“Aquilo que há em nós de criativo é
infantil, ou vem da infância, é aquilo que fica vivo da infância, e a infância,
por definição, é criativa, porque cria a própria pessoa.”
João
dos Santos, 2000
Deverá ser do senso comum
que brincar é uma ação promotora de saúde: do corpo e da alma. É o primeiro
idioma da infância. Falar de brincar remete-nos, inevitavelmente, ao tempo do
faz de conta, da comunicação simbólica, através da qual a criança desfrui dos
deslocamentos e das metáforas que ela possibilita e por intermédio das quais
uma coisa pode ser tomada por outra – uma fita pode ser uma coroa de princesa,
uma caixa pode ser um avião, um pano uma capa de super-herói, um lápis uma
varinha mágica.
Brincar expressa afeto, criatividade, fantasia, mas também, agressividade e rivalidade. É uma forma de
ação sofisticada, representativa e simbólica. Brincar vive nas imediações dos
sonhos. Ambos os atos dispensam palavras. A criança sente-se livre para experimentar tudo o que quiser, ela pode ser tudo e,
nesse brincar não se sentam para falar como os adultos, encontram no lúdico a forma
preferencial de enunciar o que se encontra no seu arquivo inconsciente. Assim, em
psicoterapia com crianças, o jogo é muito mais que uma simples brincadeira. É a porta de entrada para o mundo interno da criança.
A
atividade lúdica proporciona também o domínio e a integração de experiências
difíceis e traumáticas, transformando o passivo em ativo (Freud, 1920).
Éo brincar que nos conduz aos relacionamentos sociais, ligando-nos ao outro que, até lá, estava imbuído de estranheza e desconfiança. E é na relação e
cooperação com este outro que aprendemos a pensar, a criar e, também, a
permitir a frustração do erro e do insucesso. De forma efetiva, aprendemos a
importância da negociação e da partilha, lidamos com as regras e desenvolvemos
argumentação para a resolver conflitos. Brincar é expandirmo-nos enquanto pessoas.
Ao
brincar, dançamos com a arte e com ela construímos identidade e singularidade. É no brincar, e talvez apenas no brincar, que acriança e o adulto usufruem da sua liberdade de criação.
Por tudo isto e por muito
mais que haveria a refletir, brincar é algo valioso e terapêutico por si só. Permite
às crianças pensar, imaginar e construir significados, analogamente ao adulto
com a linguagem verbal.
No mundo da imaginação, onde
as possibilidades são infindas, as crianças elaboram aspetos desejados,
proibidos ou rejeitados de si mesmas, consideravelmente com menos conflitos. Modificar
a história ou interromper a brincadeira para iniciar outra, possibilita-as a regularem-se
emocionalmente. Brincar é estar, em simultâneo, no mundo real e no mundo da
imaginação e dentro dela, é possível enfrentar os maiores dilemas morais; morrer;
matar; ser o melhor amigo ou o mais férreo inimigo.
A
importância do Brincar está amplamente estudada e evidenciada pela comunidade
científica. No contexto clínico, assume-se como uma ferramenta com capacidade
diagnóstica e terapêutica, pois cria a possibilidade de a criança expressar a
sua realidade psíquica, e concomitantemente, permite ao terapeuta identificar
formas de ajudar a criança na elaboração dos seus conflitos e no seu
desenvolvimento afetivo, cognitivo e social.
Drª. Soraia
Almeida
O
Canto da Psicologia - Braga
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