quarta-feira, 31 de julho de 2013





24 de Julho

Na semana passada não houve sessão. Quer dizer, haver até houve, eu é que não pude ir. Não sei como é que isto foi acontecer! Juro que não sei. Eu bem que tentei organizar-me, cronometrei o dia ao segundo, andei de um lado para o outro à laia de uma verdadeira estafeta! Mas a última quarta-feira foi uma loucura! Aliás, como todos os últimos dias – e talvez todos os que restam!

Agosto bate à porta e os processos que se acumularam disfarçadamente na minha secretária ganham  a forma de um gigante que me faz sentir quase engolida! Depois, são os prazos de última hora, as instituições públicas que entram em hibernação durante todo um mês que poderia ser de trabalho, mas que é de férias (COMO é que um país pode PARAR um mês INTEIRO? Como, se falamos em CRISE? Há coisas que me deixam indignada, mesmo de fazer-me chegar a mostarda ao nariz! Não há quem aguente um País de parasitas! E não vale a pena cair em ilusões! – Sim, Madalena, não vale a pena quereres contar com a boa-vontade da senhora das finanças ou do funcionário do tribunal... Vais ter de te desenrascar sozinha! É isso mesmo, mas, no fundo, já estás habituada!).

Voltando a quarta-feira: como tudo isto pois claro que não houve qualquer hipótese de ir à sessão, e o quanto me custou! Custou na medida em que avisei em cima da hora e percebi que a psicóloga estava já à minha espera... Ainda que conte pagar-lhe a sessão, obviamente! Foi o que acordámos logo no início, sobre as “faltas em cima do joelho”. Mas fiquei péssima de sentir que a fiz esperar em vão. E hoje questiono-me, será que está lá à minha espera? Será que percebeu que eu retomo hoje, quarta-feira, no horário habitual? Ela despediu-se pelo telefone com um “Até para a semana”, mas daí a não se ter confundido, sei lá... Devem ser imensos pacientes...

Pretendo desculpar-me pelo sucedido, mas ao mesmo tempo receio que não esteja lá ninguém para me receber. Ainda assim, vamos lá! Até porque, duas semanas sem lá ir parece-me demasiado. Não dei por isso no frenesim da semana passada, mas agora que me sinto esgotada pelo cansaço e pelas pressões que decidiram disparar de todos os lados, acho que estou mesmo a precisar de me sentir serena, num lugar que seja apenas meu, como aquele.

- Bom dia, Madalena!


Terminada a sessão, desloco-me, perdida entre tanta informação, como se a minha cabeça fosse uma daquelas “Slot Machines” que se encontra nos casinos, a piscar intermitentemente até que, no fim, mas mesmo só no fim, aparece uma espécie de jackpot quando os itens se ligam entre si!

Isto porque, passo a explicar: a minha ausência, de acordo com a psicóloga, foi uma forma de lhe falar da minha zanga, essa que parece que nunca sai por lado nenhum e que até aqui, no MEU diário, é escrita entre parêntesis e dando nome de crise e de mostarda ao nariz ao que me aborrece! Talvez por isso me tenha lembrado durante a sessão da zanga que tive com o pai um destes dias, quando lhe pedi que fosse buscar os miúdos ao ATL e ele me respondeu que não poderia e que eu, adivinhe-se, teria que me desenrascar. Essa palavra que me remete para as ausências dele e para uma educação onde as pessoas não devem apenas não ser parasitas, como serem mouros de trabalho... dos outros! (Entretanto, pobre do tipo do tribunal e da senhora das finanças... Serviram lindamente ao que eu não queria ver, mas a minha zanga, pelos vistos, não é assim tanto com eles...).

E, mesmo para a despedida, lá saí com esta: “É curioso, porque hoje a Madalena trouxe o lado da exaustão, do cansaço, do desgaste... Na semana passada não se trouxe a si... Como se esse lado de uma Madalena que se sente “moura” dos outros se traduzi-se em qualquer coisa deste tipo: enche-se dos outros para se esvaziar de si, não concorda?”...

