quinta-feira, 10 de março de 2016

Quando for grande quero ser como o meu pai...









Importância do pai no desenvolvimento da criança



Ao longo do tempo, e de uma forma discreta, o papel da figura paterna tem vindo a passar por importantes transformações, acompanhando o desenvolvimento cultural e social. Cada vez mais se torna evidente a sua grande importância na estruturação psíquica e no desenvolvimento social emocional e cognitivo da criança.

A condição de pai evoluiu, e continua em processo de evolução, deixando cada vez mais este de ser visto apenas como suporte financeiro da família e mentor das grandes decisões. Num passado não tão longínquo assim, a função do pai focava-se essencialmente nas questões educativas e 
de disciplina, tendo por base um modelo frequentemente rígido e repressivo. A interacção entre pai-filho/filha, na maioria das famílias revelava-se parca em termos afetivos, particularmente nos primeiros anos de vida. Ao longo dos últimos anos o pai foi-se tornando mais participativo e emocionalmente presente na vida da criança. O número cada vez maior de mulheres no mercado de trabalho, que conquistam desta forma a sua independência, teve uma grande influência nesta importante transformação do núcleo e organização das famílias que trás, por sua vez, significativas mudanças nas relações entre homens e mulheres, assim como nos papeis parentais.

O pai e a função paterna:

O papel do pai (ou seu representante) e da função paterna no desenvolvimento da criança, quer a nível cognitivo, facilitando a capacidade de aprender, quer a nível emocional e relacional, torna-se, assim, cada vez mais evidente. As representações que um adulto possui da relação com o seu pai, desde os tempos mais precoces, ou seja, desde bebé, refletem-se na forma como este se vê, se sente e se vai relacionar com os outros.

Nos primeiros meses o pai desempenha um importante papel de suporte e reforço da díade mãe-bebé. É fundamental a sua presença no apoio e segurança emocional que proporciona e que será, inevitavelmente, sentido e reconhecido pelo bebé. Actualmente estão ainda a surgir evidências de que a interacção precoce do pai com a criança, inclusive desde o momento do nascimento, parece promover o interesse e o envolvimento de ambos nas seguintes etapas da sua vida. Posteriormente a presença do pai vai permitindo trazer e ensaiar a questão de um terceiro na relação entre a criança e a mãe, alguém que vai interferir, que vai mostrar que se pode estar a três tranquilamente, permitindo ir elaborando e transformando o medo da perda, da rejeição e da exclusão. Ao mesmo tempo que o pai abre esta possibilidade, base de um desenvolvimento social e relacional adequado, a valorização que faz da criança será fundamental para a imagem que esta terá de si própria no futuro. Um pai que investe, valoriza, está presente e se mostra disponível afectivamente está a proporcionar a construção de uma boa auto-estima e de uma personalidade mais flexível e segura. Por outro lado o pai também representa a regra, a firmeza. É necessário que seja sentido como forte, um bom exemplo de autoridade, mas também tolerante, flexível e compreensivo. Desta forma a criança interiorizará com mais facilidade a diferença entre o que deve ou não fazer, assim como o modo de agir consigo perante o erro, a infracção e a falha. Pais muito autoritários, inflexíveis e agressivos poderão estar na base de crianças que desenvolvam comportamentos desviantes (como forma de protesto ou desafio à autoridade) ou, pelo contrário, crianças muito auto-críticas, que se castigam e desvalorizam constantemente, o que terá efeitos devastadores para a sua auto-estima.

A identificação da criança com o universo do seu pai dá-se por meio da experiência da interação, quando ele aparece como interdito na relação entre mãe-filho/filha e a sua presença marca, simbolicamente, a dinâmica de rompimento necessária na infância. A presença do pai poderá facilitar, ou dificultar se não for adequada, à criança a passagem do mundo da família para o da sociedade. A ausência ou desinvestimento paterno tem potencial para gerar conflitos no desenvolvimento psicológico e cognitivo da criança, bem como influenciar o desenvolvimento de distúrbios de comportamento.

O vazio promovido pela ausência do pai, ou pelo seu desinvestimento na criança, é formado pela fantasia que esta faz (perante a sua falta) de não ser verdadeiramente amada ou ter suficiente valor para ser desejada, porque se o fosse o seu pai mostrar-se-ia presente e interessado. Esta fantasia infantil, para além de promover a auto-desvalorização, promove ainda sentimentos de culpa na criança por esta acreditar que se o pai não aparece, não existe ou não a procura é porque ela é má, não merecedora de “coisas” boas. Como se o pai refletisse uma parte do valor da criança, fosse o “medidor” desse valor. Um valor que ela tanto procura para se poder ver e sentir a si própria.

“Eu quero ser como o meu pai…”  frase tantas vezes dita pelos meninos significa, eu quero sentir-me amado, valorizado, gostado pelo meu pai para poder também vir a gostar de mim. Quero poder identificar-me com ele e ver que tipo de homem poderei vir a ser. Não será estranho que as meninas queiram ser as princesas do seu pai, base de uma dinâmica um pouco diferente mas que na sua base tem um significado idêntico, eu quero ser desejada, amada, valorizada pelo meu pai para poder gostar de mim própria e ter desta forma uma ideia como vou ou não permitir que os outros homens me tratem no futuro.


As implicações da representação da figura paterna são inúmeras, complexas e importantíssimas na vida emocional da criança, menino ou menina. A par do indispensável papel da mãe, o pai  é um pilar fundamental no desenvolvimento de qualquer criança. O crescimento ao lado de pais afetivos, firmes mas que mostram apoio incondicional, conforto, proteção e tolerância permite desenvolver estruturas psíquicas mais fortes, flexíveis e seguras para enfrentar os vários obstáculos da vida, o que dá conta de uma robusta vida emocional e saúde mental.

Drª Dina Cardoso
O Canto da Psicologia



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