quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

Pronto a pensar...





Vivemos, cada vez mais, numa sociedade marcada por transformações profundas ao nível do avanço das novas tecnologias veiculada a uma rápida acessibilidade de informação. Inevitavelmente, ficamos perante um modo de viver e pensar substancialmente diferente daquele que se vivia há uns anos atrás. Historicamente todos estes movimentos têm-nos conduzido por um lado, à individualidade (ou singularidade) como também nos têm conduzido a uma procura incessante e diria “exagerada” de uma rápida resolução de problemas. Arriscaria até a dizer que vivemos numa sociedade ansiosa, insegura, que procura uma satisfação imediata das suas necessidades, e igualmente a resolução  rápida dos seus problemas (não esquecendo o facto de que também o poder económico diminuiu logo,certamente, também terá influência na procura de soluções imediatas a baixo custo!). Acabamos por nos deparar com um certo paradoxo pois, se por um lado a individualidade nos traria, inconsciente ou sub- conscientemente, a capacidade de pensar por si mesmo, uma certa consciência de si próprio, uma certa capacidade de olharmos para nós (e inevitavelmente para os outros) e de nos relacionarmos (connosco e com os outros), surgem-nos cada vez mais  pessoas inseguras, ansiosas, somáticas, deprimidas, e com uma certa dificuldade de integração da responsabilidade individual inerente a esta liberdade de sermos “individuais”.

Na prática clínica deparamo-nos com um número crescente de pedidos, pedidos estes em que se associam sintomatologias acentuadas, em que vemos corpos “gritantes” e mentes com pouca capacidade de pensar e digerir. Cada vez mais, deste lado, recebemos pessoas com quadros sintomatológicos intensos, com fragilidades profundas, com necessidades de reparação e integração do “EU”, arriscaria a dizer “urgentes” para aumentar o bem estar mental e, muitas vezes, físico (necessidades estas que os medicamentos não alcançam...). No entanto e paralelamente deparamo-nos com uma controvérsia profunda, pois cada vez mais as pessoas que procuram ajuda, procuram também soluções rápidas, “talvez meio mágicas?”. São crescentes as perguntas como “O que é que eu posso fazer para resolver este problema?, ”, “Quantas vezes preciso de vir cá para isto ficar resolvido?”, “Hoje até fiz uma lista e preparei a sessão para ver se avançamos mais rápido”.

Quando falamos ou pensamos em psicoterapia poderíamos brincar e dizer que é um antónimo de rápido... falamos ou pensamos num processo de co-construção, de estar e pensar sobre si, de olhar para dentro, de gerir e confrontar defesas, angústias, por vezes traumas, memórias, sofrimento, mas também alegrias, esperanças, sonhos... um processo de re-encontro e de re-descoberta e descoberta do novo, do desconhecido, da possibilidade de mudar, reparar, transformar e integrar. Não falamos certamente, na maioria dos casos, de processos rápidos, mas poderemos afirmar que estamos perante processos com um potencial de mudança altamente significativo para o bem estar individual e relacional daqueles que nos procuram e que se permitem sentar, estar e pensar...

Não estamos perante o pronto a vestir ou pronto a comer ou pronto a resolver mas, o pronto a pensar!


Drª Inês Lamares



terça-feira, 11 de dezembro de 2018

Cair de joelhos...









Comecei há pouco tempo um trabalho de habilitação funcional ao nível da articulação do joelho com uma nova aluna. Num dos treinos, ela questionou-me se “podia ultrapassar o joelho face à ponta do pé no agachamento”. Esta questão, veio no seguimento de um professor num ginásio, lhe ter dito que nunca devia ultrapassar tal amplitude, porque era muito perigoso!
Infelizmente este mito, a par de outros continua a ser apregoado pelos profissionais do exercício e do fitness.
A melhoria da mobilidade articular dita funcional, não passa por colocarmos os alunos em posições de extrema amplitude de forma estática. Deve passar em primeiro lugar, por desenvolver controlo motor a nível neuromuscular e só depois trabalhar em pequenas ou grandes amplitudes.
As articulações não funcionam de forma isolada. No caso de um joelho instável, o problema pode estar na articulação a montante ou a jusante, ou seja, no tornozelo ou na anca.
Padrões de movimento mal executados, articulações frágeis ou a queima de etapas nos processos de treino é que levam a suposições erradas sobre exercícios e movimentos.
Apesar de ser uma questão complexa, passar o joelho da ponta dos pés não é um problema para grande parte das pessoas. 
Lembre-se, não existem exercícios contraindicados, mas sim pessoas contraindicadas para eles! 
 A chave do processo, passa por saber a dosagem/quantidade certa a aplicar a cada aluno de forma única e individual. Procure um profissional de exercício especializado para o ajudar. 