Encho-me dos outros, para me esvaziar de mim... Será que é assim?
Jackpot.


quinta-feira, 25 de julho de 2013




Nos Preâmbulos da Depressão (Texto I)

“Solidão, não te mereço,
pois que te consumo em vão.
Sabendo-te embora o preço,
calco teu ouro no chão.”

Carlos Drummond de Andrade

A depressão será, provavelmente, um dos conceitos psicológicos mais abordados. No próprio senso comum, é frequente ouvirmos este cunho aplicado às mais distintas condições. É a depressão do vizinho, é a depressão do País. É a depressão daquele que sofre um desgosto de amor, é a depressão do miúdo que quer estar sozinho a ouvir música de subir o volume. É a depressão do colega de trabalho que não se sente reconhecido pelo que faz, é a depressão da amiga que está a viver um processo de luto.

A depressão está, pois, “nas bocas do mundo”, aparecendo enquanto rótulo quase em simultâneo com os sintomas que os outros (ou o próprio) identificam sobre si, quando há uma mudança percebida de comportamento. É a tristeza, é o choro, é o isolamento, é a vontade de estar só, é o desinvestimento. São ainda as insónias, a perda de apetite ou de energia, a indisponibilidade para os outros. Mas se tudo isto poderá caber na compreensão do que é, afinal, a depressão, será que sempre que tais sintomas emergem estamos, efectivamente, a falar de tal diagnóstico ou poderá ser uma outra realidade, à espera ansiosamente de um outro tipo de entendimento? Por outras palavras, será que estar com uma depressão é necessariamente o mesmo que estar deprimido ou estar a vivenciar um momento de maior depressividade? Será que os referidos sintomas não poderão ser a expressão de um outro quadro? ...

Na verdade, se nos parece importante que as pessoas estejam familiarizadas com a terminologia que permite compreender o sentir individual, é também basilar que com esse conhecimento não caiamos num registo lato de classificação, onde tudo um pouco é passível de ser enquadrado no que entendemos por depressão. Paradigmático disso mesmo foi o impacto que este e outro tipo de conceitos teve no consumo abusivo de fármacos (muitas vezes por via da auto-medicação), há alguns anos atrás. Efeito esse, que hoje pagamos com doídas condolências, num sistema implementado onde a dor se cura com comprimidos. Onde o estigma sobre fazer psicoterapia, incrivelmente, existe, onde tudo é magicamente resolvido numa consulta médica, por prescrição de receitas milagrosas, que no lugar da dor colocam uma anestesia dormente, mascarada por um efeito de efectivas melhoras, numa promessa de resolução.

O cenário agrava-se quando a procura de tratamento para a depressão ou para estados depressivos leva, como sucede na maior parte dos casos, precisamente a esse mesmo lugar. A receita é a que já se sabe, anulando consigo o valioso contributo daqueles cuja intuição foi capaz de reconhecer que o tal colega não andava lá muito bem porque o trabalho não ia de feição, ou que a tal amiga precisava de ajuda porque estava num doloroso processo de luto. O que não deixa de ser curioso: porque é que essa intuição, que é espelho da capacidade de entender o outro, nos leva tantas vezes a um processo de ajuda que se circunscreve às indicações terapêuticas de um fármaco, já se questionou?
Onde fica a palavra? Onde fica esse potencial de entendimento?

Fale connosco,
O Canto da Psicologia

Dr.ª Joana Alves Ferreira

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Terapia do Palato

Sara'pateira!


Hoje sentou-se um palato de poucas falas e poucos amigos, fino no trato mas intenso na textura este palato deixou-nos na sala um cheiro a mar e coentros.
Falou-nos de férias de aqui e além mar e a nossa cabeça deixou-se viajar...poderíamos ter viajado na maionese mas...sem sair do divã viajamos com cheiro e sabor.

As marés foram e vieram e deixaram-nos uma travessa com uma sapateira meia descascada mas pronta a servir...
Começando...
                   A Sapateira cozida em água e sal, numa maré que pode durar 10 a 15 minutos, que depois de arrefecida se abre pela base e deixa o interior exposto. Retirando o que habitualmente não interessa fica-se com a melhor parte de um recheio em tons de laranja. Cozem-se 2 ovos que depois do ponto de picam para a mistura. 

