A dependência do álcool, e os
problemas relacionados com o consumo do mesmo, têm uma forte incidência na nossa
cultura e constituem um grave problema de saúde pública; afeta não só o
indivíduo, nas dimensões física, mental e emocional, mas também a sua família e a sociedade. É uma perturbação que se encontra implicada em problemas como a
violência, acidentes rodoviários e a baixa produtividade ou a abstinência no
trabalho.
Vários autores de uma linha
psicanalítica (como Philip Flores e Ana Mónica Dias) se questionaram sobre este
fenómeno no sentido de trabalharem sobre a sua compreensão e tratamento e
afirmam que a instalação do alcoolismo acontece como um movimento de auto-cura
ou auto-reparação, uma vez que o álcool produz fortes efeitos nos estados
emocionais e afetivos e por isso atua muitas vezes como um agente de regulação
emocional.
Constata-se de facto que o uso do álcool aparece muitas vezes
associado ao alívio da dor emocional, em estados depressivos e/ou de ansiedade.
Mesmo que só por momentos, este serve bem o objetivo de escapar a sentimentos
de privação, vergonha ou inadequação. Observa-se que pessoas com dificuldade em
estabelecer ligações reguladas emocionalmente no seio das suas relações intímas
têm grande tendência a compensar tal dificuldade com o recurso ao álcool e
drogas numa tentativa de se autorepararem.
Segundo diversos estudos, as pessoas dependentes de álcool
revelam habitualmente elevada instabilidade emocional, têm tendência a
experienciar afetos negativos tais como a tristeza, o medo, o embaraço, a raiva, a culpabilidade e a sentirem-se inseguros, incompetentes, nervosos e preocupados. Têm também dificuldade em controlar os impulsos e em lidar com
situações de stress. Alguns destes aspetos também já exacerbados pelo própria
dependência, trata-se de um tipo de “automedicação” com elevados efeitos
secundários.
Denota-se que na grande maioria dos casos de alcoolismo
existe uma falha nas relações significativas, nas suas funções essenciais de
providenciar um ambiente empático, tranquilo e seguro, onde existe
reconhecimento do próprio e do seu valor, em suma um ambiente que possibilita a
construção saudável da auto-estima. Entende-se que os vínculos estabelecidos
nas relações íntimas estejam caracterizados por insegurança, ansiedade e pouca
confiança nos outros.
Estes dados, provenientes da observação clínica e de
reflexões teóricas e empíricas, confirmam a necessidade do tratamento
psicoterapêutico de pessoas dependentes de álcool, onde se constrói uma nova
relação que possibilitará elaborar as falhas ocorridas e construir um novo
modelo de relação e do próprio, e constituem como que um mapa para o tratamento
onde estão devidamente sinalizados os diferentes aspetos que constituem
(potenciais) fragilidades da pessoa e são portanto essenciais para o eficaz
tratamento desta problemática.
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