Entre a criança que já não
existe e o adulto que ainda está por vir, o adolescente atravessa um período
de profunda transformação, que é marcado por um estado de insegurança e de
vulnerabilidade psíquica.
Sabemos que as características
psíquicas deste processo não são dissociáveis do contexto sociocultural no
qual o indivíduo se desenvolve, pelo que pensar a adolescência implicará sempre
um olhar sobre a contemporaneidade, onde impera uma cultura do imediato (uma
espécie de “reinado da urgência”), num crescente esvaziamento de ideais
compartilhados, que pauta uma sociedade onde vive tempos de hiperespetáculo, no qual o fazer não
é importante, mas antes o ser visto a fazer. De facto, há uma demanda
para ser-se aceite, que se espelha a vários níveis: no uso frenético das redes
sociais, nos hábitos de consumo e - remetendo para um tema de profunda
atualidade -, também neste crescendo de procura de “espetáculos”, onde talvez
se possam inscrever os inúmeros festivais de verão, de que ouvimos falar um
pouco por toda a parte.
Não poderá ser a
metáfora do ritmo acelerado da música, o(s) (i)número(s) de palcos (dos quais
se corre de um lado para o outro, porque nunca será possível assistir a tudo o
que o festival oferece) ... Um retrato deste sistema de urgência? A este
respeito, levantava uma jornalista, numa publicação recente, a seguinte dúvida:
“Usamos os smartphones para encontrar os amigos, tirar
fotografias, filmar concertos e ‘taggar’ os locais que visitamos. Ainda será
possível estar num grande festival de música como nos tempos em que não
trazíamos o mundo no bolso?”.
Esta dúvida que, de
resto, nos parece colocar a questão no lugar certo – não são os festivais em
si, mas o que se tem feito deles –, que também nos leva a pensar no que é a
vincularidade hoje, na medida em que o excesso de ligação representa, no fundo,
um profundo vazio e desamparo, que talvez se concretize, num número decrescente de adolescentes, em passagens ao ato com consumos excessivos,comportamentos de risco, auto-lesivos.
Afinal, ligado hoje, não será antes,
desligado?
Drª Joana Alves Ferreira