Continuando...
                    A magia acontece com 1 colher de sopa de mostarda dijon, que pede outra de maionese e mais uma de pickles picados. O grosso do creme pede 3 colheres de sopa de cerveja, 1 colher de sopa de whisky, raspas de lima e pimenta em grão. 

Terminando...
                     Rouba-se uns pedacinhos tenros de sapateira e junta-se ao recheio que se envolve e devolve à carapaça com uns coentros leves picadinhos com manjericão. 

Resta escolher entre a tosta, o pão ou a broa e...hummmmmmmmmmmmmmmmm 
Boa sessão!

quarta-feira, 17 de julho de 2013




Diário de Uma Terapia 


10 de Julho de 2013

Quando terminou a última sessão e me dirigi às escadas, desta feita  para descê-las, saí com um estranho conforto aqui por dentro. O subir e descer escadas nas visitas à psicóloga têm sido acompanhados por muitas emoções, é um facto: a angústia de não saber o que dizer, a expectativa do que vou encontrar naquele dia, o medo de chegar atrasada e de falhar, ou o turbilhão em que tantas vezes saio porta fora, com tanto que pensar!
Mas, desta vez, em alguma coisa tudo isto foi diferente. O que é curioso, porque falou-se em medos. Ou resistências. (Bom, continuo a achar que são medos, sim, medos). E talvez fosse suposto sair, sei lá, assustada. Mas a verdade é que, mesmo falando dos medos e reconhecendo até que a psicóloga terá alguma razão quando me diz que tocar em alguns assuntos é difícil para mim, mesmo sendo tudo isso verdade, houve um conforto e uma serenidade que se instalou quando saí daquele espaço. Uma espécie de sossego que me é estranho, porque, bem vistas as coisas,  não me lembro da última vez que me senti assim... Assim... E falta-me a palavra! Assim, num lugar que é sobretudo agradável, que me fez conduzir até casa acompanhada pela Smooth FM, alheia ao trânsito, ao condutor que apita furioso, à ambulância que passa em alta velocidade. Eu, apenas eu, numa tranquilidade com que o meu rádio amigavelmente se sintonizou...


-          Bom dia, Madalena!


E, realmente, nada como uma sessão de psicoterapia para dar nome ao que se sente. É que a tal palavra que me faltava, aquela que encaixaria como uma luva neste estado de espírito entretanto descoberto e que não me surgia de maneira alguma é, para meu espanto, ACOMPANHADA.
-          “Parece que esse lugar de que fala, onde é possível viajar sozinha, é um lugar onde começa a sentir-se acompanhada, como aqui, neste espaço, onde é possível pensar as coisas difíceis sem ter que ficar absolutamente só com elas.”, disse-me a psicóloga!


E, de repente, recordo-me ainda durante a sessão, que foi assim que terminou a última, precisamente com qualquer coisa deste género a respeito de pensar as coisas difíceis... Que não estaria sozinha nessa tarefa e que poderia contar com aquele espaço! Agora sim, faz sentido! O que não deixa de ser espantoso, porque embora não tenha conseguido lembrar-me da palavra ou da expressão que a psicóloga me disse, foi mesmo assim que me senti, acompanhada. Acompanhada por uma nova forma de relação, que ainda é difícil de compreender como funciona, mas que parece que vai ganhando significado... Acompanhada como poucas vezes me senti, entre um pai ausente e austero e uma mãe que, por vezes, parecia alienar-se um pouco de tudo e de todos... 


sábado, 13 de julho de 2013

Terapia do Palato

Boca doce...coração quente


Este palato com uma clara problemática da linguagem verbal, gesticulava e contorcia-se no divã como quem se aninha em lençóis de seda numa noite fresca de verão. As mãos circulavam no rosto e sobre a boca deste palato como se tivesse provado o pecado e gostado a tal ponto que abdicaria de ser puro para o resto da vida.

