No zeitgeist
actual, cuja heterogeneidade de pessoas e suas experiências e problemáticas
é marca distintiva e determinante, impõe-se que os profissionais que se perfilam
a ajudar o outro disponham de uma gama alargada de soluções e abordagens teóricas, técnicas e científicas. Nesse âmbito e naquele que poderemos
considerar ser o espectro das abordagens terapêuticas de cunho psicanalítico,
no extremo oposto da análise clássica encontramos as psicoterapias breves de orientação psicanalítica. Ao longo das últimas décadas e, mormente, dos últimos
anos, esta forma específica de psicoterapia tem granjeado a atenção dos profissionais de orientação psicanalítica, bem como conduzido a resultados
muito positivos, com um cada vez mais vasto conjunto de pacientes.
Será importante iniciarmos desmistificando,
firmando, desde já, o estatuto independente e específico das psicoterapias breves de orientação psicanalítica. Estas “não são versões reduzidas da
psicoterapia psicanalítica, mas tratamentos planeados com a sua fundamentação
teórica própria (…) a psicoterapia breve de orientação dinâmica não é apenas
válida por direito próprio, como também (…) esclarece processos fundamentais
incluindo o benefício das psicoterapias analíticas de longa duração” (Hobbs,
1999). A psicoterapia breve de orientação psicanalítica tem, pois, a sua origem
na Psicanálise, partilhando com esta a sua base teórica e métodos centrais,
divergindo sobretudo na brevidade e no foco (idem). Quanto aos seus objetivos, Small sugeriu que o objectivo
primordial das psicoterapias breves de orientação psicanalítica era melhorar/mitigar
ou remover sintomas específicos apresentados; mas, em condições favoráveis, a
intervenção dinâmica de base que se implementa conduz, secundariamente, a
mudanças progressivas na personalidade e, por conseguinte, a um bem-estar psicológico
sustentado e, também por isso, prolongado no tempo.
A propósito dos factores
terapêuticos e o processo de mudança na psicoterapia breve de orientação
psicanalítica, Ashurst identificou uma série de componentes terapêuticos
presentes neste modelo de intervenção e comuns a todas as terapias psicodinâmicas. Desde logo a aliança terapêutica. Esta é um factor
fundamental a todas as terapias e, também nas psicoterapias breves são
relevadas a honestidade e a abertura por parte do terapeuta. A catarse emocional diz respeito à
expressão de sentimentos, que é fulcral para o alívio da tensão e para a
resolução dos conflitos. A experiência
emocional correctiva prende-se com a nova percepção que o sujeito adquire,
através da postura “permissiva” e disponível do terapeuta. A aprendizagem cognitiva está associada ao
trabalho analítico que, pelo confronto com as defesas e exame da transferência
promove no indivíduo uma maior compreensão de si próprio, resultando na criação
de novas cognições. A modelagem está
patente no processo pelo qual, consciente ou inconscientemente, o paciente
adopta uma postura de curiosidade activa que lhe permite a abordagem de sentimentos
negativos e assuntos difíceis, postos em evidência pelo terapeuta. Por último a
perlaboração diz respeito àquele que
é o encorajamento activo do sujeito, no sentido de lhe poder permitir
experimentar o seu insight gradualmente crescente.
Outros aspectos que
caracterizam este tipo de psicoterapias prendem-se com: a sua duração
relativamente limitada; o facto de, por norma, terem um foco bem delimitado de
intervenção; a atitude mais activa/interventiva do terapeuta; realizarem-se
numa configuração face a face; uma frequência mais reduzida das sessões, bem
como um número total de sessões mais diminuto.
Por fim, alguns dos
critérios de elegibilidade para este tipo de abordagem passam pela possibilidade
do paciente: apresentar um nível cognitivo moderado e, preferencialmente,
diferenciado; ser capaz de identificar um foco problemático primordial ou
circunscrito; estabelecer uma relação estável e franca com o terapeuta; e estar
fortemente motivado para a mudança. Assim, é compreensível que estejam
indicados para o efeito os pacientes com personalidades de funcionamento mais
estável e problemáticas mais reactivas (reacções ansiosas, fóbicas, lutos, rupturas
amorosas ou laborais, episódios depressivos reactivos, etc.) e contra-indicados
os pacientes com personalidades de funcionamento mais instável e problemáticas
mais regressivas, tais como os funcionamentos do foro psicóide, ou as
a-estruturações narcísico-limite (perversos, psicopáticos, etc.)
…
Em suma, seja por procura
activa do paciente, ou por decisão técnica e clínica do terapeuta, as
psicoterapias breves de orientação psicanalítica configuram-se como mais uma ferramenta valiosa, na prossecução daquele que é o desiderato fundamental da
intervenção psicológica: esboçar, construir e implementar um trabalho conjunto
fundado na qualidade da relação terapêutica, que tenha em conta as
particularidades e idiossincrasias do paciente, por forma a propiciar-lhe um
espaço contentor e potencial de desenvolvimento, garantindo-lhe, assim, uma
existência mais harmoniosa e prazerosa.
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