quinta-feira, 26 de setembro de 2019

Mais vale estar bem acompanhado…






O conceituado psicoterapeuta Irvin D. Yalom – autor de diversos livros técnicos na área da psicoterapia, assim como de romances para o grande público, como é o caso do livro “Quando Nietzsche chorou” – defende que o isolamento existencial se refere a um abismo inultrapassável entre um “Eu” e um qualquer “Outro”, realçando, assim, que nenhuma relação pode eliminar o isolamento.

Todavia, como Yalom tem sustentado ao longo da sua carreira como psicoterapeuta, uma boa relação com os outros diminuirá a dor desse isolamento.

Alicerçado nesse contributo de Yalom, poder-se-á reflectir, então, sobre o que será uma boa relação humana, parecendo claro que uma dinâmica interactiva dessa qualidade expressará um fenómeno de criação, na medida em que no mínimo dois participantes se unem para criar mais um elemento: um “Nós” suficientemente cuidador das necessidades de todos os participantes, em que cada indivíduo poderá viver sentimentos de pertença, de segurança e de confiança básicos, os quais configuram uma experiência de ser realmente bem cuidado e, nessa medida, amado. Neste sentido, a ligação com os outros, mediante sonhos conjuntos e acções partilhadas para os concretizar, é o que permitirá o desenvolvimento consistente do bem-estar psicológico.

Provavelmente, o mais importante é que esses projectos partilhados sejam percebidos como co-construídos, ou seja, que cada pessoa sinta que tem um papel relevante e bem definido na relação, baseando-se na atenção amorosa que proporciona atitudes adequadas face às necessidades de todos os envolvidos, mas sabendo também que existirão inevitáveis falhas, divergências, frustrações e obstáculos a ultrapassar.

Por outro lado, se tais projectos relacionais não incluírem suficientemente as necessidades de cada indivíduo, os prejuízos serão, certamente, maiores do que os ganhos, porque mediante interesses próprios desligados dos outros, as pessoas ficam, obviamente, a sentirem-se sós e em desarmonia com a natureza de vida relacional interdependente. Nesta medida, parece ser inviável a ideia de bem-estar absolutamente solitário, sem um qualquer projecto de relação com alguém, nem que sejam somente boas relações interiores, as quais derivam de experiências relacionais passadas e concretamente vividas. De facto, uma boa capacidade de estar fisicamente sozinho, revela que a pessoa se sentirá bem acompanhada nas dinâmicas relacionais interiorizadas.

Remetendo para o título deste texto, no âmbito das boas relações – em que vale a pena estar acompanhado – situa-se a relação psicoterapêutica, mediante a qual um factor decisivo no processo de desenvolvimento do paciente será a certeza de que é amado nessa particular relação. Mas que amor será esse? A natureza desse amor será, claramente, distinta de outras vivências quotidianas, nomeadamente de relações conjugais, de namoro, familiares ou de amizade, na medida em que a particular postura amorosa do psicoterapeuta deverá ter como foco a função profissional de cuidado face ao desenvolvimento da pessoa que lhe pediu ajuda, designadamente pelo aumento da sua capacidade de amar a si própria e aos outros. Em relação ao papel específico do paciente, um factor importante para promover uma relação justa e equilibrada com o psicoterapeuta, será naturalmente o pagamento atempado dos seus honorários – algo indispensável para que não ocorram sentimentos de dívida – assim como um empenho mínimo face à dinâmica acordada da relação terapêutica, mediante os conteúdos revelados da sua vida nas sessões, para além de uma assiduidade e pontualidade suficientes às mesmas.

Existindo uma colaboração mútua suficiente entre psicoterapeuta e paciente, estão preenchidas, assim, as condições necessárias para que o paciente possa ser nutrido de um cuidado psicoterapêutico, reparador das falhas dolorosas de amor sentidas ao longo do seu percurso de vida e promotor da reflexão face ao que fará sentido ainda viver, enquanto escolhas existenciais do presente para o futuro.





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