Bons treinos!


Instagram: hugo_silva_coach
-Licenciatura Educação Física/Especialização Treino Personalizado
-Pós-Graduação em Marketing do Fitness 
-Pós-Graduando em Strength and Conditioning
-Director Técnico ginásio Lisboa Racket Centre





quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

O compasso psicoterapêutico...









Da terapia

Presente e pensante. Atenta.
O que as palavras dizem.
O que as palavras escondem.
O que as palavras revelam num instante.
Um instante que se ilumina por entre um
Emaranhado de uma correria de palavras.
O que as palavras escondem e o corpo denuncia.
O que as palavras fazem sentir.
O ressoar... O seu eco...
O encontro. Chegar perto. Ficar à distância...
Uma dança. Uma balada... Um rock desenfreado!
Inúmeras tonalidades, tomadas num mesmo sentido.

                             Filipa Rosário


Estar em relação não será em si mesmo algo poético? Estar numa relação psicoterapêutica não o será também?

O psicoterapeuta quando inicia um processo com qualquer pessoa que receba na sua sala dispõe-se a dar o que tem de si, o que tem em termos técnicos, das aprendizagens que fez ao longo da sua formação, o que tem em termos teóricos, do conhecimento que adquiriu e, desejavelmente, continua a adquirir, e o que tem de si, da sua pessoa, do que é. E não se chegaria a bom porto sem uma conjugação satisfatória destas três vertentes. Dispõe-se igualmente a receber o que o outro traz, que em vários momentos suscita algo no próprio e que impele à compreensão e processamento destes fenómenos. Trata-se de um trabalho ao mesmo tempo subtil e intenso, onde se faz uso do inteleto mas também do afeto, onde se está em relação.

E experienciam-se inúmeros movimentos no contexto desta relação. É como uma dança, na qual é preciso ir acertando os passos, que se move ao som e ritmo de diferentes humores, vivências, emoções, funcionamentos... Com um sentido muito claro, o de criar condições para que a pessoa encontre o que é a sua verdade e alcance o bem-estar.




Drª Filipa Rosário





quarta-feira, 28 de novembro de 2018

Diabetes e o exercício físico...







São números preocupantes os que o Ministério da Saúde lançou este mês. Em Portugal, os números da Diabetes têm vindo a aumentar todos os anos. Somos um dos países a nível europeu, onde há maior prevalência desta doença crónica. Os números apontam para uma prevalência entre os 10% a 13%, traduzindo estes valores para números, falamos de mais de 1 milhão de portugueses…sim, leu bem, mais de 1 milhão de portugueses têm esta doença!!!!
O sedentarismo e a inactividade física estão associados a um dos principais factores para o aparecimento da diabetes tipo 2, sendo o exercício um dos principais aliados e o “tratamento” para esta doença.
O exercício físico regular, nomeadamente o treino de força ou de cargas externas, é o pilar essencial para reverter estes números. Neste caso particular, o treino de força ajuda a:
- melhorar a resistência à insulina;
- controlo da glicémia;
- preservação da massa muscular;
- melhor consumo e captação de O2 por parte dos órgãos afectados.

Se conhece alguém que tenha diabetes, não hesite em encaminhá-lo para um profissional de Exercício.
Bons treinos



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quinta-feira, 22 de novembro de 2018

AMOR: Login ou Logout?







Não é que morra de amor, morro de ti.
Morro de ti, amor, amor de ti,
da urgência da minha pele de ti,
da minha alma de ti e da minha boca
e do insuportável que sou sem ti.”
                                       Jaime Sabines




É seguro dizer que o Amor é o tema mais misterioso, controverso e debatido por todos... poetas, músicos, dramaturgos, escritores, médicos, cientistas, filósofos, religiosos, sociólogos e claro, psicólogos, dedicam-se há muito a reflectir e a investigar sobre o fenómeno do Amor. 

