Potencialmente, a
consciência de que o tempo que dispomos é limitado faz com que mobilizemos com
maior frequência a expressão de amor na interação com o meio que nos rodeia. De
uma forma global, as investigações indicam que a proximidade com a morte, como
por exemplo no caso de pessoas com doença terminal e presos condenados a pena
de morte, promove frequentemente a expressão de conteúdos associados a temas
como o perdão, o arrependimento, reconciliação, gratidão, declarações de
inocência, o afeto e também, não poucas vezes, o reforço de mensagens de
ativismo social e/ou político.
A consciência da
finitude é a principal fonte de angústia para o ser humano. O instinto de
preservação e sobrevivência faz com que todo o ser vivo tente manter a sua vida
com todas as suas forças. O medo pode funcionar como um mecanismo bastante útil
para a preservação das espécies. Este instinto de preservação, em conjunto com
uma espécie de anseio do Homem em ser eterno, chega a negar a morte, conferindo
a esta uma conotação de tabu que faz com que sejam algumas vezes acionados
esforços no sentido de escondê—la, silenciá—la, ocultar toda a dor e sofrimento
causado. É a partir da década de 50/60 do século passado que a temática da
morte começa a ser maior alvo de atenção por parte da sociologia, etnologia,
antropologia e da psicologia, promovendo uma maior consideração sobre a
importância de um movimento de educação para a morte (desenvolvimento
pessoal que se baseie numa preparação para a morte).
O medo da morte traz
como consequência estados de ansiedade que interagem como forças de atrito
relativamente ao entendimento do final da vida como um processo natural
inevitável. Pode dar-se em forma de medo à dor, medo de sofrer, medo da
dependência, da separação e perda com e de tudo e todos que amamos, perda de
controlo, medo do desconhecido. Talvez o pior de todos os medos seja o medo ao
próprio medo que se torna mais intenso quanto mais dele tentamos escapar. Temos
sobretudo medo da vida e, por isso, medo da morte. Temos muito medo de não
sermos capazes de atingir uma plenitude existencial que se poderá eventualmente
traduzir na concretização abundante do Amor.
A vida é uma contínua
dança entre nascimento e morte, uma dança de transformação, de impermanência.
Desperta-se para a vida através da consciência e aceitação da morte. Aprendendo
a viver, aprende-se a morrer. Quando acreditamos que as coisas são permanentes,
resistimos a aprender a mudança. Aprender a viver é aprender a fluir com a
(nossa) natureza.
Conceber a morte como
um processo universal da natureza, o que realmente é, pode
ajudar a diminuir o medo e facilita a sua integração. Quando aceitamos e
estamos conscientes da morte, transformamos a nossa atitude perante a vida,
somos mais realistas, experienciamos maior sintonia e compaixão connosco
próprios, com os outros e com o mundo, vivendo com maior qualidade.
Apesar de tudo, e como
nos diz o famoso psicoterapeuta Irvin Yalom, ”não é fácil viver cada momento
absolutamente consciente da inevitabilidade da nossa morte. É como tentar olhar
para o sol e manter os olhos fixos: qualquer um de nós só consegue fazê-lo
durante alguns segundos”. É pois muitíssimo natural que criemos estratégias
para suavizar o terror da morte. De certa forma, nunca a poderemos eliminar por
completo. Pensar e falar na morte dói e dói também porque este é o preço
a pagar por amarmos.
Dr. André Viegas
Psicólogo Clínico
O Canto da Psicologia
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