terça-feira, 31 de dezembro de 2019

Até sempre 2019...







E pronto, mais um ano que termina e outro que se inicia! Bem vindo 2020!

Num espaço melódico de nostalgia perante um ciclo que acaba e outro que começa parece que, para  todos, há uma obrigação imprescindível  de  fazer  o balanço de mais um ano que termina: 2019, neste caso....

Tenho sempre alguma dificuldade em despedir-me do ano que acaba e abrir os braços ao ano que vem; dizem os entendidos que é a certeza e a segurança do que já foi,  impedindo o caminho da incerteza e a insegurança do que por aí vem. Talvez o seja. Talvez seja esse o meu caso. Porque, mesmo que o ano que termina possa não ter sido necessariamente bom, agarro-me às memórias e, nostálgica, lacrimejo pelo que de bom fiz, pelo que de menos bom fiz acontecer e até pelo que de mau aconteceu. Já passou e sobrevivi! Afinal, a importância de tudo enquanto decorreu, dissipou-se através do tempo que se foi fazendo tempo de vida …. agora, o que virá, pois, não sei, não sabemos, quem saberá? O tempo o dirá…

E é aí que os rituais tomam conta de uma noite, de um momento…

Se todos cumprirmos com os rituais afectos a esta última noite do ano, o ano novo vai correr bem ou, não estivéssemos por aqui e assim, a controlar (ilusoriamente, naturalmente!!) o futuro feito 2020. Contentores e libertadores de um medo feito escuro que entardece um modo feliz de se estar na vida estes, rituais : vestem-se de cores com significados vários seja para a saúde (azul), amor (vermelho), dinheiro (amarelo), felicidade (branco) e afins; de uma nota, de preferência a mais alta junta à pele, por dentro de uma meia, ou cueca ou soutien para que o dinheiro nunca falte nos próximos 365 dias; deitam-se fora, no último dia do ano, coisas estragadas, velhas e partidas porque importa entrar-se no novo ano com o ano velho, simbolicamente, deitado ao lixo , invisível , afogado num espaço inexistente, sem vida  para que o novo apareça livre de ameaças pendentes , esquecidas ou apagadas do anterior. Como se fosse possível, apagar um ano das nossas vidas ou, apagar o mal de todo esse ano como se este, o mal, não tornasse o que aconteceu de  bom, verdadeiramente bom...

Mas, enfim, a partir das  12 badaladas que antecedem a entrada do ano novo, fica a esperança e o desejo que o próximo  ano  vá finalmente fazer a diferença. Entre passas e copos de champanhe, todos acreditamos que sim.

Seja! Pela estabilidade da linha que nos agarra à vida, que assim seja...

É mais um ano que vamos tentar ganhar ao tempo que passa, convencidos de que o tempo passa para o resto do mundo  e não para nós e que, finalmente, vamos aproveitar  o tempo que o tempo nos dá até ao próximo final de tempo de mais um ano.

E afinal de contas:

Não importa ao tempo o minuto que passa, mas o minuto que vem.

                                                                                               Machado de Assis

A Equipa d’ O Canto da Psicologia deseja-lhe um tempo, para o ano de 2020, verdadeiramente feliz e em paz com a sua saúde mental…


Drª Ana de Ornelas
O Canto da Psicologia



quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Além de presentes… o que se dá e recebe em cada relação?







Estando em período pré-natalício, o fenómeno das compras, designadamente para o efeito de presentes, encontra-se em alta na  sociedade em geral.
Importa, assim, estarmos conscientes, o melhor que pudermos, dos significados que atribuímos aos presentes, enquanto ofertas de um “Eu” face a um “Tu”. Servirão para quê essas dádivas no âmbito das relações de que fazem parte? O que comunicam? Que efeitos produzem em cada pessoa e nos subjacentes projectos relacionais?