A Psicologia estuda este tema, com particular foco na experiência sentida na infância, por saber que esse modelo define o padrão de relacionamentos em adulto. A dinâmica de relacionamentos com os outros é vivenciada e estabelecida desde o nascimento, onde o processo de vínculo inicia uma organização que se constrói a partir da interacção entre os cuidadores e as crianças. Esta será a base enquanto substrato emocional, cognitivo e comportamental para todas as experiências emocionais futuras. 

Sabemos hoje que, faz parte da nossa sobrevivência, manter ligações estreitas e saudáveis com os outros. Então, porque é o amor tão assustador? 

De acordo com o nosso funcionamento psicológico e com as experiências sentidas, todos nós utilizamos alguns mecanismos que emocionalmente permitem evitar e ultrapassar situações traumáticas. Deste modo, criámos uma forma especial de lidar com a possível rejeição de quem amamos que se pode traduzir de várias formas. Muitas vezes parecem incompreensivas e até antagónicas do amor percepcionado, são reacções que surgem pela incapacidade de tolerar a possível perda do amor do outro. A rejeição, a hostilidade, o distanciamento e a desconfiança são alguns dos mecanismos utilizados como resposta defensiva ao conflito desencadeado pelo sofrimento. Aparecem como nuvens escuras, primeiro no horizonte, invadindo um lindo dia de sol, que se vai instalando até permanecer como algo inseguro, ambivalente e duradouro.

Actualmente e, apesar de estarmos mais informados do que alguma vez estivemos, percebemos que os relacionamentos se estabelecem numa dinâmica de Login e Logout cada vez mais frequente. A era digital, das atitudes instantâneas, imediatistas e fugazes que permeiam novos estilos de relacionamento, fazem pensar sobre a fragilidade das ligações íntimas e da sua pouca saúde. Há menos tolerância e, se por acaso, alguém ousa não estar de acordo, basta eliminar ou bloquear para deixar de existir; o mundo virtual tornou-se então um lugar confortável para se viver?

Se pensarmos que o funcionamento psicológico está preparado para instalar mecanismos que nos defendem do sofrimento, não é difícil imaginar que a era digital tende a exponenciar este tipo de resposta causando a existência de ligações afectivas muito mais vulneráveis e frágeis. Curiosamente, e em sentido contrário conhecemos cada vez mais pessoas que optam por ficar sozinhas...

Pode ser mais difícil confiar no amor do outro do que nas experiências traumáticas, mas acreditar que é possível despertar no outro um amor saudável , sólido e autêntico é aceitar que somos seres amáveis.

Dra. Fanisse Craveirinha






quinta-feira, 15 de novembro de 2018

À porta fechada...







Mas diga-me Doutora, o que é que posso fazer? Eu quero ajudá-lo mas não sei o que é que devo dizer, o que é que devo perguntar, fico assim sem saber qual é o meu lugar.


A regra é de ouro: o trabalho desenvolvido no espaço terapêutico é confidencial. Não nos iremos alongar nas diferenças entre um processo com adultos, com adolescentes ou com crianças, uma vez que se levantarão naturalmente questões um pouco diferentes. Pretendemos antes frisar o quão importante esta regra é na criação de uma aliança terapêutica, com vista a um trabalho conjunto que se pretende transformador. Com os adultos, esta questão da confidencialidade é comummente apresentada e discutida no início do processo, para que não restem dúvidas em relação ao que isto implica e às suas limitações. Tal significa, portanto, que assim como sucede com todas as regras, existem exceções que a confirmam.

Surgem por vezes situações em que o terapeuta poderá ter de trazer, de forma muito cuidada, o envolvimento real e não apenas simbólico de um terceiro elemento no processo em desenvolvimento. Tal como refere a Ordem dos Psicólogos Portugueses, ­­­«a não manutenção da confidencialidade pode justificar-se sempre que se considere existir uma situação de perigo para o cliente ou para terceiros que possa ameaçar de uma forma grave a sua integridade física ou psíquica (…)». Quererá isto dizer que de repente se deixa de aplicar qualquer direito à privacidade e que qualquer pessoa poderá passar a saber aquilo que até então era apenas do par terapêutico (terapeuta e paciente)? Mais uma vez, a Ordem esclarece: «a informação confidencial é transmitida apenas a quem se considerar de direito e imprescindível para uma intervenção adequada e atempada face à situação em causa (…)». Então, o que significa tudo isto? Que não é de ânimo leve nem de forma impulsiva que tal regra é quebrada. Que tal só acontece se for absolutamente necessário, após avaliação cuidada, e com o conhecimento prévio do paciente, para que este entenda este gesto como um cuidado essencial no decorrer do trabalho psicoterapêutico conjunto.

