quinta-feira, 21 de novembro de 2019

"Casa de pais, escola de filhos...."







“Se calhar há coisas que passam um bocadinho dos meus limites”
M,16a

Numa oscilação entre o adulto que está por existir e a criança que já não existe, o retrato do adolescente parece poder recair no vazio. No caminho das transformações, a falta da paixão e ingenuidade da infância, abre espaço para o espelhar das inseguranças do que é ser-se adulto. Numa sociedade global e contemporânea em que cada vez mais se instalam momentos de fragilidade, em que vivemos da cultura do imediato, da chupeta da televisão, da cada vez maior inexistência de ideais partilhados, onde os gostos e opiniões passam a ser momentâneos, descartáveis e provisórios – como as stories do instagram-, onde se venera e gratifica o individualismo, em que se atenuam as imagens estruturais do trabalho, da família e dos laços humanos, não terá também mudado o sofrimento psicológico?
Na procura de algo que satisfaça no imediato, na fuga constante ao aborrecimento e ao tédio, na procura do outro para iludir os sentimentos depressivos e o verdadeiro contacto com o próprio, como se desenvolve a capacidade de estar só e com o outro? Onde fica o terreno para construir o processo identitário individual e relacional?
Na inerente transformação da entrada para a adolescência em que impera o desafio da identidade, em que é preciso sentir-se em casa dentro do próprio corpo, ter uma bússola orientadora do caminho que se vai seguir (ou que pelo menos permita que se possa ir descobrindo) e em que é imperial  reconhecer-se (o próprio) e ser reconhecido/visto (pelo outro), quais são os modelos que estamos a construir?
Desvalorizamos, inconscientemente, o adolescente, porque não é adulto, responsabilizamo-lo, porque não é criança, queremos que cresça e que faça, que seja e que planeie, que suporte e dirija, mas não validamos quando sente, quando pensa, quando quer, quando projecta (porque é criança e não adulto)… não abrimos assim espaço para a psicopatologia? Será o sofrimento calado, bebido, consumido, cortado, apenas uma fase? Ou será um grito do desespero, do desamparo, da insegurança?
            Cada vez mais predominam, nesta fase de desenvolvimento, as chamadas “patologias do agir” – toxicomanias, alcoolismo, perturbações/distúrbios alimentares, comportamentos autodestrutivos (que podem potenciar o suicídio) e híper sexualizados, depressões entre outras. Entre o desejo de experimentar e descobrir, na fantasia idealizada da ausência de limites, não serão estes quadros uma tentativa de limitar a experiência?
            Estaremos a estruturar futuros adultos com recursos psíquicos frágeis?
            Sendo esta uma fase de tantas transformações aliada a todas as mudanças sociais e culturais envolventes da época que vivemos, onde fica o espaço para a estruturação do psiquismo?

            Servirá, assim, o contexto psicoterapêutico para ajudar a ouvir aquilo que está escondido pelo agido.








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