Por conseguinte, os presentes poderão ser “coisas” meramente funcionais que são dadas e recebidas numa relação, com pouca compreensão do que significam e dos seus efeitos no desenvolvimento relacional, ou poderão ser integradas em experiências interpessoais com um amplo significado e ligação emocional, se forem compreendidas, sentidas e comunicadas para além da mera função concreta que, enquanto “coisas”, expressam. Já não serão, assim, apenas roupa, telemóveis, livros, televisores, consolas de videojogos…; serão, sobretudo, manifestações compreensivas de uma relação que sobressai. Nesta medida, essas "coisas", não deixando de serem o que são, nas suas funções originais, são expandidas pela intersubjectividade da relação onde são experimentadas. No fundo, tais "coisas" passam a ser veiculadas através da dinâmica viva das emoções comunicadas e dos significados que passam a representar nessas relações. Por exemplo, mediante a oferta de um relógio, para quem o deu e o recebeu, poderá ser compreendida claramente a seguinte mensagem: "o pai não se esquece do filho, mesmo no tempo em que não está com ele", sendo que tal processo compreensivo será mais ou menos investido e, por isso, de alguma maneira desenvolvido/modificado conscientemente ao longo do tempo, consoante o grau de atenção, abertura e comunicação que for sendo empregue no decurso da relação pai-filho.

Deste modo, os presentes tornam óbvia e manifesta a ideia de um dar e receber nas relações humanas, embora, numa perspectiva mais abrangente, estando em relação, a dinâmica interactiva do dar e receber é continuada - mesmo que seja pouco reflectida ou consciente - para além da oferta concreta de qualquer tipo de utensílio, objecto ou equipamento. Assim, de uma forma global, o que se está a dar e a receber em cada relação e em cada momento? Que pensamentos, emoções e acções estão a ser investidos por cada pessoa na relação e quais os seus efeitos? Quais as necessidades fundamentais e as acessórias de cada pessoa nessas relações e em que medida estão a ser satisfeitas? Tais necessidades, e a sua maior ou menor (in)satisfação nas dinâmicas relacionais, são comunicadas de uma forma suficientemente eloquente ou ficam pouco compreendidas? As pessoas estarão, no fundo, mais às “claras” ou mais às “escuras” nas relações que vão vivendo, através do que compreendem, em maior ou menor grau, dos seus continuados dares e receberes? Estas e tantas outras perguntas poderão fazer parte de um processo de questionamento, mais ou menos sistemático, o qual contribuirá, certamente, para uma maior clarificação do que está a ser vivido nas relações humanas e, nessa medida, ficará melhor compreendido aquilo em que será relevante persistir ou alterar nessas dinâmicas interpessoais.

Ao nível da psicoterapia, saliente-se para o propósito de compreensão do tema deste texto, a abordagem psicodinâmica existencial do psicoterapeuta Irvin Yalom - nomeadamente da sua obra “Os desafios da terapia”, de 2006 - através da qual se destaca que um adequado desenvolvimento de uma relação psicoterapêutica implica que a comunicação sobre essa relação seja o mais aberta e transparente possível. Neste sentido, Yalom atribui muita relevância à elucidação de como o psicoterapeuta e o paciente se experimentamrelacionalmente em cada sessão: mais distantes/próximos, mais tensos/tranquilos, mais alegres/tristes… É, nesta medida, que a relação psicoterapêutica é ou deverá ser transformadora: enquanto experiência em que o psicoterapeuta e o paciente almejam uma significativa compreensão mútua de como é estar em relação, mediante o aqui-e-agora de cada encontro psicoterapêutico. Se assim for, assente na qualidade compreensiva da relação psicoterapêutica, o paciente desenvolverá, progressivamente, uma maior consciência do que dá e do que recebe em todas as suas relações; essa clareza contribuirá, certamente, para a expressão de um modo de estar nas relações mais atento, compreensivo e assertivo, em que as necessidades do paciente e das pessoas com quem interage serão melhor percebidas e, eventualmente, integradas em projectos relacionais em desenvolvimento.





terça-feira, 10 de dezembro de 2019

Hipertensão Arterial...





A hipertensão arterial é neste momento, uma das principais causas de morte entre adultos. Muitas vezes silenciosa, o aumento de 10 mmHg na pressão arterial faz com que a possibilidade de ter um AVC ou um enfarte possa aumentar até 50%.