A frase citada no início deste texto foi proferida por um familiar de M., paciente em acompanhamento que se encontrava a passar por uma fase particularmente difícil. O seu familiar foi contactado após decisão do par terapêutico, tendo-se decidido incluir esta pessoa no processo para que pudesse dar o seu apoio ao M. caso tal fosse necessário. A sua exclamação traduz a preocupação de quem de repente percebe que não sabe como há de agir com alguém que se ama e que se sabe que está a sofrer. Alguém que fica inquieto com o seu familiar e que deseja ajudar, mas sem saber ao certo como. Alguém que pede conselhos específicos sobre o que deve dizer, como se deve comportar… Quando na realidade, não há uma resposta única que sirva a todas as situações.

O que significa apoiar alguém que está a passar por um sofrimento tão imenso, sabendo que não se consegue magicamente aliviá-lo da sua dor? O que se pode fazer? De uma forma geral, sugeriríamos que, talvez acima de tudo, esteja o escutar. Não apenas ouvir, como se de barulho de fundo se tratasse. Falamos de um verdadeiro escutar, em que todos os sentidos se afinam numa só direção, em que se permite que as palavras arrepiem a pele e sejam sentidas de forma quase táctil. Será que isso não é o que de mais valioso se pode oferecer a quem se ama? Nem sempre é necessário dizer «vai ficar tudo bem» quando não se sabe se isso é verdade: talvez mais importante seja dizer «estou aqui para ti, seja para o que for». Por vezes não é fácil ajudar alguém que esteja a passar por uma fase difícil, e seria maravilhoso se um simples abraço resolvesse dores antigas, mágoas profundas e lágrimas que teimam em correr. Pode não resolver, mas apostaríamos que esse abraço tem o potencial de se infiltrar para além da pele e tocar no centro de quem se é, aliviando o peso que se carrega. É que quando alguém pede ajuda, muito frequentemente não é num sentido literal e instrumental: é apenas um movimento humano, de quem se quer ver reconhecido, aceite, amado.

Drª Carolina Franco




terça-feira, 13 de novembro de 2018

O exercício físico na terceira idade...








Voltou a ser notícia por estes dias, que os Portugueses vivem cada vez mais tempo. A esperança média de vida está ao nível dos países ditos mais desenvolvidos, mas que a qualidade de vida nos últimos 15/20 anos está diminuída. Daqui podemos concluir que, apesar dos avanços da medicina nos permitir viver mais anos, a grande maioria de nós não atua na prevenção, isto é, ter hábitos de vida saudável.
Sabemos que o exercício físico é muitas vezes decisivo para reverter ou atrasar uma série de processos relativos à velhice. A evidência científica comprova que ser fisicamente ativo tem um impacto superior na saúde do que a toma de qualquer medicamento. A idade não é nem deve ser um impedimento para começar a treinar. É aqui que o treino de força pode ter maior impacto…porque a força é uma das capacidades que mais perdemos ao longo da vida.
O treino de força pode ser iniciado em qualquer fase da vida, sendo na 3ª idade uma grande ajuda para prevenir:

- Diabetes;
- Hipertensão;
- Osteoporose;
- Sarcopénia;
- Excesso de Peso;
- Cancro;
- Disfunção Cognitiva;
- Etc;

O exercício físico na 3ª idade deve ser o principal “medicamento” a tomar.

Bons treinos


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quinta-feira, 8 de novembro de 2018

Lutos relacionais e outros...






