quarta-feira, 2 de maio de 2018

A era do vazio na contemporaneidade...










Nas últimas décadas, a par dos inquestionáveis avanços tecnológicos ocorridos no âmbito da saúde, verifica-se na prática clínica o crescente número de pedidos de ajuda para um mal-estar cuja incidência nos consultórios aumenta a olhos vistos. Não se trata, porém, de uma ocorrência inusitada no nosso campo de saber: trata-se, antes, de uma queixa que parece veicular um mal-estar da sociedade contemporânea e que se traduz numa angustia existencial quanto à validade da existência em si. Mas o que é, então, “a patologia do vazio”?
            Nestes pacientes, a queixa surge predominantemente em torno de carências provenientes de falhas que se instalaram nos primórdios do desenvolvimento emocional e que promoveram a formação de verdadeiros “buracos negros” na formação do Eu. No decurso do tratamento psicoterapêutico, estes estado emergem sob a forma de um estado mental de desmotivação pela vida, num registo letárgico e monótono, marcado pela ausência de aspirações ou expectativas. Surge, enquanto sintoma, representado na depressão sem tristeza, nos transtornos alimentares, nas toxicomanias, na violência vincular ou nas somatizações. O que o diferencia, contudo, de qualquer outro diagnóstico é precisamente este núcleo do vazio afetivo.
            Atualmente, algumas das pessoas que procuram tratamento psicoterapêutico apresentam uma tendência que acompanha o ritmo frenético civilizacional: uma busca incessante por soluções mais rápidas e, alegando razões económicas que são, muitas vezes, reais (porque, de facto, o poder económico diminuiu), insistem em ter um menor número de sessões, além de uma duração mais curta da psicoterapia. Este é um dos obstáculos à prática clínica atual, sobretudo quando, paradoxalmente, a queixa  e a necessidade de alguns destes quadros carece de um acompanhamento prolongado, que seja verdadeiramente eficaz na possibilidade de reparar as fragilidades do sujeito. Paralelamente, o paradigma medicamentoso impera nesta sociedade do imediatismo. “As pílulas mágicas” funcionam como tampões para tais estados, mas não promovem a sua reparação e integração. Esta convergência de fatores tornam-se verdadeiros obstáculos ao tratamento, perpetuando um adiando na busca de uma solução eficaz que promova o bem-estar ao sujeito.  

Drª Joana Alves Ferreira







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