A hipertensão arterial é multifactorial, mas factores externos, tais como: excesso de peso, tabagismo, alimentação, sedentarismo, podem ser factores controlados. Assim sendo, a evidência científica vem dizer que, por exemplo, uma pessoa que seja fisicamente activa, pode reduzir os valores de PA entre 20 a 30%. Além disto, a evidência confirma que com exercício regular a PA de repouso tem reduções significativas, baixando o risco de doenças cardiovasculares para cerca de metade e diminuindo a mortalidade para cerca de um terço.

Neste sentido, a importância do exercício como factor de longevidade é cada vez mais um dado adquirido. Mexa-se pela sua saúde e pela sua longevidade.


Bons treinos



Hugo Silva


Instagram: hugo_silva_coach
-Licenciatura Educação Física/Especialização Treino Personalizado
-Pós-Graduação em Marketing do Fitness 
-Pós-Graduando em Strength and Conditioning
-Director Técnico ginásio Lisboa Racket Centre


quinta-feira, 28 de novembro de 2019

Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres...





A violência contra a mulher é a mais frequente forma de violência de género. Este fenómeno é hoje mundialmente reconhecido pelos organismos de Saúde e de Direitos Humanos como um problema social grave. Nos países ocidentais, sob forte influência da mobilização feminista, a violência contra as mulheres tornou-se, nas últimas décadas, alvo da preocupação dos mais diversos fatores sociais. 

É crescente a preocupação com este fenómeno, mas, assustadoramente, parece ser directamente proporcional o número de casos que os meios de comunicação denunciam a este respeito diariamente. Será o reflexo de um fenómeno que continua a crescer ou a expressão de uma maior capacidade de intervir e/ou denunciar estes casos? Efectivamente, os números impressionam pela amplitude a que a violência tem chegado, inclusivamente no ambiente familiar, sendo muitos os casos em que é o parceiro a promove.
Frequentemente, este desastre social parece assentar no paradigma “mau com ele, pior sem ele”. Trata-se, portanto, de um fenómeno complexo, para o qual converge a história de vida, quer da vítima, quer do agressor, na forma como se constituem casal. 

Em muitos casos, percebemos a presença do desamparo e da violência na história de um ou mesmo de ambos, produzindo marcas na sua constituição psíquica que influenciam o vínculo na relação amorosa. Nesse sentido, situações traumáticas, como maus-tratos durante a infância e/ou abusos de diversos tipos (emocional, físico e sexual), têm sido considerados fatores presentes na história de vida de homens que perpetuam violência contra as suas parceiras íntimas, tratando-se por vezes de situações traumáticas na elaboradas que produzem uma compulsão à repetição. Podemos pensar, a partir de aqui, que se trata de uma espécie de “aprisionamento psíquico”, que exige uma elaboração interna dos lugares da história de cada um e, consequentemente, da forma como estes produzem uma repetição no aqui e agora. 

Nesse sentido, numa semana em que se assinala o Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres, não podemos deixar de assinalar a importância desta data e do papel que as demais instituições e organismos sociais e políticos têm tido na construção de um lugar para pensar e intervir sobre este “teatro de guerra” familiar - cujas consequências são, tantas vezes, alargadas a outros protagonistas, também eles vítimas desta violência - mas assinalando e reforçando, paralelamente, a necessidade de que este trabalho externo possa ser acompanhado de um trabalho interno, que permita não apenas “estancar” o sofrimento, mas, sobretudo, elaborá-lo, como forma de que este não se repita. 






quinta-feira, 21 de novembro de 2019

"Casa de pais, escola de filhos...."