O ser humano apresenta a particularidade de sofrer com processos de luto: mudanças consistentes a nível relacional, as quais podem ser vividas de forma mais ou menos dolorosa, dado o sentimento de perda associado a essas experiências.
É importante clarificar que o luto não é um processo de esquecimento ou um qualquer fenómeno de amnésia parcial ou total de uma relação vivida; antes pelo contrário, um processo de luto bem desenvolvido requer a consciência clara do que foi vivido e da forma como essa relação se transformou, e continua a transformar-se, no mundo interno de cada pessoa.
Saliente-se que mesmo nos casos mais dolorosos de processo de luto, quer seja por uma ruptura relacionalsignificativa, associada a uma escolha de um ou ambos os participantes dessa relação, ou mesmo por motivo de falecimento de alguém especialmente relevante para a pessoa enlutada, a relação, em si, não será eliminada, mas sim sujeita à transformação que a nova dinâmica relacional solicita: a relação externa, presencial, já não estará a ser vivida, pelo menos da mesma forma, mas continuará a desenvolver-se no mundo interno, não só face ao que se sente e pensa sobre as memórias vividas, mas também sobre o que se vai vivendo já sem essa relação presencial.
Por conseguinte, todas as relações estão sujeitas a um processo de luto: de experiências externas, temporalmente limitadas, para realidades internas em desenvolvimento ao longo de todo o percurso de vida de cada pessoa.
A ausência de alguém que se ama pode doer muito até que se reconheça, suficientemente, que essa relação continua a viver num espaço-tempo totalmente seguro e acessível, dado que é pessoal e intransmissível: o mundo interno de cada um. Naturalmente, tal reconhecimento interior será facilitado quando aquilo que foi vivido na relação presencial, for sentido como uma boa experiência humana e que não tenha ficado, assim, muito aquém do desejo investido nessa relação. Por outro lado, as experiências relacionais que foram vividas com um sofrimento intenso e sem que se tenha acedido a uma compreensão suficiente que contenha essa dor psíquica, serão naturalmente mais difíceis de aceitar e integrar no mundo interno de cada pessoa.

Particularmente, no contexto psicoterapêutico, surgem, com muita frequência, pedidos de ajuda face a sentimentos de perda relacional, especialmente dolorosos, em que se experiencia a dificuldade de aceder, de uma forma minimamente harmoniosa, a conteúdos mentais e emocionais vividos e/ou sonhados no decurso dessas relações humanas. A relação terapêutica terá, assim, o propósito de contribuir para essa harmonização interior do paciente, mediante a sensibilidade e empatia necessárias oferecidas pelo psicoterapeuta Deste modo, a psicoterapia proporcionará as condições básicas a uma reflexão, cuidada e atenta, que possibilite um reencontro, mais consciente e sereno, do paciente com partes do seu mundo interno previamente sentidas como perdidas ou dolorosamente acedidas. Nessa (re)descoberta, aceitação e compreensão das suas dinâmicas relacionais internas, o paciente encontrará, progressivamente, mais recursos próprios para desejar e viver outras experiências na realidade quotidiana das suas relações presenciais.


Dr. Nuno Almeida e Sousa




quinta-feira, 1 de novembro de 2018

Solidão e Saúde...






“O essencial é invisível aos olhos.”

Antoine de Saint-Exupéry

 

A dificuldade em relacionar-nos é das principais causas de sofrimento humano. Nunca estivemos rodeados de tanta gente como hoje mas nunca nos sentimos tão sós quanto agora. Vivemos à distância de um click, mas nunca estivemos tão longe do toque físico e da presença afetiva do outro. Estima-se que tocamos mais no nosso telemóvel que noutro ser humano.
De acordo com um estudo da American Psychological Association, o isolamento social é tão prejudicial para a saúde como o hábito de fumar 15 cigarros. De acordo com este estudo, a solidão é nefasta para a nossa saúde uma vez que tem elevada relação com o risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares.
O sentimento de solidão faz com que o ser humano esteja em estado de alerta contínuo, na medida em que tem de defender-se sozinho constantemente, o que faz com que exista um aumento da pressão sanguínea, devido à libertação no organismo de elevadas concentrações de cortisol, hormona associada na resposta ao stress. Um aprofundamento do tema fez concluir que os níveis elevados de cortisol e posterior aumento da pressão sanguínea associados a sentimentos de solidão, aumentam o risco de ocorrência de acidentes vasculares cerebrais (AVCs), igual fator de risco para o desenvolvimento de quadros clínicos de demência.
De facto, o Homem não nasceu para viver sozinho pois não existe desenvolvimento humano sem vínculos. O sentimento de solidão é pois um sinal alerta para a procura de companhia, assim como a fome e a sede são alertas para necessidades orgânicas que têm de ser satisfeitas.
A estruturação do desejo humano consegue-se através da estruturação dos laços afetivos com um outro. Somos sujeitos da falta e o comprometimento afiliativo, a necessidade de nos afiliarmos a alguém, denota um sentimento de fazer parte de (uma relação dual ou plural), de onde provem o nutriente emocional tão imprescindível ao nosso desenvolvimento: o afeto, o amor. 
A ausência deste nutriente emocional manifesta-se em sentimentos de abandono, sentimentos de rejeição, depressão, insegurança, ansiedade, falta de esperança, inutilidade, insignificância e ressentimento.
 Apesar de tudo, esta necessidade afiliativa, que se transforma num pedido ao outro, é inesgotável e, por isso, impossível de ser totalmente satisfeita. Como sujeitos da falta nunca estaremos totalmente satisfeitos. O desejo sempre insatisfeito, o “vazio constitutivo” irá pois mover-nos na e para a vida.
A solidão pode ocorrer em diversas momentos do nosso desenvolvimento e em várias situações nas quais não nos sentimos inseridos e ocorre com mais frequência em grandes centros urbanos podendo, não obstante de ser sintoma de um problema social, ser também sintoma de ordem psicológica (associado a questões de personalidade) que poderá necessitar de intervenção.
Num processo psicoterapêutico, através da relação terapêutica com o psicólogo, é oferecida ao sujeito a possibilidade de ter um espaço e um tempo onde poderá fortalecer-se e desenvolver as suas capacidades internas ao tornar (mais) conscientes alguns aspetos do seu funcionamento. Nessa continuidade transformativa, potencia-se igualmente um fortalecimento e um “amadurecimento emocional” que possibilite uma significativa melhoria nas relações sociais, diminuindo assim, a sensação da solidão (Abaliac, R., 2017).


