De acordo
com estatísticas recentes do Health
Behaviour in School-aged Children, feito em Portugal em 2021,
estamos a assistir a um aumento gritante de casos de automutilação em que cerca
62% dos jovens inquiridos, referem terem assumido comportamentos de
autoagressividade, principalmente, nas idades compreendidas entre os 13 e os 17anos, sendo que é mais predominante no sexo feminino. Verifica-se que desde
2019 que todas, estas perturbações, têm vindo a aumentar exponencialmente, a
par com o inicio da pandemia, que já esta a caminho dos quase 2 anos.
Certamente
que as faixas etárias que mais têm vindo a sofrer, psicologicamente, com a
Pandemia, são os idosos e os adolescentes, uns por terem estado, ainda mais
isolados e mergulhados na sua solidão e os outros, por terem perdido os
primeiros passos da vida social, a necessidade de partilha e de ser aceite pelos
pares.
A adolescência, é um período de desenvolvimento normal, em que surge o desejo e a
vontade de estar, maioritariamente, com os amigos, de conviver, de experimentar,
papeis sociais, de se encontrarem, de construírem e estabilizarem a sua
personalidade. Ora a Pandemia roubou
esta oportunidade de evolução humana, aos jovens adolescentes, impossibilitou, as
convivências sociais, criar laços de amizade e, mais importante, que tudo isto,
de permitir a progressão da auto estima, necessária para se tornarem
independentes, no pensamento e na identidade.
Os confinamentos
foram vividos, por muitos adolescentes, como torturas autênticas, numa época em
que se querem afirmar, para se tornarem mais autossuficientes e confirmarem a
sua capacidade de autonomia, tal não foi possível de forma alguma. Queriam sair
não tinham como, queriam estar com os amigos não era possível, a única
possibilidade era estar em casa, com os pais, mas vendo bem e se, nos
colocarmos nos sapatos dos nossos adolescentes, não é por mal, mas a última
coisa que devem querer, é estar com os pais, ou a família, permanentemente, 24
sobre 24 horas.
Deste
modo, os pais absorvidos em preocupações, ao observarem os filhos fechados nos
quartos, todos os dias, ápticos, desinteressados, irritados e sem entusiasmo. Os
mesmos pais que, com mais ou menos facilidade, de lidarem com o seu próprio luto,
de verem que os filhos já não são mais os bebés de outrora, mas, também não
são, adultos, a frustração instala-se e o mais comum, é embirrar com os filhos,
tal como eles se zangam com os pais, multiplicam-se as chamadas de atenção: “-
sai do quarto! Arruma isto! não faças assim! Porque estás com essa cara de mal
disposto…? etc.”. Todas estas posturas parentais, entre outras, só vão criar,
mais distanciamento emocional, entre os adolescentes e as suas figuras
parentais, já não são crianças, estão a caminho de serem adultos. Como os pais vivenciam
estas realidades, vai moldar a forma como os jovens vão continuar a construir a
sua própria autoestima, eles sabem que os pais têm saudades de quando eles, eram
bebés e não davam “problemas” agora respondem, são desagradáveis.
Contudo
é preciso amar igualmente, esta fase dos nossos filhos, em que começam a querer
se “separar” dos pais e se aproximarem dos amigos. Custa mais a uns pais, do
que a outros, mas a criança/adolescente, já não quer só estar com os pais, já
não os idealiza, como antigamente, não são os heróis máximos, mas continuam a
amar os seus pais.
No
entanto, por conta da necessidade de afirmação, mais agressiva ou menos,
procuram esta independência. Se sentirem que tem de provar mais, que tem de ser
perfeitos, para que os pais se orgulhem deles, então o sofrimento psicológico
instalasse, a auto estima, fica ferida e a única forma de acalmar a ansiedade
avassaladora, são os cortes, que existem, de verdade, na alma, mas parecem que,
momentaneamente, ganham vida naquela marca e a dor deixa de ser invisível, o
que parece acalmar, temporariamente. São jovens com incapacidade de regularem
emoções, de aceitarem a sua vulnerabilidade, como normal e saudável, é natural
sentir as emoções e não abafa-las, não se deve educar os filhos para ignorarem
o que estão a sentir, de forma a serem “perfeitos”, a melhor forma de ajudar os
adolescentes, é os pais serem o exemplo, na procura de sentirem e aceitarem a
sua própria, humanidade e fragilidade.
Além
de todos estes fatores familiares e, também, a par com a pandemia, o mundo
tecnológico acaba por favorecer a solidão, a falta de contacto com os próximos,
de interagir de face a face, de criar laços afetivos mais profundos, o
sentimento que é compreendido, sem ser julgado, que se é amado
incondicionalmente.
Deste
modo vamos tentar compreender melhor os nossos adolescentes e ouvi-los, com
ouvidos atentos e deixa-los crescer a um ritmo que é possível, sempre com esperança
que conseguem lá chegar e que não precisam de atingir nada, mas podem existir,
no agora e desfrutarem das pequenas e simples coisas da vida.
Dra.
Mafalda Leite Borges - Alcochete
Sem comentários:
Enviar um comentário