São muitos os “nãos” que circulam por entre as
interações e relações que se estabelecem ao longo da vida. Hoje debruçamo-nos
sobre aqueles nãos que vão dos pais
para os filhos, aqueles que tantas vezes causam indignação e revolta nos mais
novos mas são tão necessários, tão organizadores. Nãos que podem ser comunicados verbalmente ou podem ser
transmitidos através de uma atitude ou decisão, de um limite que é
estabelecido, como uma afirmação de um pai ou de uma mãe...
Concordamos, obviamente, com a noção de
ineficácia, crueza e inadequação que caracteriza uma educação e as relações cimentadas
em nãos, daqueles nãos taxativos, rígidos, frios e
distantes; as crianças e adolescentes precisam que lhes sejam apresentadas alternativas, precisam que lhes seja explicado o porquê de determinado não e as consequências de não o aceitar; é importante que tudo faça sentido; uma relação sem nãos é desorganizadora.
Uma relação sem nãos pode ser descuidada, pode inverter
papéis, pode até chegar a ser negligente. Um não muitas vezes mostra que o adulto se importa, que a criança ou
adolescente não está sozinho e tem com quem contar. Mostra às vezes que tem que
se contentar, que tem que fazer uso dos seus próprios recursos e que é possível
ficar bem dessa forma, que fica bem mesmo que com o pai ou mãe um pouquinho
mais distantes. Como o caso de uma menina de 7 anos cuja mãe criou uma rotina
no momento de adormecer à noite muito agradável e securizante para esta mas com
a qual foi perdendo o controlo e foi estendendo até ao ponto de demorar mais de
2 horas, entre massagens, histórias e canções. Às vezes dar demais também pode constituir
um problema. Neste caso a mãe começou a ficar exausta, deixou de ser
comportável, porque não se foi capaz de dizer que não, de transmitir que há limites ao que ela pode dar e que ela, a
criança, também precisa aprender a aquietar-se sozinha. Esta é uma situação mais
complexa do aqui se descreve mas interessa hoje ver nesta perspetiva. Serve
para ilustrar que às vezes um não é
tão importante como o cuidado e o amor de uma mãe, é este que permite alcançar
um relativo equilíbrio.
Mesmo que disso não tenha consciência, um adolescente securiza-se com um não com o qual, aparentemente, se debate, contesta...
É como se se tratasse de duas partes de si que estão em disputa e o
pai ou a mãe viessem desempatar. Fica satisfeito (embora não o admitisse aos
pais, nem que lhe pagassem) porque sossega... Afinal de contas, o que é da
fantasia, pode continuar nesse mundo e pertencer apenas a ele e isso, pode ser
imensamente tranquilizante.
Um adolescente precisa de limites e estes são construídos e alicerçados igualmente pelos nãos que vai escutando ao longo do seu crescimento dando-lhe ferramentas para conseguir gerir, com confiança, os conflitos internos inerentes à etapa da adolescência permitindo-lhe assim, definir com alguma segurança "o que é meu, o que é do outro, onde pertenço..." Quando este processo falha encontramos um adolescente perdido, desorientado, desorganizado reflectindo-se este comportamento, na maior parte das vezes, em resultados escolares insatisfatórios, chumbos por faltas, ou em outros aspectos comportamentais nomeadamente, gasto excessivo de dinheiro, pequenos furtos caseiros, mentiras e outros... Existem, naturalmente, outras razões e circunstâncias de vida que o poderão levar a este estado, no entanto, a importância do papel dos nãos para, entre outros aspectos, aprender a frustrar e consequentemente ajudá-lo a crescer é absolutamente incontestável;
Há nãos que protegem, há nãos
repletos de amor, há nãos que
encorajam...
Drª Filipa Rosário
Sem comentários:
Enviar um comentário