vezes é o ponto de partida e logo aí,
começam a surgir os primeiros resultados positivos.
Na terapia, os problemas psicológicos são entendidos como consequência de
experiências ocorridas que moldam a forma como nos relacionamos com os outros e
connosco próprios. Aqui, com um olhar
muito atento e um novo modelo de compreensão individual, a intervenção psicoterapêutica conduz à saúde mental e ao bem-estar. Depois, pode dizer-se
que se parte para a criação de uma nova linguagem de programação interna (que
se descodificou e voltou a codificar), que resulta numa diferente capacidade de
integração psíquica, maior adaptação ao próprio mundo interno e aos outros.
Assim, vão-se constituindo alicerces fundamentais para a autonomia emocional
que vai substituindo o sofrimento enraizado, dando lugar a novos e saudáveis
recursos psicológicos.
Ter saúde mental e experienciar um bem-estar geral é conseguir olhar, escutar e
lidar com as tensões normais da vida sem medo, é dormir e comer naturalmente
sem privação ou excesso, é sentir-se bem fisicamente e sem cansaço persistente,
é poder trabalhar de forma produtiva, é ter capacidade para pensar colectiva e
individualmente, é realizar actividades com entusiasmo e para as quais temos
habilidade, é sentir e aproveitar a vida, interagindo saudavelmente com os
outros e com o mundo.
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