quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

Pais e filhos no mesmo armário...








... da clareira partiam dois caminhos,
os dois clássicos de todas as histórias de encantos e prodígios:
um asfaltado, cómodo, ladeado de amendoeiras em flor;
o outro, pedregoso e eriçado de espinhos, urtigas e urzes...
         (...)
- És a fada dos dois caminhos?...
- Bem, bem. Deixa-te de lérias - impacientou-se João Sem Medo.
- E, já agora, toma a sério o teu papel de fada e aconselha-me
qual dos caminhos devo seguir: o asfaltado ou o dos pedregulhos? 
- Olha menino - elucidou o contínuo.....o bom caminho conduz à Felicidade.
E o mau, à infelicidade...
- Vou pelo bom caminho, como é costume, claro - resolveu João Sem Medo,
 embora desconfiado de tanta facilidade aparente. - O contrário seria idiota e doentio. 
Entretanto no caminho da Felicidade surge um descabeçado que diz:
- Que a paz e a estupidez sejam contigo. Vens preparado para a operação?
- Que operação? - interrogou João Sem Medo, suspeitoso.
    (...)
- Ninguém pode seguir o caminho asfaltado que leva à Felicidade Completa
 sem se sujeitar a este programa bem óbvio. Primeiro:
consentir que lhe cortem a cabeça para não pensar,
 não ter opinião nem criar piolhos ou ideias perigosas.
 Segundo e último: trazer nos pés e nas mãos correntes de ouro...
    (...)
- Não, nunca. Então prefiro o outro caminho. 
- Palerma! - lamuriou o guarda ( descabeçado) com os olhos
do peito marejados de lágrimas sinceras.
Vais passar fome, sofrer dias de terror aflito...

Quantas vezes ouvimos a expressão: “está na fase do armário” quando nos referimos a um adolescente? E os pais? Estas mudanças não são só nos adolescentes. Hoje, o nosso desafio, é  colocar pais e filhos dentro do mesmo armário!
A adolescência é uma fase de desenvolvimento complexa e que acarreta um conjunto diversificado de desafios (de diversa natureza: psicológica, física, emocional e social), não só face ao próprio como a todo o sistema de relações – relação com o próprio, relação com os pais, família e relações sociais.
Por um lado, temos as modificações físicas típicas já tão conhecidas nesta fase (as quais variam consoante se trata de uma rapariga ou rapaz), aliadas às competências físicas que se alteram e ao desenvolvimento da maturidade sexual (início da sexualidade e intimidade) regulada pelas hormonas. Além das mudanças físicas que operam num plano concreto e visível temos também aquelas que operam a um plano mais subjectivo – o desejo e vontade de se autonomizar sobre um corpo, simbolicamente até aí, "pertença" dos pais – essencialmente ao nível de tarefas como por exemplo, o vestir, o pentear, por creme, etc.
Esta reestruturação na forma como o adolescente se vê a si também actua na forma como vê os outros, permitindo este processo que se possa ir instalando um outro, de individualização e procura de autonomia nos contextos sociais. O aumento do desejo e da necessidade de exploração de novos ambientes fora do eixo familiar, o querer cada vez maior de pensar sobre e por si próprio anda de mãos dadas com a vontade de tomar decisões e, quando tomamos decisões temos sempre responsabilidade sobre as mesmas. Tal como o João Sem Medo, que escolhe o caminho da infelicidade regulando, ele próprio, a possibilidade de pensar e criar piolhos na cabeça…
O querer crescer, o querer pensar sobre si, o querer caminhar com outros não elimina, contamina ou diminui a necessidade de apoio e suporte familiar, apenas requer que possa existir um espaço contentor e securizante de transformação na expressão destas necessidades e na forma como se espera receber este mesmo apoio (sendo diferente de fases anteriores).
Todas estas mudanças (a par da conquista de uma maior autonomia) até então tão desejadas são fonte de grande ansiedade e insegurança, não só para o jovem – que a passo e passo vai flutuando entre os momentos da pequenez da infância e do jovem que já vai começando a ser capaz de pensar e agir sobre si-, como para os pais – na medida em que todas estas transformações geram movimentos no sistema familiar que requerem, muitas vezes, reorganização parental, do casal e da própria família. De forma transversal demandam, ao longo do tempo, uma reorganização no sistema de ligações (no que se refere aos papeis) como a uma reorganização da comunicação. Inerentemente olhamos para uma dualidade entre a independência e a existência ou estabelecimento de limites consistentes e resultantes da funcionalidade do próprio sistema familiar em momentos anteriores.
Se nos posicionarmos num local e num momento em que a “separação” dos filhos da família nuclear é um objectivo não só muito importante, como arriscaria a dizer essencial, no que se refere à saúde mental dos indivíduos e das famílias, este poderá também estar sujeito a um conjunto de forças ambivalentes muito importantes em que operam vários factores, dos quais: as expectativas dos pais – ou seja, a forma como os pais percepcionam, compreendem e representam as alterações e transformações do adolescente; a reorganização identitária dos pais e, claro, a forma como os próprios pais lidaram com as suas mudanças em adolescentes. Sendo um grande desafio para os pais, neste momento de grandes transformações, poderem recordar a forma como também eles fizeram estas separações enquanto adolescentes.

