quinta-feira, 14 de novembro de 2019

Álcool, um agente de regulação emocional...






A dependência do álcool, e os problemas relacionados com o consumo do mesmo, têm uma forte incidência na nossa cultura e constituem um grave problema de saúde pública; afeta não só o indivíduo, nas dimensões física, mental e emocional, mas também a sua família e a sociedade. É uma perturbação que se encontra implicada em problemas como a violência, acidentes rodoviários e a baixa produtividade ou a abstinência no trabalho.

Vários autores de uma linha psicanalítica (como Philip Flores e Ana Mónica Dias) se questionaram sobre este fenómeno no sentido de trabalharem sobre a sua compreensão e tratamento e afirmam que a instalação do alcoolismo acontece como um movimento de auto-cura ou auto-reparação, uma vez que o álcool produz fortes efeitos nos estados emocionais e afetivos e por isso atua muitas vezes como um agente de regulação emocional.

Constata-se de facto que o uso do álcool aparece muitas vezes associado ao alívio da dor emocional, em estados depressivos e/ou de ansiedade. Mesmo que só por momentos, este serve bem o objetivo de escapar a sentimentos de privação, vergonha ou inadequação. Observa-se que pessoas com dificuldade em estabelecer ligações reguladas emocionalmente no seio das suas relações intímas têm grande tendência a compensar tal dificuldade com o recurso ao álcool e drogas numa tentativa de se autorepararem.

Segundo diversos estudos, as pessoas dependentes de álcool revelam habitualmente elevada instabilidade emocional, têm tendência a experienciar afetos negativos tais como a tristeza, o medo, o embaraço, a raiva, a culpabilidade e a sentirem-se inseguros, incompetentes, nervosos e preocupados. Têm também dificuldade em controlar os impulsos e em lidar com situações de stress. Alguns destes aspetos também já exacerbados pelo própria dependência, trata-se de um tipo de “automedicação” com elevados efeitos secundários.

Denota-se que na grande maioria dos casos de alcoolismo existe uma falha nas relações significativas, nas suas funções essenciais de providenciar um ambiente empático, tranquilo e seguro, onde existe reconhecimento do próprio e do seu valor, em suma um ambiente que possibilita a construção saudável da auto-estima. Entende-se que os vínculos estabelecidos nas relações íntimas estejam caracterizados por insegurança, ansiedade e pouca confiança nos outros.

Estes dados, provenientes da observação clínica e de reflexões teóricas e empíricas, confirmam a necessidade do tratamento psicoterapêutico de pessoas dependentes de álcool, onde se constrói uma nova relação que possibilitará elaborar as falhas ocorridas e construir um novo modelo de relação e do próprio, e constituem como que um mapa para o tratamento onde estão devidamente sinalizados os diferentes aspetos que constituem (potenciais) fragilidades da pessoa e são portanto essenciais para o eficaz tratamento desta problemática.








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