“Se calhar há coisas que passam um bocadinho dos meus limites”
M,16a

Numa oscilação entre o adulto que está por existir e a criança que já não existe, o retrato do adolescente parece poder recair no vazio. No caminho das transformações, a falta da paixão e ingenuidade da infância, abre espaço para o espelhar das inseguranças do que é ser-se adulto. Numa sociedade global e contemporânea em que cada vez mais se instalam momentos de fragilidade, em que vivemos da cultura do imediato, da chupeta da televisão, da cada vez maior inexistência de ideais partilhados, onde os gostos e opiniões passam a ser momentâneos, descartáveis e provisórios – como as stories do instagram-, onde se venera e gratifica o individualismo, em que se atenuam as imagens estruturais do trabalho, da família e dos laços humanos, não terá também mudado o sofrimento psicológico?
Na procura de algo que satisfaça no imediato, na fuga constante ao aborrecimento e ao tédio, na procura do outro para iludir os sentimentos depressivos e o verdadeiro contacto com o próprio, como se desenvolve a capacidade de estar só e com o outro? Onde fica o terreno para construir o processo identitário individual e relacional?
Na inerente transformação da entrada para a adolescência em que impera o desafio da identidade, em que é preciso sentir-se em casa dentro do próprio corpo, ter uma bússola orientadora do caminho que se vai seguir (ou que pelo menos permita que se possa ir descobrindo) e em que é imperial  reconhecer-se (o próprio) e ser reconhecido/visto (pelo outro), quais são os modelos que estamos a construir?
Desvalorizamos, inconscientemente, o adolescente, porque não é adulto, responsabilizamo-lo, porque não é criança, queremos que cresça e que faça, que seja e que planeie, que suporte e dirija, mas não validamos quando sente, quando pensa, quando quer, quando projecta (porque é criança e não adulto)… não abrimos assim espaço para a psicopatologia? Será o sofrimento calado, bebido, consumido, cortado, apenas uma fase? Ou será um grito do desespero, do desamparo, da insegurança?
            Cada vez mais predominam, nesta fase de desenvolvimento, as chamadas “patologias do agir” – toxicomanias, alcoolismo, perturbações/distúrbios alimentares, comportamentos autodestrutivos (que podem potenciar o suicídio) e híper sexualizados, depressões entre outras. Entre o desejo de experimentar e descobrir, na fantasia idealizada da ausência de limites, não serão estes quadros uma tentativa de limitar a experiência?
            Estaremos a estruturar futuros adultos com recursos psíquicos frágeis?
            Sendo esta uma fase de tantas transformações aliada a todas as mudanças sociais e culturais envolventes da época que vivemos, onde fica o espaço para a estruturação do psiquismo?

            Servirá, assim, o contexto psicoterapêutico para ajudar a ouvir aquilo que está escondido pelo agido.








quarta-feira, 20 de novembro de 2019

Tempo gasto em exercício...







Já pensou na quantidade de coisas que pode fazer em 5 anos? Pense nisso, reflicta e agora leia o resto do texto. 

Um recente estudo, levado a cabo durante 20 anos e envolvendo quase 4 milhões de pessoas veio confirmar que fazer atividade física de forma regular previne a morte prematura por causas gerais e/ou por doenças cardiovasculares. Mesmo para quem se desculpa com a falta de tempo, o estudo revela que a partir do momento em que o indivíduo se começa a mexer, a melhoria da qualidade de vida aumenta , ou seja, não há um mínimo a ser feito, é preciso é começar. Até os chamados atletas de fim de semana, tiveram uma diminuição de mortalidade prematura perto dos 30%.

Se pensar no tempo que precisa semanalmente para fazer exercício, e colocar na balança, o tempo que pode ter a mais de anos de vida com qualidade, cerca de 5 anos a mais de esperança média de vida, com toda a certeza que vai querer começar a mexer-se mais e melhor já hoje. Lembre-se que o tempo “gasto” com exercício, é um investimento a curto, médio e longo prazo na sua saúde e longevidade.



Bons treinos 

Hugo Silva


Instagram: hugo_silva_coach
-Licenciatura Educação Física/Especialização Treino Personalizado
-Pós-Graduação em Marketing do Fitness 
-Pós-Graduando em Strength and Conditioning
-Director Técnico ginásio Lisboa Racket Centre


quinta-feira, 14 de novembro de 2019

Álcool, um agente de regulação emocional...






