quinta-feira, 25 de julho de 2019

A adoção....






A adoção é um processo que abarca diversos processos psíquicos, tanto para a criança adotada como para a família que adota, é uma nova família e é um novo membro na família. É um processo que envolve adaptação de ambas as partes, na verdade tal como envolve o nascimento de um bebé, é momento de reorganizações das representações para o acolhimento de um novo membro com condições psicoafetivas satisfatórias. Este acolhimento envolve uma preparação, tal como envolve a gravidez, uma preparação do novo que está a chegar, onde também é necessário passar pelo processo de transformação da criança imaginária (idealizada) na criança real. Esta transformação é crucial para a construção futura da relação de filiação.

Apesar de podermos comparar diversos momentos com o nascimento de um bebé, a adoção pode trazer outro tipo de angústias e medos, medo do desconhecido, medo de um passado desconhecido e de possíveis reações e decisões futuras. À partida existe logo o primeiro impacto que poderá ser confuso, angustiante, quando falamos de uma adoção que envolve uma criança institucionalizada, onde os pais se confrontam com uma realidade que muitas vezes não é a sua realidade e que pode levar a sentimentos distintos. Depois deste primeiro impacto inicia-se todo o processo que envolve as questões legais que “ocupam” muito do tempo à construção da relação filiação, podendo fragiliza-la. Por um lado emerge a vontade de criar uma relação com a criança, por outro lado existe sempre a dúvida (inevitável): irá ela de facto fazer parte da nossa família? Estamos a falar de anos com estas incertezas, com estas angústias, até chegar o momento em que (nos casos bem sucedidos) chega a notícia de que é oficial, de que é real, a criança “já é deles”.

Passada esta fase vem a realidade, a realidade de uma nova família, uma família que tem mais um e que implica automaticamente reorganização, tanto para os pais (e irmãos) como para a criança. Na criança, a adaptação a uma nova vida, a reorganização das ligações e das relações, sendo o papel dos pais crucial no seu comportamento, reconstruindo um continente psíquico que permita que esta fase seja contentora e segura. Nos pais, igualmente a adaptação, mas também as incertezas, agora outro tipo de incertezas, mas ainda assim incertezas. Incertezas sobre o passado da criança, sobre as consequências que esse poderá ter no seu comportamento futuro, incompreensão de comportamentos que já vêm pré-adquiridos, dúvidas de qual a melhor forma de os ajustar e adaptar. E ainda dúvidas sobre se esse comportamento está realmente associado ao passado ou se poderão eles, pais, ter falhado em algum momento…
E se quiser procurar a família quando for maior de idade? E se quiser saber qual é o seu passado? E se começar a fazer perguntas? Estas são questões que surgem (ou poderão surgir) e que levam a um enorme conflito interno nos pais, ao longo do crescimento da criança. Questões estas que trazem atrás muitas outras que não estão relacionadas apenas com a adoção em si, mas também com o funcionamento psíquico, as vivências, os fantasmas e os medos dos pais, enquanto seres individuais e enquanto casal.

Contamos ou não? Quando é que contamos? Como é que contamos? Será que existe uma maneira certa de o fazer? Será que já sabe? Vai compreender? Estas são outras questões que poderão eventualmente surgir, o momento de explicar que a criança é adotada…
Nestes casos, em que estas questões se tornam “demasiado” angustiantes e difíceis de ultrapassar, os pais precisam de suporte, evitando que os conflitos internos que surgem se transformem num sofrimento e desorganização psíquica no futuro, tanto para a criança como para os pais. É neste sentido que o apoio psicoterapêutico poderá entrar também na adoção, sendo utilizado como um espaço securizador e contentor de todas essas angústias. 



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