Os benefícios do treino musical para o desenvolvimento cerebral.
Considerada como uma das mais antigas formas de arte e expressão, a Música tem acompanhado a
evolução da Humanidade desde os seus primórdios, e já na Grécia Antiga a aprendizagem musical
era encarada como um dos pilares fundamentais do sistema de educação e do desenvolvimento
humano. Atualmente, a neurociência é unânime em afirmar que o treino musical, especialmente
quando feito em fases iniciais do desenvolvimento, traz inúmeros benefícios para outros domínios
cognitivos, como a linguagem ou matemáticas, e diversos estudos apontam para diferenças
funcionais e estruturais significativas entre os cérebros de músicos e não-músicos. Os músicos
adquirem e praticam constantemente uma imensa variedade de complexas capacidades motoras,
auditivas e multimodais, convertendo a notação musical visual em comandos motores, enquanto
monitorizam simultaneamente o resultado musical e recebem feedback multissensorial.
Num estudo publicado na revista Psychological Science, um grupo de crianças de 6 anos de idade,
quando expostas a um ano de aulas de voz ou piano, revelaram um aumento significativo no seu QI
comparativamente às do grupo de controlo que não receberam qualquer formação, sendo que o
treino musical surtiu efeitos em virtualmente todos os sub-testes de medição do quociente de
inteligência.
Nos resultados iniciais de um estudo longitudinal de 5 anos, da co-autoria do neurocientista
português António Damásio, publicados recentemente no jornal Developmental Cognitive
Neuroscience, verifica-se que a instrução musical parece acelerar o desenvolvimento cerebral em
crianças, nomeadamente em áreas cerebrais relacionadas com o processo auditivo. Como avançam
os investigadores, este tipo de maturação pode favorecer o mais rápido e eficiente desenvolvimento
de aptidões linguísticas, já que alguns dos processos neurológicos são partilhados pelas duas áreas. Uma outra equipa de investigadores demonstrou, num artigo publicado no Journal of Neuroscience,
que adultos que receberam instrução musical em crianças têm respostas cerebrais mais robustas do
que os que nunca tinham tido quaisquer aulas. Foi também provado que as alterações na anatomia
e funcionamento do cérebro decorrentes do treino musical em criança persistem na fase adulta,
mesmo depois de o treino ter cessado.
Não terá sido por acaso que a música tenha sido parte integrante e fundamental da vida de Albert
Einstein, uma das mais brilhantes mentes da Humanidade. Tendo aprendido piano e violino com a
sua mãe ainda bastante novo, rapidamente desenvolveu um grande interesse e aptidão pelo segundo
instrumento. Para além de tocar em público frequentemente, Einstein usava a música e o violino
quase como uma técnica de brainstorming enquanto desenvolvia as suas teorias. Uma recente
análise realizada ao seu cérebro revela que uma das pistas para a sua inteligência sobre-humana
poderá estar relacionada com o extraordinário desenvolvimento do seu corpo caloso, bem como a
conexão invulgar entre os dois hemisférios, características inequivocamente associadas à
aprendizagem musical em crianças.
Hoje em dia, numa sociedade cada vez mais virada para as novas tecnologias, consumista e em busca
da gratificação instantânea, onde proliferam apps e receitas para “resultados em 5 dias”, deixámos
de ter tempo para aprender música. Para além disso, num plano global de crise financeira, sucessivos
cortes orçamentais têm sido feitos pelos governos, deixando sempre a música (bem como outras
formas de arte) em estado de asfixia pedagógica. Mas será este o caminho sensato a seguir? Será que
a sociedade moderna, cada vez mais tecnocrata e formatada para um modelo uniformizado, irá pagar
caro esta fatura?
João Silva
- Mestre em Música pela Escola Superior de Música de Colónia;
-Trompetista e Professor de música e investigador no Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical da Universidade de Évora;
- A realizar o Doutoramento em Música e Musicologia na Universidade de Évora
- Mestre em Música pela Escola Superior de Música de Colónia;
-Trompetista e Professor de música e investigador no Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical da Universidade de Évora;
- A realizar o Doutoramento em Música e Musicologia na Universidade de Évora
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