Mas
diga-me Doutora, o que é que posso fazer? Eu quero ajudá-lo mas não sei o que é
que devo dizer, o que é que devo perguntar, fico assim sem saber qual é o meu
lugar.
A
regra é de ouro: o trabalho desenvolvido no espaço terapêutico é confidencial. Não
nos iremos alongar nas diferenças entre um processo com adultos, com
adolescentes ou com crianças, uma vez que se levantarão naturalmente questões
um pouco diferentes. Pretendemos antes frisar o quão importante esta regra é na
criação de uma aliança terapêutica, com vista a um trabalho conjunto que se
pretende transformador. Com os adultos, esta questão da confidencialidade é comummente
apresentada e discutida no início do processo, para que não restem dúvidas em
relação ao que isto implica e às suas limitações. Tal significa, portanto, que assim
como sucede com todas as regras, existem exceções que a confirmam.
Surgem
por vezes situações em que o terapeuta poderá ter de trazer, de forma muito
cuidada, o envolvimento real e não apenas simbólico de um terceiro elemento no
processo em desenvolvimento. Tal como refere a Ordem dos Psicólogos Portugueses,
«a não manutenção da confidencialidade pode justificar-se sempre que se
considere existir uma situação de perigo
para o cliente ou para terceiros que possa ameaçar de uma forma grave a sua
integridade física ou psíquica (…)». Quererá isto dizer que de repente se deixa
de aplicar qualquer direito à privacidade e que qualquer pessoa poderá passar a
saber aquilo que até então era apenas do par terapêutico (terapeuta e paciente)?
Mais uma vez, a Ordem esclarece: «a informação confidencial é transmitida apenas a quem se considerar de direito
e imprescindível para uma intervenção adequada e atempada face à situação em
causa (…)». Então, o que significa tudo isto? Que não é de ânimo leve nem de
forma impulsiva que tal regra é quebrada. Que tal só acontece se for
absolutamente necessário, após avaliação cuidada, e com o conhecimento prévio
do paciente, para que este entenda este gesto como um cuidado essencial no
decorrer do trabalho psicoterapêutico conjunto.
A
frase citada no início deste texto foi proferida por um familiar de M.,
paciente em acompanhamento que se encontrava a passar por uma fase
particularmente difícil. O seu familiar foi contactado após decisão do par
terapêutico, tendo-se decidido incluir esta pessoa no processo para que pudesse
dar o seu apoio ao M. caso tal fosse necessário. A sua exclamação traduz a
preocupação de quem de repente percebe que não sabe como há de agir com alguém
que se ama e que se sabe que está a sofrer. Alguém que fica inquieto com o seu
familiar e que deseja ajudar, mas sem saber ao certo como. Alguém que pede
conselhos específicos sobre o que deve dizer, como se deve comportar… Quando na
realidade, não há uma resposta única que sirva a todas as situações.
O
que significa apoiar alguém que está a passar por um sofrimento tão imenso,
sabendo que não se consegue magicamente aliviá-lo da sua dor? O que se pode
fazer? De uma forma geral, sugeriríamos que, talvez acima de tudo, esteja o
escutar. Não apenas ouvir, como se de barulho de fundo se tratasse. Falamos de
um verdadeiro escutar, em que todos os sentidos se afinam numa só direção, em
que se permite que as palavras arrepiem a pele e sejam sentidas de forma quase
táctil. Será que isso não é o que de mais valioso se pode oferecer a quem se
ama? Nem sempre é necessário dizer «vai
ficar tudo bem» quando não se sabe se isso é verdade: talvez mais
importante seja dizer «estou aqui para
ti, seja para o que for». Por vezes não é fácil ajudar alguém que esteja a
passar por uma fase difícil, e seria maravilhoso se um simples abraço
resolvesse dores antigas, mágoas profundas e lágrimas que teimam em correr.
Pode não resolver, mas apostaríamos que esse abraço tem o potencial de se
infiltrar para além da pele e tocar no centro de quem se é, aliviando o peso
que se carrega. É que quando alguém pede ajuda, muito frequentemente não é num
sentido literal e instrumental: é apenas um movimento humano, de quem se quer
ver reconhecido, aceite, amado.
Drª Carolina Franco
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