Nas entrelinhas que os gestos permitiam conseguimos anotar uma receita num pecado que claramente era de gula e num óbvio desejo onde impera o princípio do prazer...simplesmente não resistimos.

  • 6 ovos                                                    
  • 250gr de margarina                                 
  • 125gr de açúcar                                      
  • 1/2 lt de leite gordo                                 
  • 500gr de farinha com fermento                 
  • 1 clh. chá de açucar baunilhado              
  • 1 clh. chá de canela                                 
  • raspas de laranja                                     
O açúcar calórico e enérgico fez química com a farinha, os ovos um a um vão unir as amigas anteriores com o  reforço e contenção da margarina. 
[Margarina - a eterna diplomática, media os conflitos e guarda dentro de si as angústias e frustrações que não lhe cabem]

O leite não  resiste e transforma em creme a massa, que chama pelo açúcar baunilhado, raspas de laranja e canela. 
Guarda-se no frigorífico até que a maquina de waffles esteja pronta para os receber!

Aviso: Se isto não o deixou de água na boca, então temos de sentar o seu palato no divã!!

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Diário de uma Terapia




03 de Julho

Hoje é a minha décima sessão! Apetece-me reflectir  e pergunto-me, tem valido a pena? Porque o faço, continuo sem saber muito bem! Mas, pelo menos, continua a parecer-me  relevante! 

Quando na primeira sessão a terapeuta me perguntou, qual era o meu pedido e o que eu esperava daquele espaço, sei que na altura lhe respondi, colocando demasiado ênfase na minha relação com a Maria, que queria sobretudo controlar o meu lado homicida que, quanto a mim, tinha surgido de forma inexplicável, para que não fosse confrontada com um descontrolo difícil de lidar, onde as consequências poderiam ser demasiado nefastas para o meu lado.
Curiosamente, ao fim deste tempo, pouco ou nada temos falado da Maria! Já percebi que este processo é lento, demasiado lento para os tempos que correm, onde tudo tem que ser feito à pressa e sempre para ontem. Também sei que um comprimido tem um efeito mais rápido, e está absolutamente adequado ao contexto actual em que tudo é enquadrado no princípio da “fast food”! Para mim, sempre ficou clara a ideia de que, dificilmente eu recorreria a tal, mas…

Temos tocado em temas que há muito estavam, aparentemente, arrumados! Sinto que ainda não consigo (será que alguma vez vou conseguir?) perceber a relevância de alguns, apesar de reconhecer ligações fortes com as minhas vivências actuais. Ainda na última sessão fiquei em silêncio pela ligação feita ao meu pai, no que toca a tudo o que tenha a ver com autoridade e austeridade na minha vida! Apesar de pertinente esta associação, ainda estou por aqui a remoer. Mas será que faz sentido ligar as coisas?  Será que isto me está a fazer sentido? Ou, não? Valerá a pena continuar? Mas o que é que a Maria tem efectivamente a ver com tudo isto?O que é que eu faço aqui, realmente? O que é que me incomoda de facto?


- Bom dia Madalena!


E devolvi tudo o que sentia à psicóloga! Pelo menos isso consegui! Não me inibi, como às vezes o faço quando tento fazer ouvir-me! Como eu escrevi há tempos neste meu diário, aqui sinto que me ouvem…

- Curioso, parece haver aqui uma resistência sua que a põe a questionar a relevância deste espaço para si, Madalena! Talvez porque, quem sabe, o que tem trazido e o que tem estado por aqui a pensar, seja de alguma forma incómodo e difícil de suportar. 

Pois… não sei… às vezes fica-me de facto difícil lidar com as tais “infindas verdades” que se vão revelando por aqui e dentro de mim. Verdades que não suspeitava, das quais já tinha feito por esquecer e que agora, parece pertinente relembrar!
E fica muito difícil! Mesmo muito difícil! E ainda ecoam em mim as palavras da psicóloga mesmo ao terminar a sessão: 

- É difícil de facto Madalena mas lembre-se, estou aqui consigo, não está sozinha neste percurso!

