“
O que fizeste hoje? (…) Brincaste e…?? Mais nada? (…) Porque é que nunca contas
à mãe o que fazes na escola?”
Quantas vezes estas perguntas ganham forma e espaço no carro na hora de partir rumo a casa? Provavelmente tantas vezes quantas as que compõem o momento de ir buscar à escola . Como pais queremos
saber, controlar, filtrar e no fundo centrar em nós o poder de protecção
máximo…escrutinar tudo o que escapa ao nosso olhar de falcão, radar timorato de
suricata e garras de felino escondido entre ervas altas na planície.
Pais são pais, como tal
têm de saber tudo dos filhos!
Têm mesmo? O que
significa efectivamente isso? O que estará por detrás desse querer saber?
Lá está: Pais são
Pais! e como tal os pais têm o melhor lugar, papel, função e privilegio no
mundo e vida dos seus filhos. Porque filhos são filhos! E não deverá
existir vinculo mais fiel, genuíno e exclusivo do que este, com medidas, formas e
descrições únicas e incapazes de tabelar e quantificar. Este é com certeza um
conceito de unidade\união dividida em dois que está para lá daquilo que as
matemáticas, físicas e químicas poderão explicar. Porém uma relação de
vinculação deverá encontrar-se num ponto mais distante de uma relação de poder
e controlo, mas num ponto equivalente de uma relação de reciprocidade e equilíbrio.
Uma relação que
nasce na “ocupação” de um espaço interior durante 9 meses, que floresce e nutre
num espaço exterior partilhado e num outro interior individual e intimo por
muito e muito mais tempo (embora sempre pouco). É este o único e verdadeiro
poder inerente a uma relação de vinculação, um dentro que depois se vive fora
mas também e ainda dentro. Confuso? É sempre mais fácil e maravilhoso de sentir
do que explicar.
Porém, quanto mais
mágica e especial, mais receios, por vezes medos, ou mesmo angústias tenderão a
surgir sempre que uma nova relação se estabelece e tantas vezes se apresenta
como necessária e fundamental
.
Mas quem melhor que eu,
pai, para cuidar? Para saber do meu filho e ajudar??
A resposta é
simples: Ninguém! Ninguém é melhor que uma mãe ou pai para ser
exactamente mãe ou pai (entenda-se mãe e pai na máxima ascensão da palavra e
titulo de quem cuida, educa, ama, sofre e erra; e não qualquer uma pretensão a tal)! Pais são pais!
Logo pais não são melhores amigos, não são professores, pediatras ou
psicólogos. São pais! Que mais se poderia desejar ser?
Cada relação, cada
papel deverá conhecer os seus limites como um corpo não visível e concreto mas implícito, lapidado, consolidado e polido à
medida do crescimento e desenvolvimento interno de cada sujeito.
O mesmo sucede nas
relações e processos psicoterapêuticos. Para lá dos limites inerentes ao espaço
fisico em que cada sujeito e terapeuta se acomodam e aninham, existem as paredes
sólidas mas invisíveis que
dão corpo à relação e processo terapêutico. Se por um lado no caso do
acompanhamento de adultos este parece um conceito um pouco mais tácito, no caso
do processo terapêutico com crianças torna-se mais complexo e carece de um
forte realização e explanação sobretudo para com os progenitores.
“ Nunca sei o que é que
ele lhe conta? Ele nunca me diz o que fala aqui!”
Compreender que
aquele é o espaço da criança, das suas coisas e de tudo aquilo que esta
pretender colocar nele, nem sempre è fácil para os pais. Porém, não existe
psicoterapia se não existir confidencialidade, protecção e sigilo sobre tudo o
que acontece da porta para dentro. O Psicólogo é um agente facilitador e
promotor do contacto da criança com as suas questões internas, e sem uma
relação de confiança e empatia esta dinâmica fica seriamente comprometida.
Pais são pais e sem a
colaboração e empenho dos mesmos qualquer processo terapêutico tenderá a ser incompleto, um corpo sem um membro que coloque
em causa uma mobilidade harmoniosa e saudável. E entramos aqui num registo nem
sempre fácil de conquistar e manter, os pais deverão ser aliados e parceiros do
processo terapêutico, estando disponíveis, partilhando informações, devolvendo
preocupações, promovendo mudanças e respeitando a relação criança\terapeuta. No mesmo sentido, os
pais deverão sentir-se ouvidos e compreendidos nas suas crenças e princípios, contidos nas suas angustias e
preocupações, bem como, esclarecidos nas suas dúvidas e ilações. Como tal, os
pais deverão formar uma aliança terapêutica com
o clínico, que fomentará na criança uma sensação de contenção e
importância que promoverá um processo psicoterapêutico mais sólido e eficaz.
Pais são pais! Como
tal, não têm de saber tudo sobre os filhos, da mesma forma que estes nunca
saberão tudo sobre os pais. Mais importante que este “saber tudo”, alimentado
pelas inseguranças e receio de perda de valor, os pais deverão conhecer os
seus filhos e estes, numa reciprocidade genuína e única, deverão
conhecer os seus pais. Os nossos filhos têm o direito a saber como nos
sentimos perante diferentes situações, a revelar curiosidade e questionar sobre
o nosso dia, a conhecer e prever as nossas reacções…só assim terão mais
facilidade em contactar e partilhar as suas próprias emoções, pensamentos,
medos e angústias.
Neste sentido, como
pais estamos sempre a tempo de enriquecer as nossas perguntas e respostas,
valorizando cada segundo das interacções com os nossos filhos.
Assim…
”Filho gostava de te
contar uma coisa importante que me aconteceu hoje no trabalho.(…) O que
achas?(…) Achas que podia ter feito as coisas de forma diferente?(…)
Ontem quando não
quiseste falar comigo fiquei a sentir-me um bocadinho triste e a achar que já
não confiavas em mim, mas respeito que nem sempre te apeteça falar. Mas quando
quiseres vou estar disponível.”
Drª Joana Cloetens
O Canto da Psicologia
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