quinta-feira, 8 de agosto de 2019

O Terapeuta vai de férias...




Durante os meses de verão, é comum que se tirem férias. Este é, aliás, um dos momentos mais ansiados por todos, com promessas de dias leves, sem as preocupações do quotidiano e sem a rotina tantas vezes incomoda. Mas e quando essas férias entram no processo psicoterapêutico? O que significarão as férias do terapeuta para quem se habitua a ter o seu momento, semana após semana, no mesmo horário, no mesmo sítio, com aquela constância tranquilizadora?

É frequente que quem está num processo desta natureza se questione se o seu terapeuta pensa em si fora do contexto da consulta, se se lembra da sua história, se se preocupa durante as suas ausências ou até faltas. Naturalmente que as férias, momento em que o terapeuta opta por se afastar, poderão despertar em algumas pessoas sentimentos de abandono, de se sentirem preteridos por momentos de lazer e passeios à beira-mar. A realidade é que estes momentos de afastamento, essenciais para qualquer pessoa independentemente da sua área profissional, não significam que o terapeuta se esqueça ou não se importe com quem acompanha – como julgamos ser óbvio, mas que mesmo assim fazemos questão que seja evidente! Durante as férias, a maioria dos terapeutas estarão até disponíveis para atender o telefone, caso aconteça algo em que seja essencial serem contactados. Na realidade, dado o carácter natural deste afastamento, este pode e deve ser pensado com carinho e respeito pelo par terapêutico, com as suas repercussões a terem de ser desconstruídas em contexto de consulta, fazendo com que um momento potencialmente perturbador da relação seja, afinal, uma oportunidade para melhor elaboração de questões de fundo.
Nos momentos que antecedem o início das férias, assim como nos que marcam o regresso à rotina, verificam-se por vezes alterações à constância da relação, ao tom emocional que caracteriza as sessões, à intensidade das questões levantadas, o que terá de ser necessariamente contextualizado. Uma falta num momento aparentemente incaracterístico poderá ter um determinado valor, ao passo que uma falta na última sessão antes das férias do terapeuta poderá ser pensada de forma mais específica: quão difícil é para mim ficar sem poder ver esta pessoa que normalmente está sempre disponível? Como me sentirei durante as próximas semanas, e o que poderei fazer se me sentir demasiado angustiado? Em que pontos mais sensíveis da minha história pessoal é que este acontecimento irá tocar? É importante que tudo isto seja pensado: se não se elaborar, então pode contaminar.
Inconscientemente, esta separação temporária poderá ter um impacto de tal forma no sentir de quem vê o seu terapeuta a afastar-se que, em última análise, poderá até levar a desistências do processo. Não sendo isto de todo desejável, há que pensar em conjunto o que isto significa, como afeta a estabilidade de cada um e, espera-se, alcançar novos entendimentos sobre o nosso mundo interno. Porque as relações são mesmo assim: uma sucessão de aproximações e afastamentos, em que as pessoas estão ligadas por fortes laços invisíveis, que não se veem com os olhos, mas que se sentem com o coração. Coração esse que, mesmo de férias, não deixa de transportar quem está cá dentro.





Sem comentários:

Enviar um comentário