quinta-feira, 18 de março de 2021

Mudança de Paradigma...

 


 Gritam-nos a plenos pulmões que a solidão é a nossa salvação. Sentimos que o Luto se vestiu de preto muito mais vezes do que era suposto, que se cantaram mais marchas fúnebres do que era desejado e que perdemos mais entes queridos do que nos é permitido.

Por estes dias, é-nos vedado estar em grupo, conviver como sempre fizemos, agir como coletivamente sempre nos ensinaram e, por força dessa alteração do real, deixou de estar disponível a renovação de contactos que sempre nutriu as relações sociais e o bem-estar intra e inter-individual. Ficar em casa e proteger-nos é, sem dúvida, vital. No entanto, o isolamento social – pedem-nos para ignorar o Ser Gregário que há em nós – acarreta outras consequências, além do afastamento físico, que são invisíveis ao olho e à desatenção. Vivemos, actualmente, um Luto pela idealização, pelos desejos, pela relação, pelas vontades e pela fantasia. Este Luto que se veste de preto e está presente nos enterros, veste-se, também, com um manto da invisibilidade dentro de cada um de nós e ameaça, a todo o instante, aparecer novamente com a notícia, brutal: “acabámos de perder mais um desejo!”. Este desejo, o de cada um de nós, nasce da idealização da vontade e do sonho, mas acaba com um “adeus” e uma marcha fúnebre; ainda que a consciência nos diga “Calma, vêm mais desejos amanhã”; e é certo. Elaboramos mais desejos no dia seguinte mas, aquele já não volta. Tal como as pessoas que se perderam nesta luta colectiva.

Vivemos uma ameaça permanente e invisível que a qualquer momento pode atacar com maior vigor.

 Temos vindo a adaptar-nos. Quem sabe já estamos adaptados.  Somos indivíduos subjectivos quando elaboramos um pensamento, o que nos permite duas formulações: a primeira que somos seres de hábitos e, à partida, resistimos a novos que nos sejam impostos; a segunda é que, apesar de contrariados, somos capazes de nos adaptar a situações externas ameaçadoras e desenvolver mecanismos que nos permitam sobreviver. Além das questões externas, as problemáticas internas são maleáveis, certamente, pela necessidade que daí advém. A solidão será atenuada pela sensação de solidão conjunta e a invisibilidade da tristeza será amparada pela certeza de que todos desejamos sentir-nos mais felizes. O setting terapêutico enche-se da procura pelas respostas, pelas interrogações ansiosas que precisam de ser escutadas e o desejo de alguém que anseia gerir as emoções e dizer: “Desta vez estou preparado”.

Temos dois lados de uma moeda: por um lado a vontade do antigo e a saudade do que já foi; por outro a incerteza do futuro ao espelho com o desconforto do presente. Do oculto terceiro lado, sabemos que sobra o desejo comum de uma perspectiva brilhante e saudável deste Mundo Novo.



Drª Maria Inês Almeida - Alcochete

O Canto da Psicologia



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