domingo, 10 de agosto de 2014

A nossa Caixa das Perguntas...





Ora O Canto da Psicologia na Segunda-Feira colocou enquanto tema para reflexão a Dislexia. E como já sabe na Segunda perguntamos e Sexta respondemos.

Saber ler, saber escrever, e saber contar/calcular são três capacidades essenciais ao desempenho académico e à integração na sociedade. São estes saberes rudimentares que nos permitem entender e estar em contacto com o mundo sociocultural que nos rodeia. O conhecimento sobre este sistema-património de signos e símbolos – letras e números – permeia o nosso tecido social e como tal achamo-nos obrigados a conhecer e a interpretá-los rápida e correctamente.

Utilizamos então as palavras Dislexia, Disortografia e Discalculia para designar dificuldades específicas na leitura, na escrita e na aritmética, respectivamente. As palavras de prefixo Dis- não se ficam por aqui; Disgrafia, Distimico, Disruptivo e Disfuncional são outras palavras que utilizamos para designar o que é irregular, o que não funciona apropriadamente ou o que sai da norma.

A Dislexia é apenas uma categoria de várias dificuldades de leitura. É que as dificuldades de leitura podem ser explicadas de formas muito diferentes. Uma criança poderá evidenciar uma perturbação da leitura porque demonstra dificuldades na codificação de informação para processamento (memória), ou porque demonstra ter dificuldades na manutenção da atenção, ou porque tem dificuldades de organização perceptiva. De forma semelhante, uma criança poderá demonstrar dificuldades na leitura simplesmente em contexto de sala de aula devido a um aumento da ansiedade. Os motivos são inúmeros, mas o que distingue a dislexia de outras dificuldades de leitura é uma perturbação da capacidade da criança na associação entre fonema (som-letra) e grafema (símbolo-letra). 

A título de curiosidade é interessante vermos como durante muito tempo julgou-se que a dislexia e a disortografia teria que ver com dificuldades de organização perceptiva uma vez que a evidência demonstrava trocas e inversões de letras na escrita (como por exemplo o ‘p’ com o ‘b’ com o ‘q’). Ligavam-se estas evidências a dificuldades de organização do esquema corporal ou até da lateralidade. A literatura não tardou em estabelecer inferências relativamente à personalidade do disléxico, como se existissem ‘personalidades disléxicas’. Alguns encontraram nestas dificuldades justificação para afirmar que o disléxico seria ‘trapalhão’ ou ‘desajeitado’. No entanto e apesar de existiram crianças com estas dificuldades observou-se que a dislexia não teria que ver com estas questões. 

A evidência neurocientifica demonstrou outras coisas... nomeadamente esta dificuldade em estabelecer ligações entre fonemas e grafemas. Desta forma a avaliação da dislexia deve ser um processo laborioso de demonstração desta dificuldade especifica. 

Hoje em dia sabemos que existe um perfil Disléxico e que consiste, de um modo geral, em: Dificuldades de Leitura (trocas, omissões, substituições, invenções); Baixa Fluência de Leitura; Baixa Consciência Fonológica; Perfil Cognitivo Normal/Superior; Organização Perceptiva Regular. É este o perfil distingue que o leitor disléxico de qualquer outro.

Ser-se disléxico é particularmente difícil, não só pelas dificuldades inerentes à leitura desajeitada, mas também porque provoca ansiedade e desconforto. Conhecemos pois crianças e adolescentes com verdadeiras fobias à leitura sentido-se envergonhados pelas dificuldades que apresentam. Sabemos como este tipo de dificuldades se manifestam ao nível da própria personalidade como que contaminando o funcionamento mental. É ainda angustiante para o disléxico esta sua dificuldade porque ele apresenta um perfil cognitivo normal/superior, que o torna o excelente a entender e a compreender o conteúdo dos textos. 

Neste sentido, a avaliação e despiste da dislexia deverá ser feito o mais cedo possível. Apesar do diagnóstico ser difícil antes da entrada no 1º ciclo (uma vez que as crianças ainda não sabem ler), sabemos que existem alguns indicadores precoces que são extremamente importantes para a prevenção destas dificuldades.

Existem hoje múltiplas técnicas e livros que se encontram facilmente em qualquer livraria e que podem ser utilizadas para ajudar o disléxico. Algumas centram-se precisamente na ligação entre o grafema, o som e motricidade. Outras têm um teor mais contextual intervindo dentro do triângulo escola-família-criança. 
Mas para que estas técnicas sejam adaptadas a cada situação é necessário que o encaminhamento seja adequado e que se estabeleçam articulações entre psicólogos e professores. 

Existe também um conjunto de medidas que podem ser tomadas pela escola no sentido de auxiliar estas crianças e adolescentes, podendo inclusivamente modificar-se o enunciado dos testes e o seu tipo de aplicação por forma a adaptar-se melhor às suas necessidades.

O Canto da Psicologia 

Dr. Fábio Mateus



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