André Viegas,
Canto da Psicologia



terça-feira, 23 de outubro de 2018

Medicamente para o sedentarismo...






Hoje em dia não é novidade que o exercício físico regular é fundamental para aumentar a longevidade, qualidade de vida e a melhoria do envelhecimento no ser humano.
Surge esta semana, um estudo realizado nos Estados Unidos, onde foram analisados dados de mais de 120 mil pessoas durante 24 anos e em que essas pessoas eram sujeitas a testes físicos. Os resultados foram surpreendentes, o risco de morte numa pessoa sedentária é 500% mais elevado, em comparação com outra pessoa que seja bastante ativa fisicamente.
Mais surpreendente ainda, é o facto de o risco de morte ter um pior prognóstico em pessoas sedentárias do que em pessoas fumadoras, hipertensas, diabéticas ou com problemas cardíacos. O estudo aponta também, que não existe um nível de exercício que exponha as pessoas a um risco de saúde aumentado.
Os investigadores afirmam que, as pessoas desde que bem orientadas por um profissional médico e de exercício físico podem e devem treinar de forma intensa.
Desta forma, podemos concluir que o melhor “medicamento” para o sedentarismo se chama EXERCÍCIO.

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quinta-feira, 18 de outubro de 2018

A saúde mental começa em bebé...






 Cada vez mais há registro de adultos que sofrem de doença mental, segundo dados recentes Portugal é o país da Europa com mais prevalência de doenças mentais na população com uma percentagem de 22,9% (dados do relatório de Saúde Mental 2018). Podemos identificar múltiplos motivos para estes resultados, desemprego, baixos salários, falta de condições e oportunidades, embora verdadeiros, existe uma razão que é fundamental (muitas vezes subestimada) que está relacionada com os primeiros anos de vida que são fulcrais na construção de identidade base do individuo. A forma como o adulto gere a sua ansiedade/depressão está estreitamente relacionado com a qualidade das relações precoces e do ambiente familiar mais ou menos disfuncional.
Estamos numa sociedade que ignora completamente a primeira infância, apesar das inúmeras e exaustivas investigações científicas que sublinham a importância, desta fase de desenvolvimento, para saúde quer física quer mental do futuro adulto. Sabemos que nos países ditos “mais desenvolvidos” no Norte da Europa os pais podem ter direito a 3 anos de baixa, de forma a poderem dar a atenção necessária e a qualidade relacional ao seu bebé. Contudo em Portugal a realidade é bem diferente pelo que as consequências têm vindo a notar-se, cada vez mais se medicam as crianças e se diagnosticam com atraso de desenvolvimento, hiperatividade e deficit de atenção.