A dependência do álcool, e os problemas relacionados com o consumo do mesmo, têm uma forte incidência na nossa cultura e constituem um grave problema de saúde pública; afeta não só o indivíduo, nas dimensões física, mental e emocional, mas também a sua família e a sociedade. É uma perturbação que se encontra implicada em problemas como a violência, acidentes rodoviários e a baixa produtividade ou a abstinência no trabalho.

Vários autores de uma linha psicanalítica (como Philip Flores e Ana Mónica Dias) se questionaram sobre este fenómeno no sentido de trabalharem sobre a sua compreensão e tratamento e afirmam que a instalação do alcoolismo acontece como um movimento de auto-cura ou auto-reparação, uma vez que o álcool produz fortes efeitos nos estados emocionais e afetivos e por isso atua muitas vezes como um agente de regulação emocional.

Constata-se de facto que o uso do álcool aparece muitas vezes associado ao alívio da dor emocional, em estados depressivos e/ou de ansiedade. Mesmo que só por momentos, este serve bem o objetivo de escapar a sentimentos de privação, vergonha ou inadequação. Observa-se que pessoas com dificuldade em estabelecer ligações reguladas emocionalmente no seio das suas relações intímas têm grande tendência a compensar tal dificuldade com o recurso ao álcool e drogas numa tentativa de se autorepararem.

Segundo diversos estudos, as pessoas dependentes de álcool revelam habitualmente elevada instabilidade emocional, têm tendência a experienciar afetos negativos tais como a tristeza, o medo, o embaraço, a raiva, a culpabilidade e a sentirem-se inseguros, incompetentes, nervosos e preocupados. Têm também dificuldade em controlar os impulsos e em lidar com situações de stress. Alguns destes aspetos também já exacerbados pelo própria dependência, trata-se de um tipo de “automedicação” com elevados efeitos secundários.

Denota-se que na grande maioria dos casos de alcoolismo existe uma falha nas relações significativas, nas suas funções essenciais de providenciar um ambiente empático, tranquilo e seguro, onde existe reconhecimento do próprio e do seu valor, em suma um ambiente que possibilita a construção saudável da auto-estima. Entende-se que os vínculos estabelecidos nas relações íntimas estejam caracterizados por insegurança, ansiedade e pouca confiança nos outros.

Estes dados, provenientes da observação clínica e de reflexões teóricas e empíricas, confirmam a necessidade do tratamento psicoterapêutico de pessoas dependentes de álcool, onde se constrói uma nova relação que possibilitará elaborar as falhas ocorridas e construir um novo modelo de relação e do próprio, e constituem como que um mapa para o tratamento onde estão devidamente sinalizados os diferentes aspetos que constituem (potenciais) fragilidades da pessoa e são portanto essenciais para o eficaz tratamento desta problemática.








quinta-feira, 7 de novembro de 2019

Por onde andam os afectos na Era do Burnout?




Habituámo-nos a viver em contra-relógio como se a vida fosse uma autêntica gincana que nos coloca em prova todos os dias. Na contemporaneidade que nos caracteriza somos guiados por uma bússola que nos impele a correr de manhã à noite. 

O contra-relógio começa cedo pela manhã, e os desafios são muitos, mesmo antes de nos encontrarmos no local de trabalho, seja pelo trânsito que nos acompanha desde a porta de casa à folia de deixar os miúdos na escola. 
Quando finalmente chegamos ao local de trabalho, a luta contra o tempo é maior ainda e a competição direccionada aos outros ou a nós próprios, não nos deixa esquecer que a corrida continua.  Aqui, os desafios são outros, são mais complexos, mais conflituosos, mais exigentes e também mais impossíveis! 

Os psicoterapeutas, recebem em consulta e cada vez em maior número, vários casos de ansiedade, depressão e exaustão mental relacionados com a actividade profissional, por excesso de trabalho ou por conflitos interpessoais. São vários os quadros psicológicos e físicos que têm proveniência no desgaste emocional e no desequilíbrio provocado pela vida profissional. 