É essencial que todas estas mudanças possam ser pensadas, compreendidas e elaboradas de forma a poderem ir sendo, passo a passo, integradas nesta identidade que se está cada vez mais a formar e a desenvolver.


Drª Inês Lamares
O Canto da Psicologia




O Homem-Brisa...







O homem-brisa nunca levantou a voz, deslizava de pasteleira sem mãos pela estrada e não havia curva nem contracurva que o vencesse. Queria ser aprendiz de serralheiro, mas foi dar com os ossos a Angola, depois de umas chumbadas na instrução primária, uma guarda ocasional das redes da equipa de futebol lá da terra e uma adolescência de baixo ventre viçoso e ativíssimo, à boa maneira do picha de açúcar que nunca desilude saia amiga por campos e hortas.

O homem-brisa nem sequer se chateou quando levou dois estilhaços no pername numa picada africana e regressou da guerra como quem tinha ido só ali à venda buscar meia onça de tabaco. Casou, foi de mecânico a lapidador de diamantes e não cuspiu no fado quando o último ofício o deixou parcialmente surdo. Encarou tudo com um grão de sal porque a vida é isto mesmo e, antes, fez dois filhos igualmente plácidos de juízo e bons de mãos.

O homem-brisa agarra em tudo o que é tralha para fazer muita coisa a partir de quase nada. De dois carros, fez um. Chamou-lhe Bolinhas.

O homem-brisa também não foi por arrelios quando - já cá aqui com o brotas  no pedaço só para atrapalhar -, me tentou ensinar a pescar e nadar a todo o Tejo, assistindo com a brandura dos justos a todas as minhas falhas miseráveis.

O homem-brisa tinha umas galdinas Levi’s de bombazine à boca de sino que ainda lhe tentei gamar em vão.

O homem-brisa é um homem bonito, do rosto ao coração.

Quando penso no homem-brisa nesta estupidez que tem sido a minha existência, irrito-me e sinto a cabeça a arder por não estamos mais vezes juntos só para conversarmos tudo a dizer pouco.

O homem-brisa foi filho, é irmão, pai e tio. Meu tio. O tio Ernesto.
Nunca levantou a voz. Deve ser feliz.



FILIPE ALEXANDRE DIAS
Jornalista

O CANTO DA PSICOLOGIA




segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Sintomas de fraca ativação dos glúteos..





Sabemos hoje em dia, o papel fundamental que os glúteos representam na nossa saúde muscular e osteo-articular, mas nem sempre associamos alguns sintomas dolorosos ou disfuncionais à inibição destes músculos (diminuição de recrutamento de fibras musculares). Os Glúteos são responsáveis pela retroversão da bacia e flexão, extensão, rotação externa, interna e abdução das coxas, ou seja, são músculos muito importantes em todo mecanismo da cintura pélvica devendo ser extraordinariamente potentes e fortes. Se apresenta algum destes sintomas abaixo referidos, procure um profissional de exercício e saúde que o ajude a perceber se efetivamente tem o glúteo inibido:

- fraca mobilidade da anca;
- dores nas costas;
- dores nos joelhos;
- desequilíbrio dos músculos posteriores das coxas e músculos adutores;
- inflamação da zona pélvica;
- fascite  plantar;
- diminuição de performance em exercícios de potência e explosão

Fazer agachamentos em todos os treinos, não traduz que tenha uma boa ativação dos glúteos. Esteja atento aos sinais.


