quinta-feira, 15 de julho de 2021

Era uma vez um bebé...

 



Quase toda a gente gosta de bebés, suscitam ternura e não é por acaso, foram “desenhados” com aquelas formas redondas para  atrair, para que possam ser cuidados, visto a sua enorme dependência de outra pessoa para a sua sobrevivência. Dizia o pediatra e psicanalista Donald Winnicott “there's not such a thing as a baby” (“o bebé não existe”), referindo-se exactamente à impossibilidade de um bebé viver sozinho, existindo sim a díade mãe-bebé (ou cuidador-bebé). Contudo este olhar para o bebé, este conhecimento que fomos adquirindo acerca da pessoa humana na sua natureza mais precoce é muito, muito recente e ainda existem muitos mitos e falta de conhecimento. Ainda há poucos anos atrás se faziam intervenções médicas, e algumas cirurgias, a bebés sem qualquer tipo de anestesia porque se acreditava que os bebés recém-nascidos não sentiam dor...  Mesmo a palavra “bebé” é relativamente recente na história da humanidade, segundo Delassus[1] é um vocábulo retirado da lingua inglesa (baby) e pode ser datado de meados do século XIX, mais precisamente de 1842. A palavra infância já existe há mais tempo, oriunda do latim infans que significa aquele que não fala, que não teve acesso à linguagem, embora possamos ver também aqui uma certa conotação negativa no sentido em que é excluido da comunidade humana dos seres que falam.

            Felizmente, os bebés em particular e a infância no geral, começaram a despertar o interesse dos investigadores e o bebé começou a ter um lugar próprio e as suas capacidades poderam ser vistas. O estudo dos bebés atravessa várias disciplinas entre elas, a biologia, a medicina, a antropologia, a pedagogia e a  psicologia teve (e tem tido) também um grande contributo, tendo alguns cientistas começado por observar sistematicamente os seus próprios filhos, abrindo assim portas para novas observações. Pode então surgir uma cultura da infância, muito embora este conhecimento fique muitas vezes fechado em livros e circuitos académicos, dando azo a que persistam alguns mitos e não prevaleça uma verdadeira cultura da infância. A título de curiosidade colocarei aqui algumas perguntas e respostas, que por vezes surgem:

 

-        Quanto vêem os bebés?

            Poucos dias após o nascimento, o recém-nascido é capaz de ver de forma nítida e focada qualquer objecto a uma distância entre os 20 e os 50cm de distância. Quando olha para longe vê uma mancha difusa, uma vez que ainda não tem um controlo bi-ocular e é por isso que por vezes entortam os olhos. Contudo, a partir das 6 semanas já começam a conseguir concentrar-se em distâncias mais longas. E isto não é por acaso, é um “mecanismo anti-stress”! Foca-se no que se encontra perto, e que pode ser muito importante, a mãe, o alimento, etc, e evita o que está longe do seu corpo, que não tem importância para ele e que pode ser ainda muito confuso. Sabe-se ainda que os bebés preferem formas curvas, são sensíveis a padrões e gostam de objectos grandes e iluminados.

 

-        Os bebés sonham?

            Sim, sonham só não sabemos com o quê! Têm até surgido investigações que sugerem que sonham já desde a vida uterina, na barriga da mãe. Sabe-se que sonham através do tipo de sono, o REM,  onde os olhos se movem por detrás das pálpebras fechadas; este é um sono mais leve e os bebés fazem-no em cerca do dobro do tempo dos adultos.

 

-        Os bebés têm consciência de si próprios?

            Esta questão é mais difícil de responder mas tudo leva a crer que o bebé sabe diferenciar-se: sente os limites do seu próprio corpo, situa-se nas relações com os outros (eu social) e tem um elementar conhecimento de si. Alguns estudos que utilizam a interação e imitação precoce, o reflexo em espelhos ou a visualização de vídeos, têm vindo a demonstrar formas elementares de consciência de si, contudo o conhecimento acerca de si próprio pressupõe a interação com o meio ambiente e é um processo longo que acompanha o desenvolvimento. É então um conhecimento que nos acompanha a vida toda e será, aliás, um dos propósitos da psicoterapia: conhece-te a ti mesmo.

 


Drª Maria Portugal - Lisboa

O Canto da Psicologia

 



[1]             - Delassus (1998)  “A natureza do bebé”. Edições Cetop


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