À medida que a sociedade avança mais parece que se desumaniza, os bebés não têm direito a ficar bebés, as crianças têm de crescer rapidamente e, depois, transformam-se em adultos incompletos, com falhas no desenvolvimento psicoafectivo, de difícil acompanhamento psicoterapêutico. A prevenção é, assim, totalmente ignorada e consequentemente multiplicam-se as problemáticas na saúde mental. Segundo dados da OMS estima-se que em 2030 a Depressão seja a doença com mais incidência no mundo, esta doença mental tem vindo a aumentar.
Neste sentido porquê falar do desenvolvimento infantil? A infância é como a coluna vertebral da identidade do sujeito, a base da pirâmide psíquica. A qualidade das interações precoces com o bebé vão promover um sentido de pertença e de segurança, na criança, que irá se repercutir até a fase adulta.
 Mitos sobre o desenvolvimento dos bebés: “O bebé ou a criança não percebem nada do que se diz ou se faz... Apenas querem cuidados básicos desprovidos de afetos... O ambiente familiar não influencia os bebés, pois ainda não têm consciência” Estão completamente incorretos, os bebés são autênticas esponjas emocionais, detetam e sentem, na pele, todos os ambientes afetivos exteriores. Se a família for muito disfuncional e ansiosa, se os pais promoverem ambientes conflituosos, então os bebés irão sofrer tal como os pais.
Estudos revelam que o recém-nascido apresenta elevados graus de cortisol que consiste numa hormona responsável pelos níveis de reatividade ao stress ou ansiedade. Contudo, esta reatividade ao stress tende a diminuir ao longo do primeiro ano de vida, à medida que a relação precoce entre cuidador e bebé se regula, sendo que depende da contingência e sensibilidade das figuras parentais. Verificou-se correlação entre a falta de sensibilidade do cuidador aos sinais do bebé e a continuidade ou até mesmo um aumento dos níveis de cortisol ao longo da infância. Esta situação pode prolongar-se para a fase adulta (e sucessivas gerações) através da criação de padrões fixos de resposta ao stress que envolvem o funcionamento restrito e rígido de neuro transmissores e de glucocorticoides.
 Um clima emocional precoce de stress, repleto de emoções negativas, leva o bebé a não conseguir atingir um estado de equilíbrio homeostático (biológico e emocional), estando permanentemente receoso por não encontrar, na relação, alguma significação que permita acalmar este estado. A regulação hormonal do medo depende, essencialmente, da capacidade que os pais (ou outras figuras centrais) têm para estabelecer comunicações empáticas, de partilha de estados mentais e afetivos e, assim, conterem a ansiedade do bebé.
 As investigações verificaram que este tipo de relação empática leva as crianças a desenvolverem instrumentos de auto-regulação emocional, bem como, está associado a uma maior capacidade de aprendizagem e concentração.
O bebé exige muito dos pais, da sua atenção, precisa de se certificar que é amado e respeitado. Se assim for vai crescer com amor-próprio e confiante das suas capacidades. Todos os comportamentos, ações, e atribuições de carácter dos pais aos filhos vão ter consequências na construção de identidade dos bebés e posteriormente no futuro adulto. O bebé vai querer sempre se adequar às expectativas dos pais quer sejam positivas (conscientes) quer sejam negativas (inconscientes).
 Deste modo a melhor forma de diminuir a doença mental é prevenir a sua incidência através de ações de sensibilização e de informação correta sobre como promover um ambiente relacional e afetivo positivo, para que as nossas crianças possam crescer em paz e adquirir a aprendizagem da regulação da ansiedade. Afinal este é o melhor presente que os pais podem dar aos seus filhos, a inteligência emocional que promove a saúde mental e dá alento e entusiasmo pela vida.



Mafalda Leite Borges
Canto da Psicologia

quinta-feira, 11 de outubro de 2018

Aqui Jaz uma infância perdida!





“João A…, ao Gabinete 1”
“ Matilde L…, à Sala de tratamentos”