Bons treinos

Hugo Silva 
Instagram: hugo_silva_coach
Linkedin: http://linkedin.com/in/hugo-silva-1b8295132
-Licenciatura Educação Física/Especialização Treino Personalizado
-Pós-Graduação em Marketing do Fitness 
-Pós-Graduando em Strength and Conditioning
-Director Técnico ginásio Lisboa Racket Centre 




quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Bichos carpinteiros/Hiperactividade - Take 2






O tema da hiperatividade tem sido muito debatido mas voltemos a ele uma vez mais, e voltemos as vezes que forem necessárias enquanto assistirmos à tendência e pressão para medicar as crianças que manifestam alterações de comportamento.

Numa primeira linha, há um aspeto fundamental que muitas vezes é negligenciado. Refiro-me à agitação natural da infância - “como é que conseguem ter tanta energia?” é um pensamento tão comum em nós, adultos, quando olhamos para uma criança com todo o seu frenesim. Se formos capazes de nos lembrarmos da nossa infância entendemos na perfeição, na infância o tempo é outro, o ritmo também e para nós também a energia parecia muitas vezes inesgotável.
Na escola, os currículos e a duração das aulas e dos recreios estão desajustados das necessidades e características das crianças. As crianças têm tanto a aprender para além da aprendizagem formal, aprendizagens em forma de experiências, de reflexões, de deixar-se sentir, do movimento, das quedas, de entender os limites do seu corpo, e por aí fora... O que fazem com toda aquela energia, com a necessidade de explorar, experimentar, tocar as coisas para as compreender? São aspetos fundamentais para a construção da própria capacidade de pensar e a sala de aula pode ser um lugar insuportável se não tiverem oportunidade de satisfazer estas necessidades.
Fora da escola, os ritmos de que se fazem os nossos dias são muito intensos e cada vez mais programados, onde a espontaneidade das crianças parece não encontrar espaço para acontecer.
Não poderá isto, sem qualquer caráter psicopatológico, propiciar um comportamento desajustado na sala de aula?

Numa segunda linha, deparamo-nos com a vivência de ansiedade e angústia, sentimentos que transbordam o corpo, que a criança não tem ainda capacidade para pensar e portanto a tendência é agir, quer seja ficando irrequietos ou mais agressivos. O aparelho mental infantil não dispõe ainda de recursos suficientes para pensar o seu sentir, para dar sentido às suas emoções e ser capaz de as digerir e elaborar, tanto mais quanto mais disruptivas forem as suas experiências de vida e menos suporte emocional tiverem.  Uma criança ansiosa é muitas vezes uma criança que não pára e age à mercê dos seus sentimentos.
Este aspeto pode ligar-se a questões de carácter mais psicopatológico, que pode ter a ver com um funcionamento mental mais regredido ou com algo mais pontual e reativo a alguma situação perturbadora.

Emílio Salgueiro entende hiperatividade como uma “resposta psicomotora ajustada a circunstâncias pessoais, familiares, escolares e sociais sentidas como intoleráveis” (Revista Portuguesa de Pedopsiquiatria, 2005).
Depois dos diagnósticos de hiperatividade filtrados e compreendidos à luz destes aspetos, questiono-me no final das contas qual seria a incidência deste diagnóstico e das crianças medicamentadas.

Nem de propósito, reforçando a necessidade de falarmos sobre este tema, foi noticiada uma medida preocupante adotada por escolas na Alemanha. O uso de coletes de areia, que podem pesar entre 1,200 e 6 quilogramas, com o objetivo de acalmar e manter sentadas as crianças consideradas hiperativas ou indisciplinadas. Desta forma resolve-se no corpo, o que o corpo extrassa em forma de alerta do que a mente não consegue conter? Impõe-se uma restrição, prende-se o movimento, invade-se a liberdade ao invés de ensinar e de encontrar soluções que permitam ao próprio descobrir formas de se conter? Parece-me que esta prática vai no sentido contrário do que a comunidade educativa deveria adotar.

Em Portugal os dados da Infarmed são alarmantes, relatam um aumento de medicação das crianças com diagnóstico de hipertavidade e défice de atenção (metilfenidato) de 133 mil em 2010, para 270 mil embalagens em 2016. 

