Desempoeirando o Divórcio dos Pais...
Não é raro encontrar adultos cuja
vivência de separação dos pais, na infância ou na adolescência, assinalou profundas
fissuras, que tardiamente aparecem (aos olhos do próprio, daqueles que o
rodeiam ou, quem sabe, por entre as paredes de um consultório de psicoterapia),
sob a forma de bloqueio relacional.
Num país onde as taxas de
divórcio são crescentes, mais do que desconstruir o novelo em que se vão
tecendo tais cenários, importa considerar o impacto que a separação dos pais
tem no mundo interno da criança. Não pretendemos, porém, assumir uma leitura
idealizada, pois que sabemos, que em muitas circunstâncias, a possibilidade de
separação é, até, reparadora da saúde mental dos protagonistas e dos mais
pequenos, tantas vezes oprimidos pelo vendaval parental. Por outro lado, seria
igualmente redutor pensar que o divórcio encontra equivalente directo em trauma
(expressão que é, por vezes, levianamente utilizada, sem que percebamos o que
efectivamente estamos a classificar).
Não haverá uma fórmula que
delimite quais as consequências emocionais da separação dos pais ou que
eventuais dificuldades psicológicas emergirão. Há, num outro sentido,
protagonistas que preservam as suas características individuais e particulares,
que em muito contribuem para a resolução de um momento de ruptura, como sucede
num processo de separação. Assim, tomando como verdade que qualquer situação de
contenda conjugal tem repercussões de maior ou menor gravidade nos filhos, o
potencial de resolução do conflito interno dependerá, sempre, da estrutura que
serve de base à organização psíquica da criança, bem como da forma como a
relação com aqueles pais se encontra estruturada.
Em todo o caso, a vivência de um
sentimento de culpa é irremediavelmente inevitável, sendo a partir do mesmo que
o aparelho defensivo da criança se mobiliza para a resolução do conflito que
aquela fonte de tensão despoleta. A forma como a culpabilidade é gerida
internamente depende, como supracitado, da estruturação interna até aí
edificada. É, todavia, possível identificar uma constelação de sintomas
relativamente frequentes, como tristeza, apatia, inibição, insucesso escolar,
somatizações (enurese, tiques, etc.), os quais, encetando o sofrimento psíquico,
constituem os pilares para a depressão infantil. Na adolescência, quando não é
de todo possível pensar e integrar a culpa, irrompem comportamentos agidos ou
pré-delinquentes.
Em circunstâncias como as
descritas, em que uma separação é representativa de uma vivência dolorosa e
inibidora do crescimento interno, importa intervir, num trabalho que deve
acontecer em articulação com a criança e os pais, envolvidos por um bem maior:
a saúde mental do filho.
O Canto da Psicologia,
Dr.ª Joana Alves Ferreira
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