E assim sucessivamente se ouviam os “plins” de uma campanha que servia de banda sonora aquela manhã.
Naquela sala de espera da urgência de pediatria (do que poderia ser um qualquer Hospital Nacional), os brinquedos arrumados nas duas caixas ao lado da mesa, estavam claramente doentes. Coloridos, texturados e exuberantes, apelando provocadoramente ao “olha para mim” vestiam negro no olhar e cinzento nos sorrisos. Levianamente muitos diriam: é uma virose! Antes fosse… que entre mezinhas, pomadas, descanso e recato haveria de passar.
O diagnóstico parecia claro embora encontrasse o seu contraste nas cores da roupa da boneca de pano e na musica do orgão de animais, não poderia haver dúvidas de que aqueles brinquedos padeciam de um mal gravíssimo. O robot espacial, o carrinho do Noddy, o telefone cor-de-rosa, a boneca de pano, o orgão dos animais e sua restante comitiva transportavam um ar pesado, um olhar baço e uma inércia que tão pouco as pilhas alcalinas( já quase a “babar”) tinham potência para combater. Os brinquedos estavam de luto! Curvados, tortos e amassados se carregassem ás costas a sua perda, haveria a algures de se ler: Aqui Jaz uma infância perdida!
A vivacidade de outrora estava perdida, o sentido no balanço do significante e significado, perdera o norte e o seu papel há muito parecia enterrado nas memórias longínquas, de um tempo que parecia já não se voltar a repetir. No meio de todo o barulho e frenesim daquela sala, batiam corações mudos em sintonia entre os quatro lados de cada caixa e ao aproximar-me na incredulidade de tamanha exasperação, juro quase ter ouvido um choro uníssono abafado que só os objectos outrora amados e agora abandonados conhecem.
Os brinquedos estavam de luto, pelas enumeras crianças que perderam, pelas imensas mãos que já não lhes tocavam, pelos apertos que já não levavam e pelos sorrisos inocentes de novos descobridores que não vislumbravam.
Os brinquedos estavam de luto e sucumbiam a uma dor, por vezes enganada pelos passos desleixados em modo de corrida que se dirigiam sobre a caixa, que depois e sobre o olhar projectado e desvitalizador se desiludiam por nada mais terem para oferecer que não eles próprios. Os brinquedos estavam de luto pela perda do amor do objecto. Esse amor talhado na forma de olhar o outro, medido nos gestos de afecto e amparo, que cria laços tão fortes como cimento que edifica cada estrutura interna como única…esse amor faltava-lhes agora. Restava fantasiar sobre as linhas finas de uma constituição subjectiva do que até então se tinha internalizado mais profundamente que um ou outro parafuso, uma pelúcia, um botão, peça de plástico ou até mesmo uma bateria.

Imaginei a boneca de pano em sessão, mergulhada no divã com a caixa de lenços ao colo murmurando entre lágrimas os seus sentimentos de culpa que lhe atormentam os sonhos e o olhar sobre a realidade, os sentimentos de não merecimento e de insuficiência que a deixam letárgica e incapaz de pensar. Até mesmo o Robot enchendo o Setting com o seu vazio interno e a sua dificuldade em pensar as emoções, desviando o olhar sobre a janela e mantendo um silêncio tão ensurdecedor que não dava espaço para interpretar e conter. E o orgão de animais… metia dó mas já só tocava Ré, desarmonioso sem posição para estar saltitando de um lado para no sofá, levantando-se e gesticulando sem tom, num registo incontido e lábil, numa vulnerabilidade tão característica dos que perderam o seu lugar, papel e identificação.
Os brinquedos estavam de luto por todas as crianças que passaram, passam e permanecem naquela sala de espera. Choravam a perda dos palmos e meio que naquele mesmo momento enchiam o espaço, tornando-o cada vez mais vazio de quem o via através das caixas. Os brinquedos estavam de luto pelo João A. que de chucha na boca e lágrima ao canto do olho ficou ao colo do pai a ver o Babytv no tablet. Estavam de luto pela Matilde com 4 anos que sentada ao lado da mãe gargalhava entre a tosse e o fungar, ao ver a Dora - A Exploradora no youtube. Estavam de luto por eles e pelas restantes oito crianças que sem sair do lugar e sem nunca se debruçarem sobre as caixas, “brincavam” escondendo-se da espontaneidade, do faz-de-conta, da fantasia e da experimentação, atrás dos ecrãs das tecnologias.
Perguntei a medo à enfermeira - Isto é sempre assim? - não percebendo a inquietação inicial da pergunta acabou mais tarde por responder - Sim. No outro dia até pensei se não seria melhor retirar as caixas dali do fundo e… (enchi-me de esperança) deixar a extensão mais disponível para os carregadores de telemóvel e tablets (morri na praia). Mais grave que um infância que se perde é claramente uma adultez que a corrompe, esmaga e negligencia.

Aqui Jaz uma Infância que um dia soube brincar, fazer-de-conta, caiu e levantou-se, conheceu os limites do seu corpo, esfolou os joelhos, explorou, experimentou e foi…e soube ser CRIANÇA.


Drª Joana Cloetens
O Canto da Psicologia