Com especial atenção a este fenómeno, a OMS incluiu, este ano, o ´Burnout´na nova classificação internacional de doenças. Esta síndrome apresenta uma vasta sintomatologia que se estende por um longo período de tempo. Sensação de cansaço permanente, baixa produtividade, apatia e isolamento social, alteração do sono e alimentação, dores de cabeça ou musculares, sentimentos de inutilidade e fracasso, sentimento de realização profissional muito baixo, tristeza e irritabilidade, são alguns sinais que podem indicar a presença de um stress excessivo e patológico.
Como pode a vida profissional ter um impacto tão nocivo e condicionar o funcionamento psicológico?

O ser humano necessita, à partida, de condições básicas emocionais para conservar a integridade e equilíbrio psíquico - sentir um bem estar interno individual onde o desejo, a ambição, o sonho e a esperança assumem o papel de protagonistas é uma dessas condições. Sentir-se ligado afectivamente aos outros e criar vínculos que se expressam em relacionamentos mais ou menos íntimos é essencial e ajuda a manter as estruturas psíquicas saudáveis.
Por outro lado e, também com vista à manutenção do equilíbrio interno, utilizamos um conjunto de mecanismos psicológicos que nos protegem de possíveis situações desestruturantes provenientes de diversos eventos da vida.

No Burnout percebemos que estes elementos estão completamente desajustados, seja por défice ou por excesso. 

As actividades laborais caraterizam-se atualmente por elevada contenção e inibição, escassez de criatividade e falta de interações interpessoais sadias, onde a competição toma o lugar da cooperação, a ausência de investimento cria apatia e a esperança é suprimida. Este contexto promove a presença de movimentos defensivos de forma exagerada e desencadeia o aumento do sofrimento,criando uma vida psíquica vazia e desprovida de sentido. Psicologicamente, a pessoa deixa de desejar, investir e arriscar, muitas vezes anulando do seu dia-a-dia as actividades que mais prazer lhe trazem.

É irónico que o lugar e o tempo dos afectos se torne cada vez mais raro quando a Era da tecnologia nos trouxe mais conforto, mais proximidade e autonomia. Era de esperar que o mundo digital promovesse e facilitasse o contacto com os afectos. Mas não! Os afectos são substituídos por vínculos frágeis, robotizados, empobrecidos e pouco criativos. Os relacionamentos e os investimentos individuais são mascarados e virtuais no estar e no sentir.

Contrariamente ao que viver em contra-relógio favorece, são os afectos autênticos e ricos – composto emocional primordial, aqueles que sustentam o equilíbrio, a lucidez e a saúde mental.






terça-feira, 5 de novembro de 2019

Paradigma do treino de força...






O paradigma do treino de força continua a mudar. Um grande estudo elaborado na Suécia, acompanhou mais de 1 milhão de adolescentes, onde foram testados níveis de força e capacidade aeróbia. Estes adolescentes, foram depois acompanhados ao longo de 30 anos.

Os resultados após 30 anos de acompanhamento foram claros:

- Maior risco de invalidez para participantes com menores níveis de força;
- Mais baixas médicas para quem apresentava menores níveis de força;
- Mais problemas psiquiátricos associados a baixos níveis de força;
- Maior taxa de invalidez, quando combinados baixos níveis de força e capacidade aeróbia;
- Obesidade na adolescência acarreta maiores riscos de incapacidade, absentismo e invalidez na idade adulta;

Nunca nos devemos esquecer que os jovens de hoje, serão os adultos de amanhã. Devemos ter a consciência coletiva que o exercício regular, funciona como um fator de longevidade, autonomia e qualidade de vida a médio/longo prazo.



Bons treinos

Hugo Silva


Instagram: hugo_silva_coach
-Licenciatura Educação Física/Especialização Treino Personalizado
-Pós-Graduação em Marketing do Fitness 
-Pós-Graduando em Strength and Conditioning
-Director Técnico ginásio Lisboa Racket Centre




quinta-feira, 31 de outubro de 2019

Estou com dor de barriga....