Continuemos então a debruçar-nos sobre este tema e a procurar sempre a melhor forma de ajudar as “nossas” crianças, afinal de contas quem nunca ouviu esta frase na sua infância: - Parece que tens bichos carpinteiros! E não havia ritalinas na altura...


Drª Filipa Rosário
O Canto da Psicologia



quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

É tarde para ser bom, Johnny?...






Johnny chamava-se mesmo assim, surgiu do nada, bateu-me em tudo e fez com que o mundo me pontapeasse no plexo solar. Das sardas a um par de olhos refulgentes, dos brinquedos marcianos que arrecadavam os meus legos na Idade Média sem remissão até ao cabelo cor de fogo, Johnny vinha de outro planeta, todos o queriam, acordou-me para as minhas imperfeições e a maltosa lá da rua pôs-me de lado como quem larga um mau hábito. Johnny não sabia juntar as palavras que eu conhecia, soltava coisas ininteligíveis que arrancavam risos a todos - menos a mim… - e um dia procurava alguém com quem brincar na ruela que só passou a ter olhos para ele mas que naquele dia só nos encontrou na nossa pequenez. Tinha uma bola oval, esquisita, com cordões de lado. Diferenças que me deixavam em erupção. Instantes depois, lembro-me de o ver curvado a sangrar profusamente do nariz - cortesia do malévolo soco que lhe dei por trazer tantas invejas no punho. Antes de passar pela minha mãe em cambaleios e choros, Johnny falou pela primeira vez em português mascavado a caminho de casa: "Elhe não gota de mim..." 

Seguiu-se a carga de lenha que D. Eugénia tão bem me aplicava no lombo. Pingos secos vermelho-criança ficaram anos a pintar o lajedo do jardim. Um lembrete do traste que eu podia ser e do Johnny que não tornei a ver.

Sinto todas as doenças ao achar que não gosto de alguém. Não gosto de achar que não gosto. Nunca mais soube não gostar desde Johnny. É o medo de, por afinal tanto gostar, enfrentar a imensidão do que em mim não gosto.

Johnny, tu que não me lês, ficas a saber que voltei a andar ao biscoito, não levei a porrada toda que merecia, mas nunca mais me fugiu um pedido de desculpa. Só falta mesmo pintar umas sardas, fingir que sou bonito e que me partam o nariz para ser bom como tu. Achas que é tarde?….



FILIPE ALEXANDRE DIAS
Jornalista



quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

Quando a realidade virtual se confunde com a realidade ...






Vivemos, actualmente, na correria desenfreada da conquista dos likes, da procura dos tweets e do encontro com o melhor filtro do instagram, não esquecendo as respostas que estão pendentes no whatsapp.
- "Tem wifi?" - uma pergunta cada vez mais obsoleta, considerando que actualmente todos nós arranjámos de uma maneira ou de outra, forma de estar online sem restrições. Vivam os pacotes de dados e as ligações wireless que nos trazem a uma nova realidade: a realidade virtual! A realidade que expõe e esconde, a realidade que alegra e entristece, a realidade que é transparência e camuflagem paralelamente. 

É de conhecimento geral que a revolução tecnológica nos aproximou e trouxe consigo o poder do conhecimento, tornou tudo mais fácil e acessível. Contudo, também é esta Era a responsável por novos tipos de dependência, episódios de ansiedade, situações de isolamento e desesperança e comportamentos anti-sociais.
Como psicoterapeutas não podemos negligenciar esta forma de estar, sentir e relacionar. Não nos pode ser alheia a dinâmica virtual e a forma como todos os movimentos psicológicos e sociais se vão adaptando à azáfama virtual. A dedicação cada vez maior a este mundo em detrimento do mundo externo tem que nos fazer reflectir sobre o impacto naquilo que é um dos grandes pilares responsável pela saúde mental: a Relação. Sabendo que a qualidade das relações determina o bem-estar físico e psicológico, importa analisarmos e compreendermos o seu funcionamento nos mais diversos contextos. 

