segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Agressivo? o que é isso?







“Estou tão  zangada hoje, mas isto fica tudo cá dentro de mim… Depois, há um momento em que não aguento mais, parece que vou explodir, que tenho de fazer alguma coisa. E é por isso que me corto ou que tenho ataques de pânico. É como se isso me libertasse. Esta zanga fica toda para mim, se me quisesse zangar contigo, simplesmente não conseguia, não sabia como… não quero magoar os outros ou sentir que posso ser injusta…"
Adolescente, 14 anos


As primeiras interações do bebé surgem com os pais e é neste plano que se cria um espaço onde podem começar a existir as primeiras relações. É na relação com os pais e com os outros mais significativos que a criança apreende e aprende como é o mundo à sua volta. É no ambiente familiar, neste espaço externo acolhedor, contentor e securizante, (física e psiquicamente) que a criança aprende a organizar-se internamente e a regular-se emocionalmente. É neste espaço (cá de fora) que a criança começa a fabricar todas as coisas que podem existir dentro dela.

Através das constantes interações entre pais e filhos vão-se criando as histórias dos afetos para a criança. Estas histórias, carregadas de fantasia, de príncipes e princesas, de monstros e dragões, de espadas e pistolas, de bons e de maus, e , acima de tudo, repletas de coisas secretas, que tantas vezes são confusas, levantam ansiedades e dificuldades para a criança e para os pais.
Enquanto adultos, a maioria das vezes, conseguirmos reconhecer o que vemos e o que sentimos e conseguimos elaborar a forma como nos expressamos. Enquanto crianças, este pensar sobre as coisas é facilitado, desenvolvido e aprendido através das relações com os pais. Acontece, muitas vezes, que a criança, não conseguindo perceber o que sente e não sabendo ainda muito bem o que pensar ou como pensar, age. Esta ação é a forma da criança descarregar todas estas coisas que acontecem dentro dela e que ainda não consegue perceber muito bem.

Ouvimos, muitas vezes, histórias de crianças que mordem na escola, que batem, que empurram. Histórias de crianças protocoladas como “agressivas”. Muito poucas vezes ouvimos falar da criança bem-comportada, com boas notas e que é muito amiga do seu amigo, mas que às vezes fica um pouco agitada, meio que sem sentido. A agressividade que vem para fora assusta-nos, a que fica cá dentro aquieta-nos.
É quase como se a agressividade (a vivida e visível e a vivida, mas invisível) fosse o monstro ou o dragão que nos vem perseguir e destruir. Mas não temos em todas as histórias um monstro ou um dragão? Apesar deste monstro ou dragão  não ter que ser  necessariamente mau, é  assustador. É assustador, essencialmente, porque não sabemos falar a língua dele. É mais ou menos isto que acontece nestes relatos de agressividade: enquanto pais e educadores, assustamo-nos com estes comportamentos ditos “agressivos” e damos-lhes uma conotação disfuncional.  Contudo, na maioria das vezes, estes comportamentos são bastante saudáveis, pois são a forma que a criança tem de nos mostrar que há  algo a acontecer dentro dela, alguma coisa que não está a saber muito bem o que é nem como pensar nela,  expressá-la ou até mesmo como calá-la. Então, descarrega-a através do comportamento.


É importante podermos, enquanto adultos, conter, ajudar a elaborar, explicar, aceitar, cuidar e conversar sobre as histórias do mundo interno da criança, sendo personagens ativas nestes mundos de fantasia, que ajudam a criança a organizá-los e a aprender a expressá-los (mesmo quando as coisas estão caóticas ou desorganizadas).



Drª Inês Lamares
O Canto da Psicologia






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