Sentimos emoções todos os dias, umas vezes mais através do corpo, outras, através da mente. Temos dores de barriga quando nos sentimos nervosos ou ansiosos, às vezes perante uma tarefa difícil de realizar, um teste, uma avaliação no trabalho. Sentimos dificuldade em respirar quando perante uma notícia grave ou chocante para nós nos parece faltar o ar. Podemos ter dores de cabeça fortes na manhã em que vamos trabalhar – não nos apetece ir, podemos recear estar prestes a ser despedidos ou quem sabe, sermos nós quem vai ter de despedir alguém. Às vezes, quando estamos apaixonados, sentimos borboletas na barriga e perdemos o sono e o apetite. Corpo e mente são, como defende Patrícia Câmara (2019), psicóloga e Vice Presidente da Sociedade Portuguesa de Psicossomática,  indissociáveis e, por isso, pensá-los de forma separada pode ter uma função redutora e limitativa quando se pensa no ser humano enquanto pessoa que se relaciona consigo própria e com o mundo envolvente. Quando, por outro lado, pensamos a pessoa e a sua relação com o exterior integrando estas duas componentes – mente (psykhé) e corpo (soma) – estamos a pensar de forma integrada e psicossomática.

Na primeira etapa da nossa vida, que é a infância, Cohen e Marcelli (2006), ambos pedopsiquiatras, consideram que não há nada de mais psicossomático do que um bebé. O corpo ocupa um lugar de destaque no complexo campo das interações com o mundo externo, em que as várias funções fisiológicas (alimentação, tónus estático e dinâmico, eliminação esfincteriana) servem de base para a comunicação com o externo, o qual por sua vez terá o papel de “mentalizar” esse comportamento, através das capacidades de compreensão e antecipação da mãe.

 Para Winnicott (1960), pediatra e psicanalista, esta mentalização faz-se não só através da satisfação de necessidades fisiológicas, como também através do “agarrar/pegar” fisicamente o bebé, tendo em conta não só a sensibilidade da sua pele (ao toque, à temperatura, à gravidade) como o facto de que, para o bebé, nada mais existe ainda para além dele próprio numa relação pouco diferenciada com a sua mãe. As necessidades do bebé, apesar de manifestas fisiologicamente através do corpo, são também psíquicas, não podendo ser satisfeitas de forma mecanizada, implicando uma genuína empatia por parte da mãe.

Quando existem, por outro lado, falhas na relação de cuidado materno-devido à existência de uma depressão pós parto prolongada, uma situação de luto ou crise na família, por exemplo, o sentimento do bebé enquanto ser coeso e seguro do ponto de vista identitário  pode, nesta fase de construção, ser posto em causa. É a falência do continente materno, ou seja, do aparelho psíquico da mãe que, segundo Coimbra de Matos (2003), psiquiatra e psicanalista, impede o bebé de desenvolver a capacidade de leitura dos próprios afetos e interações, o que condiciona o desenvolvimento emocional e simbólico. É neste condicionamento que se adoece psiquicamente, em que o rasto somático é o único registo de uma experiência frustrante ou de privação afetiva (Coimbra de Matos, 2003). Como se só o corpo pudesse sentir.

Nas crianças e sobretudo nos bebés, o sintoma psicossomático assume um lugar privilegiado no sistema de interação mãe/filho, devendo ser considerado nessa perspetiva. Dominada com frequência pelas perturbações do sono e alimentares, mas também pelas perturbações da pele (eczemas), a expressão somática na primeira infância pode contudo ser muito diversificada, devendo ser analisada quanto à sua localização, extensão, importância, entre outros fatores.  A perturbação do sono no primeiro semestre, por exemplo, poderá estar relacionada com atitudes maternas inconscientes contraditórias, conduzindo à emissão de mensagens opostas por parte da mãe ou a uma dificuldade no ajustamento da distância afectiva entre ela própria e o bebé, podendo oscilar entre aproximações  fusionais e afastamentos bruscos. A ocorrência de uma depressão materna durante a gravidez poderá, também, estar na origem destas perturbações, uma vez que limita as capacidades maternas de escuta das necessidades do bebé, perturbando o seu sono (Mazet et Stoleru, 2003). A alimentação, por estar no centro da relação mãe/criança, quando perturbada - através do vómito ou anorexia do segundo semestre, por exemplo - pode apontar para dificuldades na satisfação da necessidade primária de ligação do bebé à mãe ou para dificuldades da mãe em relação ao investimento no seu bebé (Mazet et Stoleru, 2003).