- “Como andam as re(lações)des sociais?” – já todos nós ouvimos relatos ou presenciámos a facilidade com que as crianças são entregues aos [educadores virtuais], autênticos milagreiros na altura da refeição ou naqueles momentos em que estão particularmente impacientes. Já todos nós presenciámos a urgência da captação em foto ou vídeo para o tão esperado post em subtracção ao sentir e vibrar de um concerto. Já todos nós nos apercebemos que são necessárias 10, 20 ou 30 selfies para que apenas uma seja eleita para publicação.
Sabemos da importância que as relações afectuosas e emocionalmente ricas têm na promoção de estabilidade, confiança, segurança e capacidade de superação. Pessoas com vínculos sólidos decorrentes de relações com qualidade são mais saudáveis e felizes. Em oposição, temos as relações inseguras que originam muitas vezes sintomatologia psicopatológica associada a desesperança e comportamentos de risco.

Deparamo-nos assim, entre outras problemáticas associadas a este tema, com duas frentes muito significativas. Por um lado, a enorme dedicação de tempo à realidade virtual em detrimento da realidade externa e por outro, a fraca qualidade que emerge das relações, resultante da busca contínua e imediata de validação virtual do outro, bem como da procura de um vínculo, ainda que superficial e frágil que contenha algumas das angústias existentes.

Como psicoterapeutas temos a obrigação de estar online face a esta realidade.


Drª. Fanisse Craveirinha
O Canto da Psicologia



quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

Quando há mães e pais, quem precisa de supernanny's?





Quando se senta no nosso sofá, vemos o seu cansaço. Percebemos que provavelmente já está assim há muito tempo, que talvez não saiba precisar ao certo quando tudo começou. Sucedem-se os desabafos, as queixas, as lágrimas. É assim ser-se pai ou mãe. Desafiante, desesperante por vezes, mesmo que simultaneamente o melhor do mundo. Primeiro pequenos seres no nosso imaginário, depois pequenos pés que correm pela casa. De repente olhamos para trás e não percebemos como é que o tempo passou tão rápido. Será que desfrutámos destes tempos que já não se repetirão? Será que fomos os melhores pais que conseguimos ser? Ser-se pai ou mãe também é repensar o filho ou filha que se foi, é pensar no pai e mãe que se teve. É o reunir de vários papéis numa só pessoa, num jogo entre o passado, o presente e o futuro, com sonhos, memórias e até algumas mágoas à mistura. E às vezes conciliar todos estes papéis é duro, muito duro.

Os desafios da parentalidade são muitos. As dificuldades são constantes, quer se fale em bebés, crianças ou adolescentes. Birras, gritos, exigências, insultos, agressões… garantimos-lhe que já vimos de tudo. Sabemos bem que lhe é difícil passar por isto, que deseja outra realidade para si e para a sua família. Que talvez não durma bem, que chore em silêncio e sem que ninguém veja, que se culpabilize demasiadas vezes, que oiça todos os conselhos que lhe dão de forma ávida, como se alguém, algures, tivesse uma solução mágica. Mas será que ela existe?

Nós n’O Canto da Psicologia, enquanto profissionais com forte sentido crítico e com responsabilidade profissional, não podíamos deixar de lhe dirigir algumas palavras após a estreia do programa de domingo da SIC, Supernanny. Lemos comentários a favor, que apontam o estado de cansaço e desespero de muitos pais, a quem faltam ferramentas para lidar com filhos vistos como cada vez mais insubordinados e exigentes. Outros são contra o programa e consideram condenável a exposição pública das crianças, tendo já surgido inclusivamente comunicados de organismos de relevo, onde é apontado o risco de violação dos direitos das crianças perante tal exposição, levantando-se questões éticas graves que são incompatíveis com o exercício profissional em Psicologia. É com esta posição que nos identificamos, e de facto muito haveria a dizer sobre este programa, que transmite uma imagem deturpada do trabalho de um psicólogo, com conceitos básicos distorcidos ao ponto do não-reconhecimento.

Foi negada a uma criança o direito à sua privacidade e intimidade, e não se procurou compreender o significado dos seus atos; quantos gritos de socorro não estão mascarados de mau comportamento? Houve ainda o infantilizar de uma mãe, um substituir total na sua função materna, após esta, na sua fragilidade, ter pedido ajuda. Mãe e filha ficam à mercê de alguém que diz a ambas o que fazer, colocando-as numa posição equivalente e de submissão. Transmite-se ainda a ideia de que em meia dúzia de encontros se restabelece a harmonia familiar, mediante a adoção de uma atitude firme por parte da mãe, sempre orientada (ou será controlada?) pela psicóloga. Parece-nos essencial destacar que nem esta é a realidade de todas as famílias, nem esta é a maneira como todos os profissionais trabalham.


