A doença de Alzheimer, a forma mais conhecida de demência, é uma doença neurodegenerativa
caracterizada pela deterioração de diversas funções cognitivas, como a memória, raciocínio ou
comportamento. Sendo uma doença progressiva, os seus sintomas desenvolvem-se gradualmente
ao longo dos anos, piorando com o passar do tempo e interferindo de forma significativa nas tarefas
do quotidiano, acabando por conduzir a uma situação de dependência total e, finalmente, à morte –
segundo o ranking de 2016 da Direção-Geral da Saúde, a doença de Alzheimer representava a terceira
principal causa de morte prematura em Portugal.
Não existe ainda uma cura para esta doença, sendo que a esperança média de vida se situa nos oito
anos após a deteção dos primeiros sintomas (variando entre 3 a 20 anos, dependendo da idade e
condição de saúde). Ainda assim, apesar de o seu avanço ser irreversível, é possível recorrer a certas
formas de tratamento que permitem abrandar a sua progressão e melhorar significativamente a
qualidade de vida dos pacientes.
Uma das formas mais revolucionárias e impactantes de terapia
pode ser levada a cabo através da música.
Na doença de Alzheimer, bem como em diferentes tipos de demência, a memória musical permanece
surpreendentemente robusta e bem preservada. Num estudo recentemente publicado no jornal
Brain, um grupo de investigadores verificou que as regiões cerebrais responsáveis por codificar a
memória musical em pacientes de Alzheimer se encontravam num estado significativamente menos
avançado de degeneração, comparativamente às restantes áreas do cérebro. Apesar de a
investigação nesta área se encontrar ainda numa fase inicial, a capacidade da música para
desbloquear memórias e outras capacidades cognitivas em casos de Alzheimer tornou-se numa forte
arma da neurologia, bem como uma inquestionável fonte de conforto para muitas pessoas com esta
devastadora doença.
O poderoso efeito que a música tem em pacientes com demência pode ser explicado de duas formas.
Por um lado, devido ao seu conteúdo emocional, a música pode despertar algumas das memórias
mais poderosas que possuímos – as memórias emocionais – sendo que este tipo de memórias tem a
melhor hipótese de emergir em pacientes de Alzheimer. Para além disso, através da associação da
música às atividades do quotidiano, os pacientes poderão desenvolver a capacidade de evocar a
memória dessas mesmas atividades, melhorando as suas capacidades cognitivas. Por outro lado, ao
aprendermos música, armazenamos esse conhecimento como memória de processamento – o tipo
de memória associada a atividades rotineiras. Uma vez que a demência destrói em primeiro lugar as
partes do cérebro associadas com a memória episódica – correspondente a episódios específicos nas
nossas vidas –as partes associadas com a memória de processamento permanecem, em grande
parte, intactas.
A “Music&Memory” (em português, “Música e Memória”), é uma organização sem fins lucrativos criada
nos Estados Unidos que nasceu de uma simples ideia: fazer chegar a música aos lares e instituições
de saúde. Com o auxílio de iPods ou leitores de MP3, e em parceria com as famílias e funcionários
desses mesmos centros, são criadas listas de música personalizadas para cada indivíduo,
possibilitando aos pacientes de Alzheimer, demência e outro tipo de barreiras cognitivas e físicas
reconectarem-se com o mundo através das memórias despoletadas pela música.
Um estudo levado a cabo em 98 lares de idosos onde este programa foi aplicado, concluiu que a
aplicação de um programa de terapia musical personalizada ajudou diretamente na redução do uso
de medicação antipsicótica e ansiolítica, resultando igualmente em melhorias nos sintomas de
demência em pacientes de Alzheimer ou demências relacionadas.
Em 2012, um excerto de um documentário acerca do trabalho desta instituição (Alive Inside: A Story of
Music and Memory) tornava-se viral na Internet, atingindo milhões de visualizações por todo o mundo.
Contava o fantástico caso de Henry, um dos pacientes de um lar de idosos e do seu fantástico
“despertar” ao ouvir algumas das suas músicas favoritas.
Depois desta leitura, veja e oiça novamente o vídeo...
João Silva
- Mestre em Música pela Escola Superior de Música de Colónia;
-Trompetista e Professor de música e investigador no Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical da Universidade de Évora;
- A realizar o Doutoramento em Música e Musicologia na Universidade de Évora
- Mestre em Música pela Escola Superior de Música de Colónia;
-Trompetista e Professor de música e investigador no Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical da Universidade de Évora;
- A realizar o Doutoramento em Música e Musicologia na Universidade de Évora
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