Seja qual for a perturbação de expressão psicossomática, ela parece ser, antes de tudo, o reflexo de conflitos intrapsíquicos dos pais, sendo importante, além de uma atenta observação da relação pais/bebé ou mãe/bebé, escutá-los com atenção e disponibilidade. A história de vida da mãe, em particular, e a forma como percepcionou e vivenciou os laços afectivos com a sua própria mãe e com o seu pai são dados fundamentais na compreensão das expressões somáticas no bebé. A sua resolução depende muitas vezes de um processo psicoterapêutico da mãe, do pai, ou de ambos.






quarta-feira, 23 de outubro de 2019

A doença crónica e a família...





Quando o diagnóstico de uma doença crónica surge, apanha toda a família de surpresa. Independentemente da doença diagnosticada, este é sempre um momento de crise. A crise resultante da convivência com uma doença crónica resulta muitas vezes da dificuldade que a família tem em adaptar-se às mudanças na sua rotina normal e obriga cada elemento da família a fazer ajustes a fim de lidar com a situação.

Naturalmente, nem todos os membros da família são afetados da mesma forma, dependendo das suas características individuais, da sua maturidade e personalidade. A família terá de aprender novas capacidades para prestar os cuidados ao elemento doente e vê-se obrigada a ajustar as suas atitudes, emoções, estilos de vida e rotina. É compreensível que esta situação exija cada vez mais perseverança da parte da família.
Ao contrario do que se possa pensar, não são os profissionais de saúde e muito menos os médicos os primeiros e principais cuidadores dos doentes crónicos. Este lugar cabe fundamentalmente aos familiares. As famílias são o recurso mais valioso para o entendimento e o cuidado da doença crónica.

A família enfrenta três fases de adaptação psicológica à doença crónica: a negação da doença no momento do diagnóstico; a desorganização familiar e consequente necessidade de reajustamento familiar às novas rotinas e a adaptação à doença e aos seus efeitos tendo em conta as características da mesma.

As doenças crónicas têm consequências psicológicas e sociais importantes, exigindo uma adaptação psicológica significativa. Confrontam o doente e a sua família com inúmeras ameaças e desafios, suscitando neste diferentes necessidades adaptativas — a necessidade de preservar um equilíbrio emocional razoável; a necessidade de manter um sentido de competência; a necessidade de conservar relações com a família e amigos; e a preparação para um futuro incerto. As incertezas no diagnóstico, a incapacidade, a dependência, os estigmas sociais e as alterações no estilo de vida são outras características das doenças crónicas que requerem adaptação. De forma a manter níveis adequados de funcionamento emocional, físico e social — expressos pelo bem-estar e qualidade de vida — os doentes e as suas famílias têm de lidar com estas ameaças e desafios impostos pela doença.

A Psicologia contribui para ajudar o doente e a sua família a manter o equilíbrio e compreender o funcionamento dos conflitos enfrentados devido à patologia vivenciada. O papel do psicólogo é oferecer ao paciente instrumentos terapêuticos para ajudá-lo a diminuir o seu sofrimento e ter uma compreensão mais ampla sobre a sua desorganização psíquica e encorajá-lo a criar novas possibilidades de enfrentamento.

Vivenciando os estágios emocionais de pessoas que sofrem de doenças crónicas e dos seus cuidadores, a psicologia pode contribuir muito para apaziguar angústias, conflitos e aflições.
Conviver com uma doença que não tem cura não deve significar render-se, abdicando de sonhos e objetivos. Por mais grave que uma patologia seja, por mais cruel o seu diagnóstico, o paciente e os seus cuidadores precisam sempre de contar com o acompanhamento psicológico a fim de encontrarem um novo equilíbrio.

Nunca devemos subestimar as capacidades da família. Descobrem-se forças onde pareciam não existir e, por vezes, esta experiência vivencial pode ser fonte de crescimento e de uma nova união familiar.