Para nós, aqui n’O Canto da Psicologia, o aconselhamento parental é outra coisa. Quando se sentam pais no nosso sofá, com a extraordinária coragem de fazer um pedido de ajuda, pensamos que estes talvez também precisem de amparo, de alguém que os ajude a ver por detrás do nevoeiro e que os acompanhe nesta jornada, mas nunca os substituímos no seu papel de pais. No nosso entender, não nos compete enquanto psicólogos dar-lhe receitas mágicas para os seus problemas, numa omnipotência arrogante, como se soubéssemos melhor que qualquer pessoa o que convém à sua família. Estamos dispostos, isso sim, a encontrar essas soluções consigo. Através do diálogo e da compreensão, durante o tempo que for necessário, e com afeto, confidencialidade e total respeito pelas características de cada um, sejam adultos ou crianças. Cada caso é um caso, e cada família é única. Se precisar, nós estamos por aqui para vos ajudar a redescobrir o vosso caminho ao encontro uns dos outros.



Drª Carolina Franco
O Canto da Psicologia


terça-feira, 16 de janeiro de 2018

Treino Funcional




Hoje em dia é muito comum ouvirmos falar sobre treino funcional. Mas o que é isto do treino funcional, exatamente? Este conceito surge no final do século XX através do treino desportivo focado na performance e rapidamente se expande para área do fitness e exercício e saúde. Alguns autores (Juan Carlos Santana, Vernon Gambetta, Gary Gray) defendem que o treino funcional deve incluir os chamados exercícios multidimensionais, ou seja, exercícios executados em vários planos de movimento. Outros autores, como Mel Cunningham, consideram o nome “treino funcional” muito redutor, achando mais correto descrever o exercício como uma melhoria para a competência funcional.
Alguns profissionais do exercício e saúde consideram que, o treino funcional deve ser executado em cima de bosus, bolas suíças, cores e outro tipo de superfícies instáveis, mais parecendo alguns exercícios, verdadeiros números de circo. Do ponto de vista neuromuscular, a abordagem deverá ser diferente.
Os treinadores devem ser capazes de controlar primeiro as variáveis que afetam o controlo neuromuscular (articulações envolvidas, estabilização interna e externa, amplitudes e graus de movimento) e consequentemente, partir de exercícios mais analíticos para exercícios mais integrados ou “funcionais”.
Devido ao grande número de pessoas sedentárias que aparecem nos ginásios e numa perspetiva de saúde, será importante incluir nas rotinas de treino, exercícios funcionais. Importante referir que estas rotinas não deverão visar apenas grupos musculares, mas sim movimentos (agachar, puxar, empurrar, levantar, rodar, alcançar, saltar, etc)
Deixamos-lhe algumas sugestões para progredir de exercícios mais analíticos para exercícios mais funcionais, não precisando de executar números circenses quando vai ao ginásio:
·      Leg Press  vs  Agachamento com barra
·      Agachamento na multipower vs Agachamento com halteres
·      Lunge estático vs Lunge Búlgaro
·      Chest Press vs Supino com halteres
·      Press de ombros na multipower vs Press de ombros com halteres
·      Lat pulldown vs Elevações

Aconselhe-se sempre primeiro com um profissional do exercício e saúde

Bons treinos!


Hugo Silva,

Coordenador Fitness 


quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

o pai do século vinte e um







Longe vão os tempos da expressão “um homem não chora”. Ou pelo menos espera-se que assim o seja, tal não tem sido a evolução do papel do homem na sociedade atual. Poderíamos falar da emancipação feminina, tão fundamental em tempos passados e, lamentavelmente, ainda necessária em tempos presentes. No entanto, optamos hoje por algo diferente, apesar de se poderem encontrar alguns pontos de contacto.