E resolvo voltar para a semana, apesar das dúvidas que tinha, efectivamente! Chamam-lhe resistências eu, prefiro chamar-lhe, medo!



domingo, 7 de julho de 2013

Terapia do Palato


Este palato que em tantos momentos se mostrou munido de uma enorme calma e serenidade...vinha agora de pelo na venta, verborreico e ansioso. Sem espaço para grandes analises o que desejou mais do que tudo foi dominar o divã e simplesmente falar...falar...falar...e entre petiscos e travessuras ele prendeu-nos com...um fofos de cenoura.


Quando 2 cenouras raladas, 2 alhos, 1 molhinho de rúcula e 2 ovos se juntam...batem-se e debatem-se numa tigela e...puff - formam um creme homogéneo. Depois vem a D. farinha q.b., toda cheia de sabedoria para encorpar mexericando até formar uma massa consistente, que pedia uma pitada de sal para finalizar.
É hora de dividir em pequenas bolinhas que vão a fritar em azeite até ficarem coradinhas. Serve-se com coloridas gotas de limão para abrir o apetite.

Conforme se sentou parecia agora levantar-se e sair com o ar lambuzado...deixando o gosto de quem se deseja voltar a ouvir-

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Diário de uma Terapia





Diário de uma Terapia

26 de Junho

Tenho constatado em mim um certo efeito de perplexidade no que vou descobrindo. Confesso que quando parti para este processo, dito terapêutico, não sabia o que poderia esperar, nem tão pouco o que iria encontrar por detrás daquela morada. Segui até lá, desafiei-me. Consegui dar-me esse tempo, afinal, merecido e reiterado por longos anos. Mas o que tenho vindo a compreender é qualquer coisa que jamais imaginei e que não sei se serei capaz de colocar em palavras. (A esta altura, pergunto-me se é assim para as outras pessoas que, como eu, embarcam nesta viagem?).

Bom, primeiro porque parecem infindas as verdades que se vão revelando aqui, dentro de mim. Verdades que não suspeitava ou das quais já me tinha esquecido!
Depois, este novelo que se desenlaça e onde um pensamento podem ser centenas de tantos outros, sem botão de STOP, como se tivessem vida própria... E na verdade até têm!
E por fim, a certeza de que há tanto por desvendar, por compreender, que acabo por estranhar esta minha morada, com paragem obrigatória num “Eu, Madalena” que me parece inacreditavelmente desconhecido.

É no meio deste desconcerto que me sinto estacionada hoje e nos últimos dias, entre a perplexidade do que é novo, do que é desvendado, e uma tristeza que me assola por tudo isto me ser precisamente demasiado novo, apesar de habitar por aqui há tantos anos...

A última sessão marcou-me neste sentido de que escrevo. Talvez como em nenhuma outra as palavras da terapeuta tenham ecoado em mim como sinos a entoar por uma aldeia inteira, sem deixar ninguém indiferente. Compreender que muito do que incomoda no fervilhar do meu marido com os miúdos é rever-me no papel de miúda a fervilhar por dentro (apenas por dentro e apenas de medo) de um pai que, a uma só voz, era capaz de silenciar uma casa inteira e, arrisco-me a dizer, um jardim de infância cheio de miúdos a bradar aos sete ventos!


-          Bom dia, Madalena!


E, 45 minutos depois, saio convicta  de que a minha dificuldade em ouvir o tom zangado do meu marido ou a voz esganiçada da minha colega, é a mesma com que me encolho perante o ar altivo que o meu patrão coloca quando algo corre mal, quando um pedido ou observação que é feito “com a máxima urgência” vem carregado de austeridade e até quando o caixa de supermercado me torce o nariz porque estou a demorar a encontrar o cartão de crédito, como aconteceu ainda esta semana! 

E perante a pergunta “como é que se sente nessas alturas, Madalena?”, eu respondo “a fervilhar, mas só por dentro!”.
E fico boquiaberta, sem resposta, quando oiço “bom, parece que enfrentar esse pai austero é verdadeiramente difícil para si”... E novamente o silêncio.