quinta-feira, 19 de setembro de 2019

As Psicoterapias Breves de Orientação Psicanalítica...







          No zeitgeist actual, cuja heterogeneidade de pessoas e suas experiências e problemáticas é marca distintiva e determinante, impõe-se que os profissionais que se perfilam a ajudar o outro disponham de uma gama alargada de soluções e abordagens teóricas, técnicas e científicas. Nesse âmbito e naquele que poderemos considerar ser o espectro das abordagens terapêuticas de cunho psicanalítico, no extremo oposto da análise clássica encontramos as psicoterapias breves de orientação psicanalítica. Ao longo das últimas décadas e, mormente, dos últimos anos, esta forma específica de psicoterapia tem granjeado a atenção dos profissionais de orientação psicanalítica, bem como conduzido a resultados muito positivos, com um cada vez mais vasto conjunto de pacientes.
          Será importante iniciarmos desmistificando, firmando, desde já, o estatuto independente e específico das psicoterapias breves de orientação psicanalítica. Estas “não são versões reduzidas da psicoterapia psicanalítica, mas tratamentos planeados com a sua fundamentação teórica própria (…) a psicoterapia breve de orientação dinâmica não é apenas válida por direito próprio, como também (…) esclarece processos fundamentais incluindo o benefício das psicoterapias analíticas de longa duração” (Hobbs, 1999). A psicoterapia breve de orientação psicanalítica tem, pois, a sua origem na Psicanálise, partilhando com esta a sua base teórica e métodos centrais, divergindo sobretudo na brevidade e no foco (idem). Quanto aos seus objetivos, Small sugeriu que o objectivo primordial das psicoterapias breves de orientação psicanalítica era melhorar/mitigar ou remover sintomas específicos apresentados; mas, em condições favoráveis, a intervenção dinâmica de base que se implementa conduz, secundariamente, a mudanças progressivas na personalidade e, por conseguinte, a um bem-estar psicológico sustentado e, também por isso, prolongado no tempo.
          A propósito dos factores terapêuticos e o processo de mudança na psicoterapia breve de orientação psicanalítica, Ashurst identificou uma série de componentes terapêuticos presentes neste modelo de intervenção e comuns a todas as terapias psicodinâmicas. Desde logo a aliança terapêutica. Esta é um factor fundamental a todas as terapias e, também nas psicoterapias breves são relevadas a honestidade e a abertura por parte do terapeuta. A catarse emocional diz respeito à expressão de sentimentos, que é fulcral para o alívio da tensão e para a resolução dos conflitos. A experiência emocional correctiva prende-se com a nova percepção que o sujeito adquire, através da postura “permissiva” e disponível do terapeuta. A aprendizagem cognitiva está associada ao trabalho analítico que, pelo confronto com as defesas e exame da transferência promove no indivíduo uma maior compreensão de si próprio, resultando na criação de novas cognições. A modelagem está patente no processo pelo qual, consciente ou inconscientemente, o paciente adopta uma postura de curiosidade activa que lhe permite a abordagem de sentimentos negativos e assuntos difíceis, postos em evidência pelo terapeuta. Por último a perlaboração diz respeito àquele que é o encorajamento activo do sujeito, no sentido de lhe poder permitir experimentar o seu insight gradualmente crescente.
          Outros aspectos que caracterizam este tipo de psicoterapias prendem-se com: a sua duração relativamente limitada; o facto de, por norma, terem um foco bem delimitado de intervenção; a atitude mais activa/interventiva do terapeuta; realizarem-se numa configuração face a face; uma frequência mais reduzida das sessões, bem como um número total de sessões mais diminuto.
          Por fim, alguns dos critérios de elegibilidade para este tipo de abordagem passam pela possibilidade do paciente: apresentar um nível cognitivo moderado e, preferencialmente, diferenciado; ser capaz de identificar um foco problemático primordial ou circunscrito; estabelecer uma relação estável e franca com o terapeuta; e estar fortemente motivado para a mudança. Assim, é compreensível que estejam indicados para o efeito os pacientes com personalidades de funcionamento mais estável e problemáticas mais reactivas (reacções ansiosas, fóbicas, lutos, rupturas amorosas ou laborais, episódios depressivos reactivos, etc.) e contra-indicados os pacientes com personalidades de funcionamento mais instável e problemáticas mais regressivas, tais como os funcionamentos do foro psicóide, ou as a-estruturações narcísico-limite (perversos, psicopáticos, etc.)
          Em suma, seja por procura activa do paciente, ou por decisão técnica e clínica do terapeuta, as psicoterapias breves de orientação psicanalítica configuram-se como mais uma ferramenta valiosa, na prossecução daquele que é o desiderato fundamental da intervenção psicológica: esboçar, construir e implementar um trabalho conjunto fundado na qualidade da relação terapêutica, que tenha em conta as particularidades e idiossincrasias do paciente, por forma a propiciar-lhe um espaço contentor e potencial de desenvolvimento, garantindo-lhe, assim, uma existência mais harmoniosa e prazerosa.





         

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