Se nos focarmos no papel que os homens ocupam no seio familiar, particularmente enquanto pais, é fácil ver algumas diferenças em relação a gerações passadas. Não generalizando, mas fazendo-o de qualquer forma, o pai do século vinte e um chora. E muda fraldas. E dá colo quando o bebé faz birra. E opina em relação à sua alimentação. E assiste ao parto, chegando até, quem sabe, a cortar o cordão umbilical, como quem diz “não te carreguei durante nove meses mas agora os meus braços são teus”. Claro que estas não são tarefas essenciais para que um homem alcance o estatuto de pai com legitimidade; queremos apenas demonstrar como a típica imagem paterna enquanto austera, distante e pouco cuidadora parece ter vindo a evoluir para um plano mais próximo da imagem materna, tipicamente associada a cuidados e afetos. Existem naturalmente exceções, e certamente que alguns homens no passado terão desafiado os cânones de então, assim como atualmente outros poderão não querer assumir este papel na vivência da sua parentalidade. Parece-nos, contudo, que este maior equilíbrio entre as funções desempenhadas pelos pais e pelas mães é já uma realidade em muitas famílias.

A bissexualidade psíquica do ser-humano começa a ser reconhecida com toda a naturalidade que lhe deverá ser inerente, sem preconceitos. De facto, a mãe também pode ralhar e impor regras, assim como o pai também pode curar um joelho esfolado com um beijinho. A mãe também pode ter uma carreira de sucesso e estar fora todo o dia, assim como o pai também pode optar por ficar em casa a tratar dos filhos. É uma conquista de ambos, o poderem desafiar o paradigma de género ainda tão disseminado pela nossa sociedade. De forma particular, e voltando à expressão que referimos inicialmente, é fantástico assistir à tomada de consciência de que, afinal, um homem pode chorar e não ser menos homem por isso.


Remetendo para a família, consideramos que é absolutamente essencial que exista um bom equilíbrio entre o casal parental, seja ele diferente do que estamos habituados ou não. Se este se apresentar como uma frente unida, com complementaridade e flexibilidade, é possível a ambos alternar entre funções e tarefas, e dançar juntos ao som de uma música que toca só nas suas cabeças, em harmonia.  




Drª Carolina Franco da Silva
O Canto da Psicologia



terça-feira, 9 de janeiro de 2018

O Novo Ano e as dietas ioiô!




Um dos grandes mistérios à volta das dietas prende-se com o insucesso em manter a mesma durante muito tempo. Não existe uma resposta óbvia, mas existem explicações possíveis.


As excepções!

Muitas pessoas justificam as excepções como o grande problema para não conseguir obter resultados. A excepção é sobrevalorizada! Vamos imaginar que tem uma rotina típica e que faz 5 refeições por dia (pequeno-almoço, meio da manhã, almoço, lanche e jantar) e que todos as semanas tem um jantar farto ao sábado à noite com os amigos e ao domingo tem almoço com a família. Significa que fez 2 refeições erradas num total semanal de 42 refeições. Fazendo as contas quer dizer que falhou em 5% das refeições.
Ainda achas que o problema é desses 5% ou dos 95% restantes que acha que está a fazer impecavelmente?

A dieta!

Um dos maiores problemas é a crença de que lendo bastante na Internet sobre dietas e nutrição que consegue levar a cabo uma dieta. Corre mal mais tarde ou mais cedo. Porquê?
Vamos imaginar que a comunidade científica afirmava que a “dieta do ninho da andorinha” era a perfeita para perder massa gorda. Será? Digo Nim! Porquê?
Nunca nos devemos esquecer que uma dieta é individual e que, se tentamos fazer uma dieta que é genérica para todos, então significa que não é adaptada para si: horários, quantidades, distribuição de macronutrientes, análises clínicas, entre outros, são diferentes de pessoa para pessoa, como uma impressão digital.

Suplementos milagrosos!

A minha tensão arterial mantém-se calma quando me dizem que tomam suplementos para perda de peso porque sei que eles não matam e regra geral não fazem mal à saúde. Mas não se iluda: não existem suplementos com eficácia significativa na perda de massa gorda que justifique pagar mais por eles do que pela consulta.

A minha consulta é que é!

Esqueça, eu não vou dizer isso. A minha consulta simplesmente tem ferramentas que permite individualizar o plano e resolver os problemas identificados depois de analisar as ferramentas e interpretar o que elas nos dizem.  A partir daí é seguir o plano e pensar na regra dos 95%. Vá estamos no pós-saldos, 90%!


Lembre-se, os resultados obtêm-se do Ano novo ao Natal e não do Natal ao Ano Novo!



Júlio de Castro Soares
Nutricionista
Tlm.: 962524966