quinta-feira, 28 de maio de 2020

Onde para a relação terapêutica?




Do medo à esperança (de Raquel Varela e António Coimbra de Matos). Frase muito apropriada nos tempos atuais. Vivemos num período de reconstrução, renovação, das relações e da confiança. No meio de tudo isto, surge a questão - “onde para a relação terapêutica?”.

Diria que nunca saiu do seu lugar, embora tempo e lugar sejam eles agora diferentes, pautados por uma nova intimidade e limites ainda um pouco desconcertantes.  Terapeuta e paciente puderam reinventar-se, mantendo a relação que os faz encontrar, num formato novo e possível – “à distância de um click”. O mais importante, o encontro (terapêutico), continua a possibilitar a existência de um espaço seguro, co-construído a dois que permita entre muitas outras coisas, passar “do medo à esperança”. Ora, o caminho faz-se caminhando, e de fato, que bom que hoje a relação terapêutica, como muitas outras se puderam munir das novas tecnologias. Não devemos esquecer, nem subestimar a importância do contexto “face a face” do consultório, mas o amor terapêutico é passível de criação, não fosse ele fértil e gerador de transformação!

De repente parece que o outro nunca nos fez tanta falta. A saudade (conceito tão português) apoderou-se de todos, fomos para a janela gritar “Vai ficar tudo bem!”, com a esperança de que melhores dias viessem. Neste período, agora mais estável, em que ficámos confinados, fomos sentindo uma estranheza face à nova normalidade. Sentimo-nos frustrados porque não podíamos fazer o que era habitual, sair de casa, estar com a família...este sentimento não é de todo agradável, podendo gerar angústia, agressividade. Mas, lembro-me também das palavras de Coimbra de Matos, “Não à frustração, sim ao desenvolvimento da capacidade de espera”. E aqui podemos retomar à relação terapêutica,pois não será também ela digna de um tempo único e singular, propícia ao dar tempo ao tempo?

Se houve algo que o período de quarentena nos trouxe foi tempo, um tempo por vezes desconhecido. Dizia-se em jeito de anedota “agora que tenho estado com a minha mulher, até me parece alguém interessante”. Estar com o outro adquiriu uma nova dimensão – “não te conhecia e vivo contigo”, “tenho saudades da escola e não gostava de ir para a escola”.

O medo – do vírus, de ficar doente, de perder o outro – adquiriram uma certa legitimidade. Mas, há que ver (e construir) o reverso da medalha, a esperança. E permito-me ressaltar a coragem, “que é o oposto da cobardia (o medo intrínseco), que é transmitida pela força dos maiores: os pais na vida, o psicanalista na cura.” (Coimbra de Matos).

Retomando a questão – onde para a relação terapêutica?, nós O Canto da Psicologia, relembramos que continuamos aqui para si, à distância de um click, bem como nos lugares habituais, de norte a sul do país.





Sem comentários:

Enviar um comentário